Diz ainda não estar habituado ao reconhecimento, mas esta quarta-feira voltou a receber uma distinção. O coordenador da extinta task force que geriu o processo de vacinação contra a Covid-19, Henrique Gouveia e Melo, foi distinguido com o Prémio Nacional de Bioética. Na cerimónia que decorreu na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, o vice-almirante dedicou a medalha de prata que recebeu aos portugueses por não caírem na “tentação fácil da dúvida”.
Gouveia e Melo diz ser “útil” que alguém responda pelo processo de vacinação
“Quando me vêm perguntar do estrangeiro qual foi o segredo [do processo de vacinação que coordenou], às vezes dá-me vontade de responder coisas muito esquisitas (…), dá vontade de responder se querem uma transfusão genética do gene português, se querem uma transfusão da cultura portuguesa, porque as pessoas pensam que há um truque qualquer”, destacou Gouveia e Melo. O sucesso, acrescenta, teve um fator: os portugueses não caíram “na tentação fácil da dúvida” face à ética de se defenderem enquanto comunidade.
O processo de vacinação em Portugal correu bem. Fruto de um conjunto de circunstâncias conseguimos unirmo-nos numa coisa muito positiva, de forma conjunta, com todas as partículas da nossa sociedade. Conseguimos superar outros países e mostrar que não temos nenhum gene nem nada que nos inferiorize”, reforçou.
Perante uma plateia de mais de uma centena de pessoas que, no auditório da FMUP, o aplaudiram de pé, Gouveia e Melo não trouxe discurso preparado, falou “do coração” e emocionou-se ao falar do filho médico e do futuro que se avizinha. “O meu filho mais velho é médico. Lembro-me de a minha família ter confinado toda menos nós os dois. E ele disse uma das coisas que me marcou: ‘Pai, vamos ter oportunidade de combater os dois na mesma guerra'”, recorda, destacando o “sentido de serviço, de entrega, de dedicação à comunidade” como aspetos de união.
O vice-almirante, que admitiu ainda não se ter habituado ao “reconhecimento público”, disse já só “olhar para o futuro”, no qual considera que os portugueses têm de mostrar “ambição”. “Acho que temos futuro enquanto povo, uma consciência muito própria, uma língua e cultura muito viva, só temos de ter ambição alta, não ter medo de trabalhar e não nos deixarmos de submeter a nenhuma vergonha que nos querem impor de fora”, disse.
Já em declarações aos jornalistas à margem da sessão, Gouveia e Melo salientou ser fundamental ter confiança no futuro. “Enquanto comunidade estamos cá há 900 anos, já superamos muitas coisas porque é que não havemos de ter confiança? Temos é de lutar por isso, não podemos acreditar que alguém vai resolver os nossos problemas por nós, como resolvemos a pandemia”, acrescentou.
Na atribuição do Prémio Nacional de Bioética, distinção atribuída desde 2007 pela Associação Nacional de Bioética, o seu presidente, Rui Nunes, destacou a integridade e o espírito de missão e de serviço de Gouveia e Melo.
Ao longo da campanha [de vacinação] ressaltou o espírito de missão e profundo espírito de serviço (…) Este planeamento não vai deixar o sistema de saúde indiferente. a campanha de vacinação mostrou uma nova dimensão da portugalidade”, assegurou.
Também o diretor da FMUP, Altamiro da Costa Pereira, salientou que a medalha atribuída ao Vice-Almirante deveria ser “em ouro e não prata”, pois “não é sinónimo do real valor” de Gouveia e Melo e do trabalho desenvolvido enquanto coordenador do plano de vacinação contra a Covid-19.