O discurso do Presidente ucraniano no parlamento da Grécia esta quinta-feira está a motivar grande controvérsia política no país, com vários responsáveis políticos gregos — incluindo o ex-ministro das Finanças Yanis Varoufakis, o líder do Syriza, Alexis Tsipras, e até um porta-voz oficial do governo grego — a acusarem Volodymyr Zelensky de dar palco a um neonazi membro do Batalhão Azov durante a sua intervenção por videoconferência aos deputados reunidos em Atenas.
Volodymyr Zelensky discursou durante cerca de 15 minutos no parlamento grego, reiterando os seus apelos ao Ocidente para que apoiem a Ucrânia na resistência contra a Rússia e intensifiquem as sanções contra Moscovo. Mas a polémica eclodiu ao fim de cerca de sete minutos de discurso, quando Volodymyr Zelensky apresentou um vídeo com uma mensagem pré-gravada de um combatente ucraniano com origens gregas.
O problema? O combatente em questão pertence ao Batalhão Azov, que esses responsáveis políticos consideram ser uma milícia paramilitar neonazi — fundada em 2014 por voluntários de extrema-direita que combatiam as forças russas na região de Donbass e, mais tarde, formalmente integrada nas forças armadas ucranianas. O Batalhão Azov está sediado na cidade de Mariupol, no sul da Ucrânia, onde existe também uma grande comunidade de origem grega, com mais de 100 mil cidadãos.
Embora tenha feito o discurso todo em ucraniano, e não em grego, o combatente começou a sua intervenção afirmando: “Estou a dirigir-me a vós como grego. O meu nome é Michael, o meu avô combateu na guerra contra os nazis, eu nasci em Mariupol e estou a participar na defesa da cidade.” Embora tenha tido um papel relevante na defesa de Mariupol do cerco russo, o Batalhão Azov está a ser acusado pelos russos de ter lançado o terror sobre parte dos cidadãos ucranianos da cidade, ameaçando de morte aqueles que procuravam fugir de Mariupol em vez de ficarem a combater.
https://youtu.be/mnFakvPtwRY
A exibição deste testemunho causou desagrado e desconforto na esfera política grega, com o economista Yanis Varoufakis — que foi ministro das Finanças da Grécia em 2015 — a ser uma das vozes mais críticas de Zelensky. “O Presidente Zelensky acaba de abusar do convite do parlamento grego ao partilhar a sua plataforma com membros do Batalhão neonazi Azov, minando assim a heroica resistência do povo ucraniano à invasão criminosa de Putin. Estamos do lado da Ucrânia, não do Batalhão neonazi Azov”, escreveu Varoufakis no Twitter.
President Zelenski just abused the Greek Parliament's invitation by sharing its platform with members of the neoNazi Azov Battalion, thus undermining the Ukrainian people's heroic resistance to Putin's criminal invasion. We stand with Ukraine, not with the Azov neoNazi Battalion
— Yanis Varoufakis (@yanisvaroufakis) April 7, 2022
Confrontado, na mesma rede social, com comentários referentes à existência de partidos de extrema-direita no parlamento grego, Yanis Varoufakis reconheceu essa realidade, mas assinalou que “Zelensky escolheu aparecer ao lado de um neonazi durante o seu discurso”, motivo pelo qual o Presidente ucraniano deve ser duplamente condenado: por “normalizar o nazismo” e por “apoiar a alegação de Putin de que a resistência ucraniana é igual a nazismo“.
“O nosso parlamento não convidou um nazi”, acrescentou ainda Varoufakis. “Convidou o Presidente da Ucrânia. E foi o Presidente da Ucrânia que trouxe o nazi com ele. E, sim, o presidente do nosso parlamento falhou na defesa do parlamento ao não intervir.” O atual líder do partido Frente da Desobediência Realista Europeia recusou ainda que a sua opinião represente um apoio a Putin: “Nada justifica a brutalidade de Putin. É a triste escolha de Zelensky de se erguer a um membro do Batalhão nazi Azov que faz as vontades a Putin.”
Alexis Tsipras, líder do Syriza e ex-primeiro-ministro grego (de 2015 a 2019) também se insurgiu contra o discurso do combatente. “O discurso de membros do Batalhão neonazi Azov no parlamento grego é um desafio”, afirmou Tsipras. “Ele falou de um dia histórico, mas é uma vergonha histórica. Damos a solidariedade ao povo ucraniano, mas os nazis não podem ter um lugar no parlamento.”
A indignação com a intervenção de um membro do Batalhão Azov estendeu-se também ao governo grego. “O Presidente Zelensky, no seu discurso ao parlamento grego, descreveu o sofrimento causado ao povo ucraniano pela invasão russa e focou-se na resistência heroica do seu povo. A inclusão, no discurso, de uma mensagem de um membro do Batalhão Azov foi incorreta e inapropriada“, afirmou Giannis Oikonomou, porta-voz do governo grego, numa mensagem publicada no Facebook. Oikonomou lamentou, porém, que “uma secção da oposição, liderada pelo senhor Tsipras”, esteja a aproveitar o episódio para “mais uma vez justificar a invasão russa“.