O primeiro-ministro António Costa esteve esta quarta-feira em Sines, na apresentação de um projeto de ampliação do polo industrial local. O projeto custará 657 milhões de euros, resulta de um acordo entre o Governo e a empresa Repsol e António Costa pareceu aproveitar a oportunidade para uma indireta à concorrente da empresa, a Galp, que o PM criticara de forma veemente em setembro pelo encerramento da refinaria de Matosinhos.

Elogiando a Repsol, uma “empresa de origem petrolífera” que “dá um excelente exemplo do que significa o compromisso com a transição climática“, António Costa defendeu: “Temos de mudar de paradigma e isso vai impactar forma de vida de muitas empresas do setor petrolífero”.

Para o primeiro-ministro, “a boa resposta” de uma empresa do setor petrolífero “não é desinvestir, é investir naquilo que permite descarbonizar e que permite continuar a servir a comunidade através de novos produtos de maior valor acrescentado, mais recicláveis, que permitam dinamizar a economia circular e que permitam contribuir para a transição energética”.

A Repsol não se coloca no lado errado da história, quer estar na vanguarda do lado certo da história. É um excelente exemplo para todas as empresas que, como a Repsol, têm a sua raiz na petroquímica e têm de necessariamente saber reinventar-se para o futuro”, defendeu Costa.

Em setembro, António Costa criticara a decisão da Galp de encerrar a refinaria de Matosinhos, anunciada aos trabalhadores da empresa quatro dias antes da véspera de Natal (a 20 de dezembro). Para o PM, tratou-se de uma “insensibilidade social” e também de um exemplo de “total irresponsabilidade social”, dado que a Galp, acusava, “não preparou minimamente a requalificação e as novas oportunidades de trabalho e de prosseguir a vida ativa para os trabalhadores que iriam perder os seus postos de trabalho”.

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O primeiro-ministro criticara ainda a empresa por deixar “um enorme passivo ambiental de solos contaminados, não dialogando previamente com a câmara nem com o Estado sobre o que pretende fazer depois de encerrar a refinaria”. E rematou de forma especialmente crítica: “Era difícil imaginar tanto disparate, tanta asneira, tanta insensibilidade, tanta irresponsabilidade, tanta falta de solidariedade como aquela de que a Galp deu provas aqui na refinaria de Matosinhos“.

Já esta quarta-feira, no mesmo discurso em que elogiou a Repsol, o primeiro-ministro vincou a importância de “Portugal continuar a ser seguro e previsível na sua trajetória económica e estabilidade financeira” — algo que, notara, tinha sido referido pouco antes pelo ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, ali presente.

Costa aproveitou ainda para fazer um auto-elogio, aludindo aos resultados da sua governação: “Foi possível provar que era possível virar a página da austeridade com contas certas, tendo-se mesmo atingido o primeiro excedente orçamental em 2019. Conseguimos provar que fomos capazes de enfrentar uma crise [da Covid-19]. Foi notável a resiliência das empresas e dos empregos. Ao contrário de outras crises, onde atingimos 18% de desemprego, nunca ultrapassámos os 8% na atual crise e estamos atualmente nos 6,4%“.

Como diz no futebol, em equipa que ganha não se mexe. Em políticas que ganham também convém não mexer, há que dar continuidade — o que implica estabilidade para que possamos continuar passo a passo construir o futuro. Ou como diz o slogan da Repsol, para que possamos inventar o futuro”, gracejou o PM.

Costa volta a atacar a Galp. “Era difícil imaginar tanto disparate, tanta asneira” como o que a empresa fez em Matosinhos

Costa diz que a Europa tem de se reindustrializar

O primeiro-ministro defendeu ainda, em Sines, que a Europa tem de fazer um esforço de reindustrialização e, ao mesmo tempo, de ser capaz de o associar a uma política comercial mais ativa.

O chefe do Governo português notou ainda que “a autonomia estratégica da Europa é essencial” e que a União Europeia (UE) “não pode estar tão dependente, como está, de bens essenciais”.

A título de exemplo, recordou a falta de “coisas tão básicas como as máscaras”, no início da crise da pandemia de Covid-19, mas também, atualmente, “a falta de microchips que hoje paralisam muitos setores de atividade por falta e roturas na cadeia de abastecimento”.

“Sim, a Europa não pode estar tão dependente do exterior. Tem de fazer um grande esforço de reindustrialização e tem de ser capaz de voltar a produzir na Europa aquilo que, de forma imprevidente, deslocalizámos para outras regiões do mundo”, frisou o primeiro-ministro de Portugal.

No entanto, “essa autonomia estratégica não pode significar protecionismo nem isolamento”, lembrou António Costa. Tem de significar, isso sim, “reforço da capacidade industrial”, mas “também tem de ser capaz de associar esse esforço a uma política comercial mais ativa, que valorize aquilo que é a maior força da Europa, que é sermos uma das três maiores economias à escala global. Essa é a nossa grande força e é essa força que temos de pôr em conjunto”, sustentou.

Nesse sentido, António Costa considerou que o contrato de investimento assinado entre o Governo e a Repsol, que prevê incentivos fiscais de até 63 milhões de euros para um projeto de 657 milhões de euros, “mostra que tudo isto é possível e não tem de se ficar por palavras e por discurso”.

“[São] duas novas fábricas que vão produzir bens essenciais para dar suporte ao conjunto da indústria europeia, da indústria automóvel à agroalimentar. E isto reforça a nossa autonomia, mas não nos fecha ao mundo. E é por isso que dessas duas fábricas, 90% [da produção] se destinarão, aliás, à exportação. Porque é fundamental, cada vez mais, exportarmos para todo o mercado global”, concluiu o primeiro-ministro.