Foi, mais uma vez, até à última. O Governo entregou já esta sexta-feira (minutos depois do prazo) o Programa de Estabilidade 2021/2025, um exercício de programação orçamental com fé nos milhões da “bazuca europeia” e uma previsão (já feita anteriormente e não concretizada) de descida da carga fiscal. A expectativa de crescimento da atividade económica devido ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) fez levantar o sobrolho ao Conselho das Finanças Públicas (CFP), que – apesar de endossar as contas – nota que o plano nem sequer está fechado com a Comissão Europeia.

Para o combate à pandemia, o executivo estima gastar este ano 3,5 mil milhões de euros, incluindo 400 milhões em vacinas. Ainda assim, menos do que vai custar até 2025 o descongelamento das carreiras dos funcionários públicos. E sobre o trajeto de aumento do salário mínimo para a Função Pública, o Governo guardou o melhor para o fim da legislatura. No ano de 2023 (quando for outra vez a votos) haverá a maior fatia no orçamento (em cinco anos) para aumentar o salário mínimo dos trabalhadores do Estado.

No site do parlamento, o documento surge mesmo com a data de entrada de 16 de abril (quando deveria, dentro do prazo, dizer 15).

As linhas gerais do documento já eram conhecidas, depois de João Leão ter antecipado em briefing, nesta quinta-feira, os principais indicadores que sinalizam o andamento da economia e das contas do Estado: um crescimento esperado de 4% este ano e de 4,9% em 2022; um défice de 4,5% do PIB este ano e uma redução para 3,2% em 2022; uma dívida pública que deverá cair até os 128% este ano e até aos 123% no próximo.

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João Leão prevê (outra vez) a carga fiscal mais baixa desde 2012

Medidas Covid-19 custam 3,5 mil milhões em 2021

As “principais medidas de emergência” (o Governo não especifica quais abrange ao certo nesta formulação) de combate à pandemia deverão ascender a 3.536 milhões de euros até ao final de 2021. Desta vez, ao contrário do que aconteceu no Programa de Estabilidade do ano passado, o Executivo não discrimina a despesa prevista para cada uma das medidas de apoio à economia e usa uma formulação mais lata. Na rubrica “apoios às empresas para suportar custos de trabalho” cabe desde o layoff simplificado ao apoio à retoma progressiva e o Governo prevê gastar 1.579,9 milhões de euros no total do ano. Mas fica por saber quanto espera dirigir especificamente para aquela que tem sido uma das medidas mais importantes na estratégia de resposta à pandemia — o layoff.

No Orçamento do Estado para 2021, o Governo destacou mais 309 milhões de euros para o apoio à retoma progressiva, o sucedâneo do layoff simplificado, mas não deixou nenhuma previsão para este último mecanismo — possivelmente por estar longe de pensar que o país regressaria a um confinamento geral no arranque do ano, que arrastou várias empresas de volta à paragem forçada e, assim, ao layoff.

Já nos apoios às empresas para suportar custos fixos — que incluem, por exemplo, o programa Apoiar, de subsídios a fundo perdido — a despesa deverá chegar, segundo o Programa de Estabilidade, aos 1.377 milhões. E no caso dos apoios extraordinários ao rendimento dos trabalhadores — onde estão, nomeadamente, o novo apoio social para os trabalhadores sem proteção social (o AERT) ou o apoio aos trabalhadores independentes, cujo desenho foi alterado no Parlamento à revelia do que queria o Governo — o valor pode atingir os 617 milhões de euros.

Na rubrica de outros apoios de proteção social, incluindo o apoio à família (criado para os pais que têm de ficar a tomar conta dos filhos devido ao encerramento das escolas), a despesa deverá ficar nos 105,6 milhões de euros. E para subsídios por isolamento profilático ou baixas por Covid-19 estão guardados 163,9 milhões de euros. No bolo das medidas extraordinárias cabem também as que foram pensadas para compensar os trabalhadores da administração pública — mais concretamente os profissionais de saúde, com os prémios pagos sobre as horas extraordinárias ou o subsídio de risco. Esta rubrica deverá custar 270 milhões de euros.

O Governo prevê ainda gastar 100 milhões de euros em testes à Covid-19, 500 milhões para equipamentos de proteção individual e medicamentos e 400 milhões para a aquisição de vacinas. Em dezembro, a ministra da Saúde, Marta Temido, anunciou que o país iria comprar 22 milhões de vacinas por 200 milhões de euros. Mas recentemente, em março, em entrevista à Lusa, disse que, afinal, Portugal iria comprar mais imunizantes (38 milhões), o que iria permitir apoiar outros países.

Tudo somado, a despesa ficará em 5,1 mil milhões, que em parte poderão ser compensados com a receita prevista vinda do REACT EU, um dos mecanismos do Plano de Recuperação Europeu, e do Fundo Social Europeu. Tendo estes valores em conta, os gastos finais podem ficar pelos 3.536 milhões de euros.

O Programa de Estabilidade prevê também 7.000 milhões de euros em apoios às empresas, um valor que se divide entre as ajudas diretas (5.000 milhões) e indiretas (2.700 milhões) até 2026. No caso dos apoios diretos, a fatia de leão vai para a capitalização de empresas (1.550 milhões), seguida da inovação (1.364 milhões). Há ainda lugar a apoio à descarbonização (715 milhões), transição digital (650 milhões), a qualificação de recursos humanos (630 milhões) e a bioeconomia (145 milhões).

Já quanto aos apoios indiretos, destaque para as infraestruturas (690 milhões de euros), à frente da digitalização da administração pública (578 milhões), a qualidade das finanças públicas (406 milhões), a gestão hídrica (390 milhões), o hidrogénio e energias renováveis (371 milhões), a justiça económica e ambiente de negócios (267 milhões) e a eficiência energética dos edifícios (70 milhões).

A carga fiscal vai descer. Mas será desta?

O Governo espera para 2021 uma carga fiscal de 33,7%, o que, a verificar-se, significará o valor mais baixo desde 2012. O Programa de Estabilidade antecipa que o PIB cresça 4% face a 2020, para cerca de 210 mil milhões de euros, dos quais cerca de 71 mil milhões em impostos e contribuições sociais efetivas.

E nos anos seguintes, se as contas do Governo baterem certo, a carga fiscal (receita com impostos e as contribuições efetivas à Segurança Social em proporção da riqueza anual gerada pelo país) não volta a superar os 34% ao longo de todo o período do Programa de Estabilidade, até 2025. Em 2022, João Leão acredita que deve descer ainda mais, para 33,0%, valor que se mantém em 2023. Depois, deverá ter subidas ligeiras em 2024 (para 33,1%) e em 2025 (para 33,2%).

O contributo para a redução, tal como prevista pelo Governo, é transversal às diferentes componentes, que vão tendo cada vez menos menos peso na riqueza gerada pelo país ao longo dos próximos anos. Nos impostos sobre produção e importação (que incluem o IVA e a generalidade dos impostos sobre o consumo), o peso no PIB cai de 14,4% para 14,2% em 2021, continuando a descer para 13,9% em 2022 e 13,8% nos anos seguintes.

Também nos impostos sobre o rendimento e património, como IRS e IRC, a redução é progressiva: de 9,9% do PIB em 2020 para 9,5% em 2021 e 9,3% em 2022, valor que se mantém em 2023 e sobe depois uma décima no ano seguinte.

Finalmente, as contribuições sociais caem de 12,6% para 12,3% este ano e para 12,0% em 2022. No ano seguinte, há ainda a descida de uma décima, estabilizando o valor em 11,9% para o restante período.

Mas será que é agora que a carga fiscal desce mesmo? A verdade é que aquando da última previsão, para 2020, o Governo não conseguiu antecipar o que aconteceria apenas alguns meses depois.

Em outubro, João Leão estimava no Orçamento do Estado que a carga fiscal tivesse atingido 33,9% do PIB no ano passado. Seria, tudo indicava, a menor carga fiscal desde 2012, ou seja, um retorno ao ano em que os portugueses ainda não tinham sentido o “enorme aumento de impostos” em sede de IRS anunciado por Vítor Gaspar, então ministro das Finanças.

João Leão, na verdade, até acabaria por contar com a ajuda direta da evolução económica para essa redução da carga fiscal — uma recessão mais branda, de 7,6% em vez dos 8,5% previstos pelo Governo no OE2021. Como a carga fiscal é calculada em percentagem do PIB, há uma redução automática por essa via. Mas aquilo com que o Governo não contaria também era que, apenas três meses depois de apresentar o OE2021, o ano fechasse com mais 3 mil milhões de euros de receita arrecadada do que o previsto.

OE2021. Pandemia leva carga fiscal para o valor mais baixo em oito anos

Em comunicado, quando o INE divulgou os números em final de março, o Ministério das Finanças atribuiu o feito “à resiliência do mercado de trabalho e das empresas”, tendo em conta as ajudas que os agentes económicos receberam para fazer face à crise e para compensar as perdas pelas restrições impostas em tempos de pandemia. Os apoios estatais impediram falências e desemprego, permitindo ao Governo arrecadar mais impostos e contribuições sociais: a receita do IRS ficou 380 milhões de euros acima do previsto; as contribuições para a Segurança Social superaram a previsão em 800 milhões de euros; e o IRC ficou 1270 milhões de euros acima do antecipado.

Agora, para 2021, o executivo acredita que não só a carga fiscal vai baixar para 33,7% como vai manter esses níveis ao longo de 5 anos, sempre abaixo de 34% — o número à volta do qual tem rondado este indicador desde 2013. Nesse ano foi esse exatamente o valor atingido (34,0%), e, após algumas oscilações, atingiria o tal máximo de 34,9% no ano passado.

Estas previsões surgem num panorama em que a atividade económica deverá acelerar de forma atípica nos próximos tempos, fruto da forte recessão no ano passado e do esperado fim da pandemia entre este ano e o próximo, mas também do dinheiro fresco da União Europeia para fazer face à crise: para já, este ano, a bazuca europeia deverá contribuir com 715 milhões de euros, mas já em 2022 haverá cerca de 3 mil milhões de euros, valor semelhante aos dos anos seguintes.

Défice atinge 5,7% em 2020, melhor do que o previsto pelo Governo

Apesar de ter havido um segundo confinamento no início do ano, o Governo espera, por isso, um crescimento de 4% este ano e 4,9% no ano seguinte, o que está próximo de outras previsões que têm sido feitas: apesar de o Conselho das Finanças Públicas antecipar uma subida de 3,3% em 2021, faz as mesmas contas do que o Governo (+4,9%) para o ano seguinte; e tanto o Banco de Portugal como o FMI estimam 3,9% para este ano (menos uma décima do que o Governo), embora haja uma divergência um pouco maior no ano seguinte — 4,8% e 5,2%, respetivamente.

É este crescimento que deverá sustentar a redução da carga fiscal, uma vez que a receita com impostos e contribuições deverá continuar a aumentar até 2025. João Leão antecipa um aumento da receita com impostos em 2,7% este ano; 3,9% no próximo; e 4,1% em 2023. Já nas contribuições sociais efetivas, está em causa um aumento da receita de 2,8% em 2021; outros 4,1% em 2022; e 4,5% em 2023.

Salário mínimo: Governo deixa o melhor para o fim

O Executivo já se comprometeu por diversas vezes a chegar ao final da legislatura (2023) com o salário mínimo nos 750 euros (atualmente está nos 665 euros). Mas ainda não disse nem qual o valor para 2022, nem se pretende ir além para os seus trabalhadores (pode escolher colocar o salário mínimo da função pública acima do do privado). Ainda assim, o Programa de Estabilidade parece antever que o Governo está a guardar o melhor para o fim (leia-se 2023, ano de eleições legislativas).

Segundo o documento, o aumento do salário mínimo para a Função Pública este ano vai custar 35 milhões de euros, valor que deverá subir para os 72 milhões de euros em 2022. Mas é em 2023 que a despesa mais sobe: poderá chegar aos 116 milhões esse ano para voltar a descer em 2024 (52 milhões) e 2025 (54 milhões).

No geral, a despesa com os trabalhadores da administração pública deverá crescer à volta dos 3% nos próximos anos (3,6% em 2021 e, na média de todos os anos até 2025, 3,1%), uma evolução que o Governo justifica com medidas de “promoção e valorização profissional”, onde está incluído o aumento do salário mínimo; a continuação das progressões e as “valorizações remuneratórias associadas aos ciclos avaliativos”; e os “reforços de profissionais dos serviços em diferentes áreas, nomeadamente na área do Serviço Nacional de Saúde e da capacitação técnica do Estado através da contratação de técnicos superiores, da valorização do seu estatuto e da criação dos centros de competência”.

Neste bolo, inclui-se, portanto, o descongelamento das carreiras dos funcionários públicos, que começou em 2018, e da mitigação dos efeitos do congelamento do tempo de serviço nas carreiras especiais, como os professores (que recuperaram dois anos, nove meses e 18 dias). Até 2025, estas rubricas vão custar quase 4.000 milhões de euros, em parte compensadas por uma receita (com IRS, contribuições sociais e descontos para a ADSE) de 1.712,6 milhões.

No Programa de Estabilidade, o Governo revê em alta as despesas com pessoal dos primeiros três meses deste ano. “A variação constante do relatório do OE2021, é revista no Programa de Estabilidade para 3,6% (mais 861 milhões de euros), ajustando à evolução do primeiro trimestre e aos compromissos assumidos no âmbito da discussão do OE2021 na especialidade, nomeadamente ao nível da contratação de trabalhadores, suplementos e subsídios”, justifica.

O Orçamento deste ano criou ainda o suplemento de penosidade e insalubridade da carreira geral de assistente operacional e o subsídio de risco extraordinário para trabalhadores da saúde, forças e serviços de segurança, no âmbito da pandemia. “Estes compromissos terão um impacto faseado entre 2021 e 2022, acrescendo aos aumentos de despesas com pessoal associado a outras contratações, ao normal desenvolvimento das carreiras com as consequentes progressões e promoções e ao impacto do salário mínimo.”

Nos anos de 2022 até 2025, “prevê-se um crescimento das despesas com pessoal muito significativo, em torno de 3%, indo ao encontro do inscrito no Programa do Governo. Nestes anos, os encargos com o normal desenvolvimento das carreiras (progressões e promoções), contratações e salário mínimo assumirão a maior parte do crescimento da massa salarial”.

Conselho das Finanças Públicas volta a queixar-se da falta de detalhe

Já é um clássico com os documentos apresentados pelo ministério de João Leão (tal como eram os de Mário Centeno): o Conselho das Finanças Públicas considera que o Programa de Estabilidade não dá detalhes suficientes – em determinados pontos – para avaliar se é concretizável ou não. Desta vez, salienta a entidade, é a previsão que o Governo faz para o crescimento da atividade económica, suportada pelos investimentos por via do Programa de Recuperação e Resiliência (conhecido coloquialmente como “a Bazuca Europeia”).

CFP menos otimista para 2021, mas 2022 é ano de brilharete — economia mete prego a fundo e Estado controla contas

Para começar, o documento inclui “medidas subjacentes ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que não foram especificadas em detalhe suficiente”. E mesmo essas medidas em pouco detalhe não são certas. “Para 2021, a previsão mais favorável do MF para a dinâmica da economia portuguesa assenta num pressuposto de absorção de fundos do PRR, cuja execução poderá estar condicionada por vários fatores”, salienta o CFP, listando logo dois.

O primeiro é evidente: o Programa de Estabilidade dá como certo algo um PRR que, neste momento, ainda está em negociação com a Comissão Europeia. A versão final do plano ainda terá que ser sujeitada à aprovação do Conselho da UE. Mas mesmo que o PRR venha a ser aprovado brevemente, em Portugal ainda “não foram identificados projetos de investimento que permitam dinamizar os montantes reportados pelo MF para o ano 2021”.

“Com base na informação disponibilizada pelo Ministério das Finanças, o Conselho das Finanças Públicas estima que o Programa de Estabilidade 2021 tenha implícito um rácio do acréscimo no PIB até 2025 (face ao cenário em políticas invariantes) no montante total das medidas do PRR de cerca de 1,4”. Ou seja – e tal como diz a equipa de João Leão – “cada euro investido no PRR traduz-se em 1,4 euros de impacto no PIB”. E posto de outra forma: até 2025 o nível do PIB será aproximadamente 3,0% superior ao que ocorreria na ausência do PRR.

Mas as dúvidas do CFP subsistem. “A carência de maior detalhe sobre a natureza e montantes das medidas concretas subjacentes ao PRR, ou a sua inexistência, aumentam a incerteza sobre as perspetivas de crescimento da economia portuguesa no médio prazo”.

Governo reserva 430 milhões para o Novo Banco

O Novo Banco anunciou, no mês passado, que iria pedir ao Fundo de Resolução 598 milhões de euros, mas tanto o Fundo como as Finanças disseram que tinham dúvidas sobre o valor pedido, argumentando que pecaria por excesso. A dúvida que ficou por responder foi qual seria o valor adequado na ótica do Executivo (o Fundo de Resolução logo disse que tinha dúvidas sobre 166 milhões de euros, o que daria uma injeção de 432 milhões).

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Agora, no Programa de Estabilidade, o Governo prevê uma despesa pública com o banco de 430 milhões de euros este ano, uma medida “one-off” (ou seja, é apenas paga uma vez na totalidade) que está no estado “a adotar”. Esse valor não estava inscrito no Orçamento do Estado — aliás, o Parlamento aprovou, na especialidade, a eliminação do OE da transferência de 476 milhões de euros do Fundo de Resolução para o Novo Banco.

Só que, numa entrevista depois desse episódio, João Leão disse que Portugal “é uma pessoa de bem” que “tem de cumprir os contratos” [neste caso, o contrato com a Lone Star]. Na altura, o ministro das Finanças adiantou que o Governo estava a estudar “diferentes alternativas para garantir que Portugal cumpre os compromissos que assume” — o que poderia passar por um pedido de fiscalização ao Tribunal Constitucional por violação da lei de enquadramento orçamental. Esse nó ainda está por desatar.

Já a TAP, e como esperado, deverá contar com uma injeção de 970 milhões de euros em 2021, no âmbito do plano de reestruturação, um valor que soma aos 1,2 mil milhões de euros injetados no ano passado. Para 2022, o PE prevê outros 800 milhões de euros.

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Onde estão as garantias do Estado?

Os passivos contingentes (gastos considerados prováveis, mas que, por regra, não se concretizam — ou não se concretizam totalmente) passam de 9,68% do PIB em 2020 para 11,88% em 2021, ou seja, perto de 25 mil milhões de euros em garantias públicas, segundo o Programa de Estabilidade. A informação consta de um quadro que ainda não integrava o documento quando foi publicado esta madrugada no site da Assembleia da República — e que foi acrescentado numa versão corrigida na manhã desta sexta-feira.

Como nota de rodapé, ainda há uma explicação de que aqueles valores incluem garantias concedidas às Administrações Públicas, mas o Governo não diz quais. Aliás, nada mais refere sobre o tema, ao contrário de outros Programas de Estabilidade do passado.

Mesmo o documento de 2020 — que foi excecionalmente curto num contexto do primeiro embate da pandemia — tinha detalhado o impacto que teriam as linhas de crédito com garantias do Estado.

No ano anterior, antes da pandemia, o Programa de Estabilidade 2019-2023 tinha, como é habitual, um quadro em que detalhava as Garantias Concedidas ao Sector Bancário e a Outras Entidades, sobretudo na órbita do Estado.

Na altura, havia cerca de 17 mil milhões de euros em garantias públicas até ao final de 2018, com destaque para a Infraestruturas de Portugal, a Metropolitano de Lisboa (ambos com cerca de 2 mil milhões de euros em garantias) e a Parvalorem (1,2 mil milhões), num total de 14 entidades (duas das quais nas regiões autónomas).

Recuando mais um ano, no PE2018/2022 essa mesma informação era repartida por dois quadros, uma dedicada a essas entidades, a outra aos apoios à banca. A mesma organização que encontramos no PE2017/2021 e no PE2016/2020.

Em todos esses casos, não havia só quadros, mas também as respetivas explicações. Desta vez, no entanto, apesar de o Governo ter preenchido a tabela relativa aos passivos contingentes, não há qualquer referência (ainda) às garantias concedidas.

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Esta é uma questão que tem gerado preocupação a várias entidades. A CMVM, por exemplo, alertou em janeiro para o impacto que poderiam ter os passivos contingentes que estavam a ser gerados por estas garantias públicas adotadas na sequência da pandemia.

“Deverá ser dada particular atenção ao impacto que esses passivos contingentes irão ter na dívida pública nos próximos anos e como irá ser efetuado o reconhecimento de perdas”, lia-se no relatório Perspetivas de Risco para 2021.

O próprio ministro das Finanças avisou há pouco mais de duas semanas que teria de “rever bastante em alta os custos associados” aos apoios “que resultam das linhas [de crédito] com garantia do Estado”, porque “uma parte disso — vai ter impacto nas contas públicas, quer em 2021 quer em 2022”.

Quanto é que custarão essas linhas de crédito ao Estado? Para já, a informação que o Tribunal de Contas recebeu do Banco de Fomento, referente a setembro, previa que uma média de 16,5% do crédito acabasse por não ser pago, ou seja, 1.119 milhões de euros. Mas é esse o valor da sinistralidade dos créditos que o ministro das Finanças já assumiu que terá de ser revisto. Não há, no entanto, qualquer indicação ou pista sobre o assunto no Programa de Estabilidade para 2021-2025. O Observador aguarda explicações do Ministério das Finanças.

João Leão reconhece que custos com apoios são maiores do que o previsto e défice deste ano deverá ser revisto