Portugal não voltará à austeridade“, garantiu nesta quarta-feira João Leão, o ministro das Finanças, numa audição parlamentar em que o PSD o acusou de não ser “sério” por estar a comparar duas crises que foram “completamente diferentes”. E o CDS-PP recomendou a Leão que não faça comparações “populistas” e lembrou que foram o PS e José Sócrates que chamaram a troika. O ministro garante que “os apoios estão a chegar a quem precisa” – ao contrário do que disse a OCDE esta semana – mas deixa um aviso à navegação, para a negociação orçamental dos próximos meses: o “próximo Orçamento não será mais fácil ou menos exigente do que os anteriores“.

João Leão realçou que “a suspensão temporária das regras orçamentais em 2022 permite-nos manter os estímulos de natureza extraordinária à economia”. Por outro lado, “permite também passar gradualmente de medidas de emergência para medidas de apoio ao forte relançamento da economia, com o apoio do Programa de Recuperação e Resiliência”.

Recordando o excedente das contas públicas em 2019, João Leão alegou que “foi esse rigor e esse sentido de responsabilidade que nos permitiu encarar a atual crise de forma completamente diferente da crise anterior“.

Muitos portugueses recordam os sacrifícios impostos pela troika e estou seguro de que nenhum de nós quererá voltar a esses tempos.”

O PSD criticou João Leão por comparar “coisas que não são comparáveis”, aludindo às diferenças profundas que existem entre a crise de 2011 e a crise pandémica. “Não é sério, não é correto nem é honesto do ponto de vista intelectual” fazer essa comparação porque “a crise foi completamente diferente”, atirou o deputado Afonso Oliveira.

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Também Cecília Meireles, do CDS-PP, recomendou a João Leão que “não se ponha a fazer comparações entre crises porque elas não são felizes para o Partido Socialista”. A deputada lembra que “havia um governo, liderado por um primeiro-ministro do partido que hoje está no governo, chamado José Sócrates que conduziu a resposta à crise de 2008 de uma tal forma que acabou por deixar o país à beira da bancarrota e ser preciso chamar a troika”.

E para onde foi essa despesa pública [de Sócrates] e que retorno é que teve para o País é uma coisa que eu imagino que vários economistas estudem. E o Ministério Público também”, atirou Cecília Meireles.

João Leão sublinhou que “ao contrário de alguns países que já anunciaram aumentos de impostos para pagar a fatura da crise, Portugal não voltará à austeridade“, sublinhou João Leão, acrescentando que os membros do Governo estão “comprometidos com a estabilidade fiscal e com o regresso à trajetória de recuperação de rendimentos”.

Porém, atirou: “A ameaça à estabilidade das finanças públicas poderá sim resultar de uma perceção errada de que não temos de fazer escolhas e que podemos, sucessivamente, tomar medidas avulso, de forma descoordenada e desenquadrada de uma estratégia orçamental”, advertiu João Leão.

Barragens: “Este é o tempo de a AT trabalhar neste processo”

Sobre a polémica das barragens, trazida ao debate pelo PSD, João Leão afirmou que “este é o tempo de a Autoridade Tributária (AT) trabalhar neste processo”. “Na última vez que viemos aqui à Assembleia falar sobre esse processo demos nota de que a AT já estava a recolher elementos no âmbito desse processo”.

Nesta fase, diz João Leão, “num estado de direito, a AT não pode avançar antes do momento oportuno. Só depois de as entidades fazerem as suas declarações. É nesse âmbito que a AT pode fazer a sua investigação”.

Para o PSD, que tinha feito a pergunta, esta resposta foi interpretada como um reconhecimento por parte do Governo de que ainda não tem um relatório feito sobre “um caso destes que é da máxima importância”.

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Relatório da OCDE não quantifica apoios aos salários

Questionado pelo PSD sobre o relatório da OCDE que coloca Portugal entre os países menos esforço orçamental fizeram para ajudar pequenas e médias empresas durante esta crise – cerca de 25% das PME com elevada quebra de rendimentos não tiveram qualquer tipo de ajuda.

Uma em cada quatro PME não tiveram apoios na pandemia

“No que toca a Portugal falta – não está, sequer, quantificado – o principal instrumento de apoio às empresas que Portugal tem”, afirmou João Leão, referindo-se a medidas como o layoff pago a 100%.

“A parte dos apoios massivos aos custos maiores que as empresas têm, que são os custos do trabalho, no caso português não está considerado”, afirmou João Leão, acrescentando que que “o relatório não permite comparar os países”.

Sobre outro tema, trazido pelo PCP, o aumento recente dos preços dos combustíveis, João Leão comentou apenas que o Governo tem “sempre uma preocupação de acompanhar e garantir que há uma efetiva regulação deste mercado e garantir que não há margens excessivas por parte dos distribuidores”, ou seja, “garantir que há uma sã concorrência” entre as empresas do setor que faça com que “os preços não aumentem de forma excessiva em relação à evolução do preço do petróleo”.

Por outro lado, diz o ministro, “sabemos que há a questão dos objetivos ambientais que são críticos e com os quais Portugal está comprometido”, no que diz respeito à redução de emissões poluentes. João Leão lembrou que em Espanha, por força desses objetivos ambientais, está a ser preparada uma subida dos preços dos combustíveis (da carga fiscal associada), que irá agravar os preços em cerca de 20 cêntimos por litro no país vizinho, diz o ministro.

Em Portugal, cerca de 60% do preço final pago pelos combustíveis correspondem a carga fiscal.

Combustíveis já subiram para o preço mais elevado desde 2012 – e devem continuar a aumentar

Os deputados questionaram João Leão, ainda, sobre o fim das moratórias, que foi “chumbado” pela Autoridade Bancária Europeia (a EBA). Portugal “já explorou até ao limite as oportunidades que a EBA deu“, afirmou o ministro das Finanças, reconhecendo que houve contactos com o supervisor – até no âmbito da presidência portuguesa da UE – mas “a EBA não deu indicação de querer estender o prazo das moratórias”, acrescentou.

Do lado do Governo, “vamos continuar a insistir” para que o supervisor possa ter uma opinião diferente mas “não será fácil“, rematou o ministro das Finanças, reiterando o que já tinha sido dito pelo ministro da Economia: está a ser preparado um programa de apoio às empresas para quando terminar o período das moratórias, para fazer a transição e “retomando o pagamento das suas prestações em condições mais favorecidas”, no caso das empresas que ainda não têm a recuperação assegurada à medida que se prolonga a crise pandémica.