Às 21h40 minutos desta segunda-feira, Marcelo Rebelo de Sousa recebeu o resultado do PCR que tinha feito nesse mesmo dia. Tinha realizado também um teste rápido (antigénio) que deu logo negativo, mas o PCR, que passa por laboratório e tem resultados mais fidedignos, acabou por chegar positivo, embora Marcelo se mantenha assintomático. Foi imediatamente cancelada toda a agenda do Presidente. A do candidato presidencial que vai a votos dia 24 deste mês (e não se sabe em que condições), já praticamente não existia (só mesmo entrevistas e debates). E agora dificilmente existirá.
No dia anterior, Marcelo tinha também testado negativo, segundo a nota da Presidência da República que deu conta do teste positivo. O Presidente tem por hábito testar-se com frequência, daí o número de testes registado nestes últimos dias.
Marcelo Rebelo de Sousa já fez, entretanto, um novo teste, realizado pelo INEM, na noite desta segunda-feira, depois de ter falado com as autoridades de saúde. Aguarda resultado em breve. Também já respondeu ao inquérito epidemiológico, o segundo que faz na última semana. Afinal, o espectro da Covid-19 sob o Palácio de Belém já paira desde a quarta-feira passada, altura em que Marcelo ficou a saber que um membro da sua equipa tinha testado positivo para o SARS-CoV-2 e se auto-isolou até saber que afinal o contacto que tinham tido, na segunda-feira anterior (dia 5), era afinal de baixo nível de risco.
Não é certo que o contágio venha daí, tendo em conta que fez esta segunda-feira uma semana desde esse último contacto com um caso positivo. Segundo os epidemiologistas, a positividade pode começar a aumentar apenas a partir do quinto dia do contacto e acontecer ao sétimo dia. À SIC, nessa mesma noite, Marcelo disse que as autoridades de saúde lhe teriam imposto “uma vigilância passiva, o que implica não ir para aglomerações significativas durante 14 dias”. Contas feitas, ali mesmo em direto e antes de entrar para o debate com André Ventura, Marcelo previa: “Até dia 18 [dia em que terminam os 14 dias do contacto] é uma limitação grande, mas enfim, é a vida”.
O que acontece nas Presidenciais em Portugal se o candidato ficar infetado com Covid-19?
De qualquer forma, em matéria de campanha, tudo o que tinha previsto até essa altura era a participação em entrevistas e no debate televisivo desta terça-feira à noite, com todos os candidatos. Tinha ainda, por marcar, um debate das rádios e várias entrevistas prometidas à comunicação social até ao final da campanha. Ainda, nessa altura, concedia que pudesse manter essa agenda: “Se uma entrevista ou um debate não são aglomerações, algumas iniciativas de visitas a instituições já podem ser”. O que estava e risco eram, assim, ações de campanha na primeira semana do período oficial das Presidenciais/2021, que arrancou oficialmente este domingo, dia 10. Para lá de dia 18, ou seja, nos quatro dias finais, Marcelo previa ir para a rua.
A vontade não era, no entanto, muita e, novamente numa entrevista à SIC, à porta de Belém neste domingo, o candidato-Presidente dizia que não era este o tipo de campanha que gostava de fazer, sem contacto com as pessoas. Explicava, além disso, as limitações que tinha e argumentava mesmo que poderia resultar estranho para os portugueses que estivessem confinados e ele na rua. “Estarei onde os portugueses estiverem”.
Quanto aos portugueses, saberão esta quarta-feira onde vão estar nos próximos quinze dias, já Marcelo, saberá antes quantos dias terá de ficar em isolamento. Se for pelo período de 10 dias, o isolamento terminará a 21 de janeiro. Dia 22 é o último dia de campanha oficial. Se forem exigidos 14 dias, Marcelo estará em isolamento na data das eleições.
Quanto à agenda presidencial, não via problemas em mantê-la, mesmo a reunião com especialistas no Infarmed que se realiza na manhã desta terça-feira, onde estaria na mesma sala que o primeiro-ministro, os representantes dos partidos com assento parlamentar, parceiros sociais e também com os restantes candidatos presidenciais. Um ajuntamento que não evitaria e, para essa mesma tarde, outro: receberia os partidos em Belém para a habitual auscultação antes da renovação do estado de emergência.
Tudo isso foi agora cancelado — o debate da RTP está em dúvida, segundo apurou o Observador — não se sabendo ainda se Marcelo poderá estar presente, em alguns destes momentos, por videoconferência ou por qualquer outra plataforma que lhe permita participar nas reuniões, mesmo que à distância.
Já a campanha, se quiser chegar aos portugueses como candidato, Marcelo terá de se reinventar. Afinal não tem presença nas redes sociais, o que dificulta que possa ir divulgando a sua mensagem por esta via, também não tem uma grande estrutura de campanha e nem tempos de antena quis fazer, tal como noticiou o Observador no início de dezembro. A sua campanha já era uma miragem e nos últimos dias foi dando todos os sinais que não contava marcar muita presença, tanto que esta segunda-feira foi atacado por Ana Gomes e por André Ventura precisamente por essa ausência e no que isso significava em termos de respeito pelos eleitores. A candidata Ana Gomes fez mesmo menção ao facto de o seu adversário não ter sequer tempos de antena nas televisões: “Despreza as eleições” e comporta-se como se se tratasse de “uma coroação”.
Os percalços de Ana Gomes no dia em que quis aparecer para apontar o dedo a Marcelo
As críticas, os ataques e toda a campanha tem agora um ponto de interrogação adicional à frente. Adicional porque, na verdade, as notícias que se aguardam para esta quarta-feira — com o Governo a anunciar nesse dia como se fará o novo confinamento geral — já estavam a deixar suspensas muitas das iniciativas de campanha.
Puxando a fita atrás desde o momento da infeção, Marcelo Rebelo de Sousa esteve com Daniel Oliveira (que já está em isolamento profilático) numa entrevista ao podcast “Perguntar não ofende”. Dois dias antes, o candidato-Presidente tinha estado com Ana Gomes no debate na RTP, que já foi informada pela Casa Civil e encontra-se a aguardar indicações das autoridades de saúde, tendo acrescentado que se sente bem. Dois dias antes Marcelo tinha debatido com o candidato Vitorino Silva também nos estúdios na RTP. O candidato outsider, conhecido como Tino de Rans, chegou a queixar-se de a linha SNS 24 não o contactar, mas acabou a noite a dizer que não foi considerado contacto de risco e que por isso vai manter a campanha.
Continuando a recuar, André Ventura — com quem Marcelo debateu na quarta-feira, dia em que soube que um dos seus assessores foi infetado (e em que testou também negativo) — está em isolamento e, embora as autoridades não tenham considerado contacto de risco, vai esperar pelo resultado do teste antes de voltar à estrada. Marisa Matias, com quem Marcelo debateu já no dia 2 de janeiro, suspendeu as ações até ter resultado do teste. João Ferreira, com quem o Presidente debateu dois dias depois de Marisa (a 4), mantém a agenda e tem um encontro com Isabel Moreira esta quarta-feira de manhã. Tiago Mayan Gonçalves também aguarda indicações das autoridades de saúde. No caso de Marcelo, o candidato ausente (da campanha) passa agora mesmo a candidato isolado, fechado sozinho com o Presidente em Belém.