O Reino Unido informou a Organização Mundial de Saúde (OMS) de que uma nova variante do novo coronavírus, identificada na quinta-feira pelas autoridades britânicas, pode propagar-se mais depressa, anunciou este sábado o diretor-geral da Saúde de Inglaterra, Chris Whitty. Numa altura em que a esperança mundial estava colocada no início da vacinação e, com a chegada de um novo ano, a tentativa de colocar um ponto final na pandemia, as novidades que chegam do Reino Unido são o presente no sapatinho que ninguém queria receber. Há quase um ano, o mundo ficou familiarizado com a incerteza da ciência perante um novo vírus e este é mais um capítulo da história da Covid-19.

O que é que aconteceu ao vírus?

Foi identificada uma nova variante do SARS-CoV-2, que dá origem à Covid-19. Os investigadores britânicos identificaram-na no sul de Inglaterra, em Londres ou Kent, no final de setembro. Patrick Vallance, conselheiro científico do governo britânico, explicou este sábado que a nova variante tem “23 alterações, muitas associadas com mudanças na proteína que o vírus usa”. Nick Loman, da Universidade de Birmingham [que integra a equipa que tem estado a monitorizar e a sequenciar novas variantes do SARS-CoV-2], já tinha afirmado que algumas destas mutações tinham ocorrido na proteína spike (a proteína que o coronavírus usa para penetrar nas células e também é alvo dos anticorpos produzidos pelo sistema imunológico após o contágio) e que estas podem alterar a forma do vírus.

Em conferência de imprensa, Boris Jonhson afirmou que esta nova variante pode ser até 70% mais transmissível e que se está a espalhar mais rapidamente em Londres e a sudoeste de Londres, mas “não parece ser mais perigosa” que a anteriormente identificada. Ainda assim, Boris Jonshon — que apresentava em conferência de imprensa medidas mais restritivas para a quadra festiva — alertou para a possibilidade do fator de transmissibilidade (o Rt) poder aumentar em 0,4 com a hipótese de 70% maior transmissão que na doença original.

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Ainda assim, e já depois do Reino Unido ter notificado a Organização Mundial da Saúde desta nova variante, os cientistas da OMS ainda não falaram depois das últimas informações dadas pelo governo britânico.

Mas então, não houve apenas uma mutação?

Não, os vírus estão constantemente em mutação. Basta recordar que o vírus da gripe sazonal, por exemplo, todos os anos obriga ao fabrico de uma nova vacina, adaptada à estirpe que circula nesse ano. Em novembro, tinham sido identificadas já 12.706 mutações no SARS-CoV-2, mas os investigadores do University College de Londres concluíram, no entanto, que essas mutações não tinham transformado o vírus mais contagioso.

Covid-19. Mutações descobertas do coronavírus não o tornaram mais contagioso

Jeremy Farrar, diretor do Wellcome Trust, uma fundação do Reino Unido especializada na investigação biomédica, destacou no Twitter que “quanto mais se propaga o vírus e mais circula, sob pressão imunitária, mais provável é que sofra mutações, evolua e mude”.

Há exemplos bem recentes de outras variantes do coronavírus. A África do Sul, por exemplo, anunciou na sexta-feira ter detetado uma nova variante. O caso da variante detetada na Dinamarca e que forçou as autoridades a ordenarem a morte de milhares de martas (visons) tem pouco mais de um mês e, no final do Verão também se falou da variante espanhola do SARS-CoV-2.

Se é assim tão comum porque é que se está a dar mais atenção a esta?

A velocidade a que a nova estirpe do SARS-CoV-2 se espalhou foi o que chamou inicialmente à atenção dos investigadores. A 13 de dezembro tinham sido identificados 1.108 casos de infeção com esta variante, maioritariamente no sul de Inglaterra. E o número foi tido em consideração uma vez que só uma pequena parte das amostras do vírus é que é sequenciada, dessa pequena parte a quantidade de vezes em que a variante foi identificada foi suficiente para alertar os investigadores.

Pode espalhar-se mais rápido, mas é mais perigosa? Mais mortífera?

Segundo o diretor-geral da Saúde de Inglaterra, Chris Whitty, ainda não há evidências de que esta nova variante cause maior mortalidade ou que possa ter impacto nas vacinas já aprovadas e nos tratamentos disponíveis. A certeza, para já, parece ser a de que se “propaga depressa”.

Mas não há, para já, qualquer evidência que a nova variante do SARS-CoV-2 cause quadros de doença mais graves. Até ao momento nada sugere que a variação altere a resposta do sistema imunitário pelo que, de acordo com Patrick Vallance, conselheiro científico do governo britânico, as vacinas deverão ser “adequadas para este vírus”.

“A transmissão é a grande mudança nesta varinate, pelo que temos que reduzir os contactos para reduzir a sua capacidade de se espalhar”, afirmou Vallance.

Ainda assim, há que considerar ainda — na questão da maior transmissibilidade — o facto desta variante se ter propagado mais rapidamente em regiões específicas do Reino Unido. Os investigadores ainda não têm resposta para esta particularidade (e o porquê de não ter uma propagação idêntica em todo o país).

E quantas pessoas já foram infetadas com a nova variante?

Não será fácil dar números concretos neste ponto. Nem todas as amostras do vírus são sequenciadas, pelo que há apenas estimativas em relação à proporção da nova variante, comparada com as anteriores. Ainda assim, Patrick Vallance disse na conferência de imprensa deste sábado que a meio de novembro cerca de 28% dos casos identificados em Londres eram desta nova estirpe, mas a 9 de dezembro essa taxa tinha ultrapassado já os 60%.

“Em Londres, mais de 60% dos novos casos eram da nova variante, o que significa que não só se move mais rápido como também se está a tornar dominante no que diz respeito à transmissão”, afirmou Vallance.

Agora que já há vacinas, vão deixar de ser eficazes?

Também não há evidência nesse sentido. Chris Witty diz que a informação disponível não permite concluir que esta nova variante “possa ter impacto nas vacinas já aprovadas e nos tratamentos disponíveis”. Ainda assim, o responsável apelou a que “agora, mais do que nunca”, os cidadãos cumpram as regras “para reduzir a transmissão”.

Corrigido: estirpe por variante