Desde o início da pandemia até ao dia 24 de dezembro de 2021, quando se estimava que a Ómicron representava uma proporção de 61,5% dos contágios, havia um total de 1.266.037 casos confirmados de SARS-CoV-2. Desde aí, a proporção ultrapassou os 93% e registaram-se mais 988.546 casos até dia 24 de janeiro de 2022 (44% deles desde 2020).

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Entre os casos de infeção com a Ómicron estão pessoas não vacinadas (que estiveram ou não infetadas antes), pessoas que já tinham o esquema vacinal completo e pessoas recuperadas da infeção. Entre os infetados, há quem deixe de testar positivo ao fim de poucos dias e outros que continuam a acusar a presença do vírus ao fim de sete, 10 ou mais dias.

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Com uma elevada taxa de transmissibilidade, capacidade de escapar aos anticorpos neutralizantes — criados em resposta a infeções anteriores ou à vacina contra a Covid-19 — e muito mais mutações que as variantes anteriores na proteína spike (a que ajuda o vírus a infetar as células humanas), resta perguntar se teremos maior probabilidade de ser reinfetados com a Ómicron do que com as outras variantes.

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Se testar positivo duas vezes no espaço de semanas é uma reinfeção?

Até agora, a autoridade de saúde britânica (UKHSA, Health Security Agency) só tem considerado tratar-se de uma reinfeção quando passaram 90 dias ou mais desde a última infeção confirmada, mesmo que tenham existido testes negativos pelo meio. Isto porque, dependendo das pessoas, o organismo pode demorar mais tempo a livrar-se de todo o vírus que tem presente no corpo e por isso num curto espaço de tempo é considerado o mesmo contágio. Mas não quer com isso dizer que continue a ter sintomas, nem sequer que possa contagiar outras pessoas.

Em Itália, o Instituto Superior de Saúde também só considera que se trata de uma nova infeção se já passaram 90 dias ou se, em menos de 90 dias, for infetado com um vírus diferente (outra variante ou a mesma variante, mas não relacionada com a primeira infeção) — mas para isso é preciso ser feita a sequência genética do vírus em ambas as situações. Em Portugal isso não acontece.

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Se fui reinfetado com a Ómicron, posso voltar a ser reinfetado?

O risco de ser reinfetado com Ómicron depois de ter estado infetado com a variante Delta é muito maior do que ser infetado duas vezes com a mesma variante. Isto porque, se o organismo conseguir criar uma boa resposta imunitária contra um vírus, a resposta será eficaz se o mesmo vírus (ou com muito poucas alterações) voltar a atacar o organismo.

A exceção, neste caso, serão as pessoas com o sistema imunitário comprometido, quer por alguma doença (como doentes com HIV) ou quem esteja a fazer determinada medicação que diminui a atividade do sistema imunitário (como quimioterapia).

Posso ser reinfetado com Ómicron depois de uma infeção anterior com outra variante?

O Gabinete Nacional de Estatística britânico (ONS) concluiu que há 16 vezes mais risco de infeção durante o período dominado pela Ómicron do que durante o período dominado pela Delta.

O Imperial College de Londres, por sua vez, concluiu que, quando comparada com a variante Delta, a Ómicron apresenta um risco de reinfeção 5,4 vezes maior.

Este grupo de investigadores verificou também que a proteção das vacinas ao fim de seis meses da segunda dose caiu de 85% antes da Ómicron, para cerca de 19% com esta nova variante.

Em relação à proteção conferida por uma infeção anterior, um estudo no Qatar, mostrou que é 90% eficaz contra reinfeção sintomática com Alpha, Beta ou Delta. Contra a Ómicron cai, mas está ainda situada nos 60%. Já a proteção contra hospitalização e morte é alta em qualquer uma das variante.

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Quantos reinfetados existem em Portugal ou noutros países?

Fazer contas aos reinfetados é difícil tanto em Portugal como em outros países com melhores sistemas de vigilância e sequenciação genética (como o Reino Unido). Podem existir casos suspeitos de reinfeção, mas a confirmação só é possível se der para comparar a sequência genética do vírus da primeira infeção e das infeções subsequentes — o que só em casos raros acontece. Além disso, muitas pessoas podem ter sido infetadas (ou reinfetadas) sem saberem e sem terem feito testes, o que faz com que o número de reinfeções possa estar subvalorizado.

Ainda assim, Neil Ferguson, epidemiologista no Imperial College de Londres, estima que na primeira semana de janeiro, 10 a 15% dos casos de Ómicron no Reino Unido fossem, de facto, reinfeções em pessoas que já tinham estado infetadas com outras variantes, conforme reportou na altura o Financial Times.

Usar uma estimativa deste tipo em Portugal significaria que, só na última semana (de 17 a 23 de janeiro), poderia ter havido entre 30 a 45 mil reinfeções. O Observador questionou a Direção-Geral da Saúde e o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge sobre o número de reinfetados em Portugal, mas não obteve respostas.

Quem tem o maior risco de ser reinfetado?

Quem não foi vacinado ou não tem a vacinação completa e os profissionais de saúde — ainda que por motivos diferentes — são os que têm maior probabilidade de reinfeção. Os profissionais de saúde, mesmo vacinados, são expostos ao vírus com uma frequência muito maior do que qualquer outro grupo profissional.

Em Itália, entre meados de dezembro e meados de janeiro, terá havido 21 mil casos de reinfeção entre não vacinados, 2.800 entre pessoas com, pelo menos, uma dose da vacina no momento do primeiro diagnóstico e 65 mil entre os que receberam uma dose da vacina depois de terem sido infetados, segundo os dados do Instituto Superior de Saúde, citados pelo jornal El Mundo.

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Os não vacinados tinham cerca de duas vezes mais probabilidade de serem reinfetados do que as pessoas que tinham duas doses da vacina há mais de 14 dias e menos de 89, segundo o ONS. Por outro lado, as pessoas que tomaram a segunda dose da vacina há mais de 90 dias também têm maior probabilidade de ser reinfetadas do que aqueles que tomaram a vacina há 14 a 89 dias.

Kingston Mills, professor de Imunologia Experimental no Trinity College de Dublin, disse ao Financial Times que a reinfeção é mais provável entre as crianças (dos quatro aos 11 anos) que, na maior parte dos países, não foram vacinadas ou não têm vacinação completa, seguidos dos adolescentes, que ainda não têm as doses de reforço.

Tendo em conta que quanto mais forte for a resposta dos anticorpos neutralizantes, menor a probabilidade de se ser reinfetado, as conclusões de um estudo recém publicado na Science Immunology são relevantes: a vacinação antes ou depois da infeção com SARS-CoV-2 ajuda a produzir mais anticorpos do que apenas a vacinação (pelo menos, contra a variante Delta). Ou seja, vacina mais infeção é igual a uma maior proteção.

Os casos de reinfeção são mais ou menos graves?

Apesar do elevado nível de contágios atribuídos à variante Ómicron, a intensidade dos sintomas descritos tem sido mais leve, há menos pessoas internadas ou nos cuidados intensivos por causa da doença e também se registam menos mortes com Covid-19. No entanto, é difícil separar o que se deve de facto às mutações da variante e o que é motivado pela imunidade apresentada pelas pessoas (quer estejam vacinadas ou tenham sido infetadas antes).

Ainda que a variante Ómicron pareça ser hábil a escapar-se à primeira linha de defesa — os anticorpos que estão “formatados” para combater outras variantes —, a resposta celular, nomeadamente, com as células T, continua a estar presente e a combater a infeção tanto pela variante Delta como pela Ómicron.

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A gravidade da reinfeção, no entanto, depende se se trata de uma pessoa imunocompetente (com uma resposta normal do sistema imunitário) ou imunodeprimida e qual o estado vacinal do doente. A diferença nos sintomas também pode estar relacionada com as variantes que estiveram envolvidas na infeção e reinfeção: quando a Alpha se tornou dominante, as reinfeções tinham menos sintomas, mas voltaram a verificar-se mais sintomas com as reinfeções com Delta. Uma reinfeção com Ómicron pode provocar sintomas idênticos aos da primeira infeção, segundo o Gabinete Nacional de Estatística britânico (ONS).

Os investigadores do Imperial College de Londres, no entanto, apresentam outros resultados: quando comparada com a variante Delta, a Ómicron têm maior risco de provocar sintomas nas pessoas que tomaram a segunda dose ou a dose de reforço há duas ou mais semanas, segundo comunicado da instituição.

Posso ser reinfetado mais do que uma vez?

Essa probabilidade cresce com o tempo de convivência do vírus à medida que a imunidade diminui e novas variantes surgem — tal como somos reinfetados com os coronavírus que causam constipações várias vezes ao longo das nossas vidas. Há alguns relatos de pessoas que foram infetadas três e quatro vezes, mas mais uma vez torna-se difícil confirmar se se trata de uma reinfeção e quantas já aconteceram na mesma pessoa. A UKHSA, por exemplo, não faz distinção entre quem foi infetado duas ou mais vezes, refere o The Guardian.

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Que sintomas podem ser associados a uma infeção com Ómicron?

Quando comparada com a variante Delta ou com outras variantes anteriores, a Ómicron parece apresentar menos sintomas ou, na altura em que foram reportados os casos, ainda era cedo para os sintomas se terem desenvolvido completamente, refere o ONS, com dados de dezembro. De qualquer forma, a perda de olfato e paladar características nas primeiras variantes são muito menos frequentes agora. Tosse será o sintoma mais frequente nos dados recolhidos no Reino Unido, mas também dores de cabeça e de garganta, e fadiga ou fraqueza.