O ex-secretário-geral do PS António José Seguro propôs esta sexta-feira a criação de um “fundo para a democracia” por onde todos os donativos destinados a partidos políticos passariam, com o objetivo de trazer “maior transparência” aos financiamentos políticos.

Falando na Universidade Lusíada, numa conferência intitulada “O financiamento político: as diferentes perspetivas”, o ex-secretário-geral socialista — que foi também coordenador do PS, em 2002 e 2003, para as alterações à lei do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais em no âmbito da comissão parlamentar para a reforma do sistema político — começou por abordar o dilema entre financiamento exclusivamente público ou exclusivamente privado dos partidos políticos, considerando que “há boas razões para defender a exclusividade do financiamento público”.

Apesar disso, o ex-secretário-geral socialista salientou que esse tipo de exclusividade levantaria duas questões: a primeira seria a de saber se os militantes poderiam continuar a dar dinheiro aos partidos, através do pagamento de quotas e, caso o fizessem, se isso deveria “obedecer a uma lista escrutinável com nomes, ou entra no direito da privacidade de um cidadão ou de uma cidadã poder escolher o seu partido”.

A outra questão é o dinheiro que não é escriturado, é o dinheiro que passa pelo lado, é o dinheiro que passa por trás, é o dinheiro que é dado a pessoas, e aí eu tenho dificuldade em ver como é que um financiamento exclusivamente público consegue resolver essa questão”, indicou.

Nesse sentido, António José Seguro, que é também professor no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) e na Universidade Autónoma, defendeu que deveria ser ponderada a “criação de um fundo para a democracia”, por onde “todos os donativos, quer públicos, quer privados, tivessem ser direcionados”, com “afetação do partido a quem se dirigia, ou do candidato numa eleição presidencial”.

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“Teria que ser esse fundo a fazer também a despesa em nome dos partidos, (…) ou seja, no seu orçamento [o partido] indica não apenas as receitas, as despesas, mas também o fornecedor desses serviços, e quem paga ao fornecedor desses serviços não é o partido, mas esse fundo, com os recursos que estão afetos a esse partido ou candidato”, frisou.

Apesar de reconhecer que se trata de um “mecanismo difícil”, o ex-secretário-geral socialista salientou que o fundo obedeceria a dois princípios: “todo o dinheiro que entra tem de ser escriturado — sabe-se de onde vem e é escrutinável — e toda a despesa que é feita por um candidato ou um partido também é escrutinável porque é pago por esse fundo”.

Considerando assim que esse mecanismo permitiria que existisse uma “certificação”, António José Seguro reconheceu que isso seria “mais fácil” de fazer “no material impresso e nas coisas que são visíveis”, mas é “muito difícil de fazer em redes sociais”.

Temos aqui um exercício que é impossível de resolver a 100%, mas que pode ser fortemente limitado. E, portanto, eu diria que encontramos soluções que trabalhem na origem da receita do financiamento, mas também na forma como a despesa é feita, é uma questão muito importante e vital para o financiamento e para introduzir maior transparência”, frisou.

Intervindo no painel anterior ao de António José Seguro, o ex-líder social-democrata Luís Marques Mendes também abordou a questão do financiamento exclusivamente público, considerando que essa exclusividade seria a única maneira de “cortar o mal pela raiz” no que se refere a pagamentos ilícitos.

“Eu acho que o financiamento deveria ser exclusivamente público, só permitir financiamento privado de quotas dos militantes, só isso. (…) E eu explico porquê: (…) quando surge um caso em concreto de financiamento ilegal, a democracia leva um murro no estômago monumental”, indicou.

Marques Mendes considerou assim que “os partidos funcionarem bem, com transparência, rigor, e não serem fomentadores de corrupção, é um bem inestimável para a democracia”.