O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, considerou esta terça-feira que a decisão do Tribunal Constitucional (TC) sobre a morte medicamente assistida foi uma “decisão correta“, mas disse que “poderia ter ido mais longe“.

O TC chumbou na segunda-feira a lei sobre a morte medicamente assistida, em resposta a um pedido de fiscalização preventiva feito pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Um dossier tão complexo e tão vasto quanto este eu acho que a decisão do Tribunal Constitucional foi uma decisão correta, [mas] podia ter ido mais longe”, afirmou à agência Lusa Miguel Guimarães, aludindo à questão do “sofrimento intolerável”.

Relativamente a esta questão, o Tribunal Constitucional não colocou nenhuma questão, deixando o sofrimento intolerável para a decisão médica: “não são os médicos que decidem ou que conhecem o sofrimento do doente, é o próprio doente. Era bom que o Tribunal Constitucional tivesse avaliado isto de outra forma e se calhar falasse com alguns médicos para perceber como é que se avalia o sofrimento”.

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Mas, no global, a decisão do Tribunal Constitucional parece-nos correta, é uma boa decisão que vai de certa forma obrigar a Assembleia da República a apresentar um diploma em que algumas destas questões” que foram chumbadas possam ser mudadas.

Segundo Miguel Guimarães, “os termos que foram apresentados na lei são completamente imprecisos, dão para tudo, e mesmo assim foi melhorada relativamente aos projetos de lei” iniciais.

O que a OM verificou é que “os juízes consideraram de facto imprecisas as condições para a eutanásia”. “Estas questões da vida ou de morte nunca são fáceis, sobretudo, as questões da morte que a gente conhece menos”, sendo, por isso, difícil “tornar precisas doenças em que pode ser utilizada a eutanásia”.

“Mas de qualquer forma os juízes do Tribunal Constitucional abrem a porta à despenalização futura”, disse, destacando a frase do presidente do Tribunal Constitucional, João Caupers, em que afirma: “o direito à vida não pode transfigurar-se num dever de viver em quaisquer circunstâncias“. “A lei vai para trás, mas deixa uma porta aberta para a despenalização futura”, salientou.

Contudo, para Miguel Guimarães, “a lei da eutanásia pode esperar” devido ao momento que o mundo atravessa, em que é “preciso tratar as pessoas que não querem morrer, e que são muitas”.

Numa altura em que nós estamos na maior pandemia da história recente é o tempo da vida, é o tempo de investimento em cuidados de saúde e é o tempo de respeito pela dignidade humana e isto é absolutamente fundamental neste momento”, defendeu.

Por isso, defendeu, “era fundamental que todos nos concentrássemos em criar as melhores condições possíveis a nível do sistema de saúde para conseguirmos salvar o máximo de vidas possíveis, para concretizar o plano de vacinação, respeitando obviamente todas as pessoas e sobretudo aquilo que é a dignidade humana que está consagrada na Constituição.

O diploma tinha sido enviado para fiscalização preventiva da constitucionalidade em 18 de fevereiro e a decisão do TC foi tomada por maioria, de sete juízes contra cinco. Na sua decisão, o TC considera, contudo, que a inviolabilidade da vida humana consagrada na Constituição não constitui um obstáculo inultrapassável para se despenalizar em determinadas condições a antecipação da morte medicamente assistida.