O ministro das Finanças, João Leão, defende que atuar sobre as moratórias de crédito à margem da Autoridade Bancária Europeia (EBA) pode levar a que as famílias e as empresas fiquem “marcadas” e com dificuldade em aceder a novo financiamento. Numa audição parlamentar, João Leão defende que “tomar decisões fora do quadro da EBA seria muito perigoso para o país“.
“Podíamos estar a criar situações complicadas do sistema financeiro, nós não queremos voltar a enfrentá-las. (…) Atuar fora do quadro da EBA significava que as próprias empresas e famílias podiam ficar marcadas e com dificuldade de aceder a novo financiamento. E, do ponto de visa do sistema financeiro, dos bancos, corriam o risco de serem classificados como marcado, afetar o crédito malparado, os seus rácios de capital e ter um sistema financeiro incapaz de financiar a economia no momento em que precisamos, de um forte relançamento da economia”.
A resposta foi dada a uma questão de Fernando Anastácio, do PS, mas o tema das moratórias já tinha sido antes levantado pelo PSD. Já Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, perguntou que medidas é que o Governo tomou para empresas e famílias quando as moratórias terminarem. “O que vai acontecer em setembro? O Governo pode garantir que ninguém ficará sem a sua morada de habitação porque a moratória chegou ao fim e que há medidas de reestruturação de créditos, e que as pessoas não vão ficar nas mãos dos bancos?”. João Leão diz que o Governo acompanha a preocupação, que será analisada nos próximos meses.
João Leão prevê (outra vez) a carga fiscal mais baixa desde 2012
O tema está em cima da mesa porque o Parlamento discute na especialidade uma proposta do PCP para prolongar por mais seis meses as moratórias. O PSD, que viabilizou a medida na generalidade, já disse, no entanto, que na especialidade, vai determinar que a proposta só pode avançar com a concordância da EBA.
Portugal assegurou 60% das necessidades de financiamento
Portugal financiou 60% das suas necessidades de financiamento para este ano, segundo disse o ministro das Finanças, João Leão, no Parlamento. O ministro salientou que o país o fez com “taxas de juro historicamente baixas”. “É a primeira vez na nossa história que emitimos divida pública a 10 anos com juros negativos“, acrescentou.
“Este resultado mostra bem a importância de prosseguir um caminho de contas certas, que reforcem a credibilidade externa do país, e assegurem um crescimento robusto e sustentável da economia portuguesa”, adiantou.
João Leão tem também centrado a intervenção em salientar os apoios às empresas. Numa resposta ao PS, disse que, no primeiro trimestre do ano, têm sido dados apoios às empresas que são superiores em 150% “face à média mensal dos nove meses do ano passado, em que durou a pandemia”. No início da audição, Leão tinha mesmo dito: os “apoios às famílias, aos trabalhadores e às empresas vão continuar custe o que custar”.
O ministro voltou ainda a deixar de lado a possibilidade de um Orçamento Retificativo, justificando com a “margem” deixada pelo Orçamento do Estado para responder a uma “eventualidade”.
Valor para o Novo Banco ainda não está fechado
Ainda não está fechado o valor de injeção pelo Fundo de Resolução no Novo Banco. Segundo João Leão, é ainda preciso esperar por “toda a informação”, como a que constará na auditoria do Tribunal de Contas — que o Governo espera vir “a tempo para ser tida em consideração”. Ainda assim, repete, o valor ficará abaixo do que estava inicialmente previsto no Orçamento do Estado para 2021 (476 milhões de euros).
“Ainda não existe um valor fechado, até porque é importante esperar pela informação toda que vai ser disponibilizada. Recordo que ainda falta termos acesso à auditoria final do Tribunal de Contas, mas nesta fase vai ser abaixo do valor que inicialmente tinha sido proposto no Orçamento do Estado”, disse. Já antes, em resposta ao deputado Afonso Oliveira, do PSD, João Leão tinha sublinhado que o valor pedido pelo Novo Banco, de quase 600 milhões de euros, “não é adequado nem se justifica”.
“Com base no acompanhamento que fazemos desse trabalho do Fundo de Resolução e da entidade reguladora, o nosso entendimento é que o valor de chamada de capital do Novo Banco não é adequado nem se justifica. (…) Entendemos que o valor deve ficar substancialmente abaixo”, disse. No Programa de Estabilidade, o Governo prevê uma despesa pública com o banco de 430 milhões de euros este ano, uma medida “one-off” (ou seja, é apenas paga uma vez na totalidade) que está no estado “a adotar”.
O ministro das Finanças foi confrontado pela deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, sobre o risco de o Governo estar a permitir uma sobrecapitalização do Novo Banco com dinheiros públicos, face ao alívio dos rácios de capital permitido pelo Banco Central Europeu, no quadro da pandemia. Mas Leão respondeu que esse alívio é temporário e remeteu para “questões contratuais”, as quais estabelecem um rácio de 12%.
O ministro das Finanças deixou também uma mensagem à administração do Novo Banco, sugerindo que se foque na “boa gestão do banco” e esteja “preocupada em rentabilizar os ativos que tem”. As declarações surgem após serem conhecidas notícias de que a instituição estava interessada em apresentar proposta para a compra do Eurobic.
“A administração do Novo Banco devia ter presente o enorme esforço que foi feito pelo sistema financeiro e pelo Fundo de Resolução nas transferências para o Novo Banco e devia ser mais cautelosa, mais pacata e ter mais reconhecimento desse esforço e concentrar-se numa boa gestão, prudente, rigorosa, e que rentabilize os seus ativos, de modo a exigir o menos possível ao Fundo de Resolução e ao resto do sistema financeiro”, defendeu Leão.
Ministro abre a porta a rever abrangência do subsídio de risco para profissionais de saúde na linha da frente
O PCP questionou o Governo sobre o ponto de situação de uma série de medidas aprovadas no Orçamento do Estado. O deputado Duarte Alves começou por falar do subsídio de risco, criado para os profissionais na linha da frente de combate à pandemia, para defender que “não se pode limitar a abrangência“. O apoio deve, considera, ser “aplicado a todos os trabalhadores de serviços essenciais”. Mas Duarte Alves refere que há vários trabalhadores de empresas de prestadoras de serviços com funções no Estado que não estão a ser abrangidos, assim como os técnicos de análises clínicas, que lidam diretamente com amostras de Covid-19.
João Leão abriu a porta a uma revisão da abrangência da medida. “Não faz sentido que pessoas que estejam expostas ao risco, de serviços essenciais, não estarem a receber esse subsídio. Temos de perceber em concreto os casos que são”, indicou.
Uma outra medida aprovada no OE 2021 foi a possibilidade da suspensão do pagamento por conta para micro, pequenas e médias empresas. Quanto a este tema, João Leão não se comprometeu com prazos, mas disse que a medida “carece de um despacho que será concretizado no âmbito do cumprimento da lei do Orçamento do Estado“.
Já sobre a contratação de 5.000 assistentes operacionais para as escolas, João Leão adiantou que a portaria foi aprovada e está “em concretização pelo Ministério da Educação”.
Leão espera que Estados-membros aprovem no início de maio suspensão das regras orçamentais
Já na parte da audição sobre o Programa de Estabilidade, o ministro das Finanças espera que, nas próximas semanas, a Comissão Europeia confirme a manutenção da suspensão das regras orçamentais, com tectos máximos para o défice e para a dívida pública, para 2022.
“Algo que esperamos conseguir nas próximas semanas é a confirmação por parte não só da Comissão, mas também do Ecofin [Conselho dos Assuntos Económicos e Financeiros], no âmbito da presidência portuguesa, da aplicação da cláusula de escape mais um ano” para que a prioridade dos países seja a “recuperação económica”.
Em março, a Comissão Europeia já tinha recomendado o prolongamento, até ao final de 2022, do regime de exceção das regras orçamentais devido à pandemia. A cláusula seria apenas desativada em 2023.
Ministro responde a críticas sobre investimento público: “Nos concursos assinados mais do que triplicámos valor do último ano de governação do PSD”
As críticas sobre a falta de investimento público vieram tanto da esquerda como da direita. Mas João Leão já tinha preparado um gráfico para lhes responder. O gráfico não reflete o investimento público realizado propriamente dito mas os concursos lançados e assinados, que “antecedem o investimento público”, explicou o ministro.
“Nos concursos assinados mais do que triplicamos face ao valor do ultimo ano de governação do PSD. Nos concursos lançados, o aumento é superior a 4 vezes o valor”, apontou. Segundo o gráfico — que o Governo diz ter como base dados da Aecops – Associação de Empresas de Construção e Obras Publicas e Serviços — , em 2020, o valor dos contratos celebrados foi de 3,4 mil milhões de euros, mais 44% do que em 2019. Já em 2015, esse valor ficou nos mil milhões.
Quanto aos concursos promovidos, de acordo com o gráfico, ficaram em 4,8 mil milhões de euros no ano passado, quatro vezes mais do que em 2015 (1,2 mil milhões). Na argumentação do ministro, é o baixo valor de 2015 que levou a que a execução do investimento público nos anos seguintes fosse reduzida.
“Portugal vai agora, ao nível do investimento público, regressar a níveis pré-crise — 2008, 2009 — em que o investimento público em Portugal na altura era dos mais elevados na Europa. Vamos chegar a esses níveis de investimento publico bastante elevados”, refere, acrescentando que o Plano de Recuperação e Resiliência será uma das alavancas.