O Governo vai inscrever no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a possibilidade de pedir a Bruxelas mais 2,3 mil milhões de euros (para um total de cinco mil milhões) na componente de empréstimos, para caso haja uma procura que justifique esse recurso. A verba terá como destino a capitalização de empresas e a inovação.
O anúncio foi feito pelo ministro do Planeamento, Nelson de Souza, esta sexta-feira, na apresentação do documento que será entregue em Bruxelas. “Desde que se verifique uma procura, quer na área da capitalização ou na área das agendas mobilizadoras de inovação, fica o compromisso inscrito no PRR de se solicitar a utilização de uma verba adicional de 2,3 mil milhões de euros destinados a reforçar esta medida de capitalização e da inovação”, afirmou o ministro.
Este valor acresce aos 2,7 mil milhões de euros em empréstimos que já estavam previstos no documento. Além disso, a versão final do PRR prevê já um reforço de 300 milhões de euros para capitalização e inovação, num total de 1.364 milhões de euros nesta rubrica. A versão final do Plano de Recuperação e Resiliência deverá ser enviada à Comissão Europeia na próxima semana, antecipou o ministro.
Uma das queixas que tinham sido feitas ao PRR, nomeadamente pelas associações empresariais, era de que o documento se configurava pouco generoso para as empresas — nomeadamente em termos de capitalização. Como resposta, o Governo coloca agora em cima da mesa a hipótese de aumentar as verbas a elas destinadas, caso a procura assim o justifique.
Mas não só. O primeiro-ministro, António Costa, que também esteve na apresentação do PRR, sublinha que este plano tem uma “natureza extraordinária“, porque coincide com a transição entre os fundos europeus tradicionais — PT2020 e PT2030 — e que, por isso, “não se deve limitar a repetir aquilo que as sucessivas gerações de fundos comunitários já fazem”. O primeiro-ministro dá o exemplo dos apoios às empresas, que no PT2020 “tiveram um conjunto de incentivos de cerca de 4.700 milhões de euros” e que no PT2030, o próximo quadro comunitário, terão “qualquer coisa como mais cinco mil milhões de euros de incentivos às empresas”.
Com esses incentivos nos apoios tradicionais, António Costa defende que deve agora no âmbito do PRR “haver incentivos específicos”, associados às agendas do clima e do digital, as maiores prioridades da “bazuca”, mas também “fazer uma coisa diferente, que é lançar um desafio às instituições de ensino superior e do sistema cientifico para olharem para o produto da sua investigação que já está num estado de suficiente maturidade” e que possam “estabelecer um consórcio com empresas” e com a presença de autarquias para transformar essa inovação num produto que “melhore o perfil” da economia portuguesa”.
“Tenho a certeza que um país que no ano passado chegou à primeira liga europeia, sendo classificado no scoreboard da Comissão Europeia como um país altamente inovador, não falta seguramente nas universidades, nos politécnicos, nos centros de inovação, saber suficiente, devidamente consolidados — projetos que estão mesmo à espera de um dote para o casamento necessário com as empresas e poderem ter o seu desenvolvimento industrial”, disse António Costa.
Outra das novidades desta versão do PRR é uma verba de 243 milhões de euros destinada à cultura (93 milhões para a digitalização e os restantes 150 milhões para “valorização, conservação e restauração do património cultura e histórico”, precisou Nelson de Souza).
Leia aqui as linhas gerais do Plano.
Costa quer primeiros PRR aprovados a 21 de junho
António Costa diz que “o Ecofin está preparado para, assim que tenha luz verde da Comissão Europeia, proceder à aprovação” dos planos nacionais. “A ambição que nós temos é que no último Ecofin da nossa presidência [da UE], a 21 de junho, possamos aprovar os primeiros planos de recuperação e resiliência. E obviamente temos muita vontade que, entre esses planos a serem aprovados na nossa presidência, esteja também o plano de Portugal”, disse o primeiro-ministro.
O primeiro-ministro sublinha que “17 estados-membros já ratificaram a decisão que permite à UE ir ao mercado fazer essa emissão de dívida histórica”, para financiar os planos de recuperação e resiliência em todos os estados-membros. E diz estar confiante para o restante processo. “Sem obviamente podermos antecipar a decisão do Tribunal Constitucional alemão, a verdade é que podemos antever que todos os países irão cumprir o calendário para, em tempo útil, ratificarem as decisões que permitem à Comissão Europeia ir ao mercado”, acredita António Costa.
Em causa está o alargamento dos recursos próprios, que a Comissão Europeia pretende fazer para se poder endividar junto dos mercados e distribuir pelos estados-membros os 750 mil milhões em fundos extraordinários para esta crise, entre subvenções e empréstimos.
O problema, no entanto, é que, após a iniciativa de um movimento alemão (o Bündnis Bürgerwille, Aliança para a Vontade dos Cidadãos) contra a Comissão Europeia, o Tribunal Constitucional federal do país suspendeu, no final de março, o processo de ratificação da “bazuca”, gerando a dúvida se este Mecanismo de Recuperação e Resiliência não ficará ainda mais atrasado.
Fernando Alfaiate vai gerir fundos do PRR e Costa Silva preside à comissão de acompanhamento
O Governo escolheu Fernando Alfaiate, atualmente vogal da comissão diretiva do COMPETE 2020, o programa que mobiliza os fundos europeus estruturais no âmbito do Portugal 2020, para liderar a estrutura de missão que vai gerir os fundos do PRR. Fernando Alfaiate é licenciado em Economia e pós-graduado em Análise Financeira e em Gestão e Estratégia Industrial, pelo ISEG (Universidade de Lisboa), faculdade onde também tirou um mestrado em Finanças. A escolha foi anunciada pelo ministro do Planeamento.
Nelson de Souza explicou que, no âmbito da audição pública do PRR, “houve diversas manifestações de preocupação e recomendação do reforço de mecanismos em matéria de auditoria, controlo e medidas de prevenção de fraude”.
O Governo decidiu criar um “quarto nível de governação”, com uma comissão de auditoria e controlo que vai ser independente de todos os outros órgãos de governação — que são uma comissão interministeral; uma comissão nacional de acompanhamento (presidida por António Costa Silva), com representantes de instituições como o Conselho Económico e Social (CES) ou o Conselho de Concertação Territorial; e uma estrutura de missão para gerir os fundos do PRR (que será gerida por Fernando Alfaiate).
O nome de Fernando Alfaiate foi proposto por Nelson de Souza a António Costa, que “já deu o seu acordo”. “Assim que houver condições legais para proceder a essa nomeação, assim fá-lo-emos”, explicou o ministro do Planeamento.
Já António Costa Silva, o gestor que desenhou a visão estratégia do PRR no ano passado, vai presidir à comissão de acompanhamento, anunciou o primeiro-ministro. António Costa sublinhou que “a comissão tem uma dupla natureza”, reunindo representação institucional — autarcas, CCDR, regiões autónomas, reitores ou parceiros sociais — mas também 10 personalidades “que procuram representar as diferentes áreas” abrangidas pelo PRR.