A chamada “agenda do trabalho digno”, que inclui alterações ao Código do Trabalho — e que caiu com o chumbo do Orçamento do Estado para 2022 —, vai voltar a ser discutida na concertação social. A informação foi dada pelo primeiro-ministro na reunião de segunda-feira com a UGT para a preparação da próxima legislatura.

A central sindical avisa, porém, que não está disponível para começar uma discussão do zero, como já chegou a ser defendido por confederações patronais, como a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP). “O senhor primeiro-ministro deu-nos a notícia de que, não obstante já haver uma proposta de lei sobre a agenda do trabalho digno, o Governo iria levá-la novamente à concertação social“, indicou Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, em declarações ao Observador.

O mais longe que a agenda do trabalho digno chegou foi à fase de discussão pública, não tendo sido aprovada a tempo da dissolução no Parlamento, após o chumbo do Orçamento do Estado. Para que entre em vigor, tem de voltar a ser aprovada em Conselho de Ministros e no Parlamento. A dúvida era se o Governo voltaria a discutir o pacote de alterações à lei laboral com sindicatos e patrões — eventualmente para tentar chegar ao acordo que não obteve da última vez.

Segundo informação prestada à UGT (o Observador tentou contactar também a CIP, a CCP e a CGTP, mas ainda não obteve resposta), é mesmo intenção do Governo discutir o tema. Mas mostrou António Costa abertura em fazer alterações? “Aí não lhe posso dizer qual a abertura do Governo para isso. Sei que o Governo apenas disse que a agenda iria ser discutida em sede de concertação. O que virá, logo veremos”, refere Sérgio Monte.

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A intenção é vista com bons olhos pela UGT, até porque, considera, “a agenda não terá sido discutida tão profundamente quanto poderia ou deveria ter sido“. Aliás, foi esse documento que levou à rutura temporária das confederações patronais com a concertação social.

A agenda incluía medidas como o combate ao recurso abusivo ao trabalho temporário, o reforço do combate ao falso trabalho independente ou o reforço dos direitos dos trabalhadores das plataformas digitais. Mas, à última hora, antes da apresentação do OE para 2022, o Governo acrescentou duas medidas que não foram apresentadas à concertação social — e que quis usar como forma de levar os partidos à sua esquerda a aprovar o Orçamento. Foram elas o aumento das compensações por cessação dos contratos a termo ou termo incerto e a reposição do pagamento das horas extraordinárias nos mesmos contratos. Os patrões acabariam por bater com a porta por não concordarem com as medidas, acabando por regressar mais tarde.

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Em declarações recentes, têm defendido alterações à agenda ou mesmo que a sua discussão comece do zero. Mas a UGT avisa que já há trabalho feito que “não se pode deitar fora”. “Por parte da UGT não iremos discutir a agenda desde o início. Já demos contributos, já participámos na discussão”, diz Sérgio Monte. “Achamos que podemos ainda discutir alguma coisa, mas com uma condição: há trabalho feito e não iremos participar numa discussão que comece do início”, frisa.

Sérgio Monte recusa avançar com linhas vermelhas para a UGT, dado que “o processo negocial é uma cedência de parte a parte: pode haver coisas que caiam em função de outras conquistas”. Mas não deverá deixar cair o aumento do pagamento do trabalho suplementar, nem das indemnizações por despedimento, e bater-se-á para outra medida, não incluída na Agenda — a reposição dos 25 dias de férias.

No programa eleitoral, o PS já se comprometia a “prosseguir a implementação de uma Agenda do Trabalho Digno, o que implica, desde já, assegurar a aprovação da proposta de lei cuja discussão em sede parlamentar foi impedida pela não aprovação do Orçamento do Estado para 2022”.

Na reunião de segunda-feira, o Governo mostrou ainda intenção, como noticiou o Público esta terça-feira, de fechar até julho o chamado “acordo de médio prazo para a melhoria dos rendimentos dos trabalhadores e da competitividade das empresas”. Porém, essa meta, defende Sérgio Monte, vai depender da “evolução das negociações das propostas dos parceiros”. A discussão tinha começado em 2019, tendo sido adiada por causa da pandemia.

Quanto ao salário mínimo, que é discutido na concertação social, o primeiro-ministro manteve, na conversa com a UGT, o objetivo de chegar, pelo menos, aos 900 euros em 2026 (a proposta da UGT é de 1.000 euros em 2028).

Formação e saúde no trabalho. A agenda do PS para a concertação social

No programa do PS para as legislativas, o partido mostra vários planos para a concertação social. Além da agenda do trabalho digno, quer discutir e apresentar naquela sede “uma estratégia nacional de segurança e saúde no trabalho, no seguimento do quadro estratégico europeu aprovado em 2021”.

Em cima da mesa estará também a discussão de “estímulos à participação de empresas e trabalhadores em associações, combatendo a baixa taxa de associativismo entre empregadores e entre trabalhadores”. E a implementação “na sua plenitude” do “acordo de concertação social relativo à formação profissional e à sua relação com o mercado de trabalho”, com vista à melhoria das qualificações. Este é um ponto essencial para a UGT — e Sérgio Monte diz que António Costa assegurou que a implementação acontecerá “brevemente”.

O programa do PS pretende ainda estudar a aplicação de “experiências” como a semana de quatro dias, que está a ganhar adeptos (a Bélgica, por exemplo, aprovou esta terça-feira a possibilidade de organizar a semana de trabalho nesses moldes, sem se trabalhar menos horas semanalmente). O PS prometeu “promover um amplo debate nacional e na concertação social sobre novas formas de gestão e equilíbrio dos tempos de trabalho, incluindo a ponderação de aplicabilidade de experiências como a semana de quatro dias em diferentes setores e o uso de modelos híbridos de trabalho presencial e teletrabalho, com base na negociação coletiva”.