A Comissão Europeia avisa o Governo que tem de estar preparado para mais falências do país e que o verdadeiro panorama da crise só se vai tornar evidente quando as moratórias concedidas a empresas e famílias expirarem. “À luz de um possível aumento de insolvências, é importante que os bancos e as autoridades se preparem para enfrentar esses riscos”, alerta Bruxelas nos documentos do chamado “pacote de outono”, no âmbito do processo de avaliação dos orçamentos europeus, em que valida o esboço do plano orçamental português. “Está, no geral, em linha com as recomendações adotadas pelo Conselho”.
“Como a pandemia ainda está se a desenvolver, o impacto económico final só se tornará visível com atraso, em particular quando as moratórias expirarem”, diz ainda o executivo europeu no relatório dedicado a Portugal.
Bruxelas reconhece que “o mercado de trabalho foi menos afetado devido aos esquemas de apoio do governo”, com o desemprego a aumentar “apenas moderadamente de 6,5% em 2019 para cerca de 8% até agosto de 2020”. Mas recomenda que as medidas que têm permitido mitigar a crise devem ter uma retirada “gradual”, para ajudar a “evitar riscos extremos no mercado de trabalho e para ajudar a empregabilidade e a transição para empregos viáveis, apoiando simultaneamente uma recuperação global”.
É ainda importante para a Comissão que “Portugal se certifique que, quando toma medidas orçamentais de apoio [à economia], a sustentabilidade fiscal de médio prazo é preservada”.
E mesmo considerando que esta é uma crise excecional, a Comissão não esquece “as reformas fiscais estruturais“, que “continuam a ser fundamentais para fortalecer o controlo da despesa e a eficiência de custos“. Em causa, nomeadamente, “os fatores que contribuem para a acumulação de dívidas em hospitais nos últimos anos e enfrentar as fragilidades nas empresas estatais”. Bruxelas nota que estas reformas ajudariam também Portugal “a maximizar o impacto do apoio europeu do pacote Next Generation EU”.
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A Comissão recorda que o choque da pandemia foi particularmente sentido no segundo trimestre, com a maioria das atividades económicas em Portugal a começarem a recuperação no verão, “tendo testemunhado uma recuperação em V”, embora sublinhe que “muitos setores, e em especial grande parte da hotelaria do país, não devem atingir os níveis pré-crise antes de 2022”. Esta “grande exposição ao turismo” explica uma contração “ligeiramente maior” para Portugal do que a média europeia.
Por outro lado, o relatório nota que “as condições de financiamento para Portugal continuam favoráveis” e que “o sistema bancário português revelou-se mais resiliente no início da pandemia do que no início da crise financeira global há uma década, não obstante as vulnerabilidades herdadas” dessa crise.
Ainda assim, a Comissão alerta para “um aumento no risco de crédito“, que se pode eventualmente “traduzir em imparidades crescentes“, pressionando a rentabilidade dos bancos e gerando “crédito vencido crescente”. É para este risco que bancos e autoridades se devem preparar.
Bruxelas sublinha ainda que “o forte aumento da dívida pública veio somar-se ao elevado nível pré-crise, interrompendo temporariamente a redução da dívida” e que “os passivos contingentes públicos estão a aumentar, provenientes de algumas empresas públicas e do sector privado, nomeadamente através da eventual mobilização de garantias do Estado“. A Comissão conclui que “o regresso a níveis de dívida mais baixos e mais prudentes pode, portanto, levar algum tempo”.