As forças ucranianas têm conseguido resistir ao avanços russos no campo de batalha desde o início da guerra, em 24 de fevereiro. No mar, a situação é diferente e Moscovo conseguiu bloquear portos ucranianos e impedir a exportação de mais de 20 milhões de toneladas de grãos, como trigo, milho, cevada, e de óleo de girassol.
As exportações de Kiev caíram 64% desde fevereiro até este mês de maio, em comparação com o mesmo período do ano passado, disse o Ministério da Agricultura ucraniano, de acordo com a Forbes. O porto de Odessa, que é o principal e o maior da Ucrânia, não está ativo desde que começou o conflito. Os portos do Mar de Azov de Mariupol, Berdiansk e Skadovsk e o porto de Kherson no Mar Negro estão controlados pela Rússia e foram oficialmente fechados pela Ucrânia em 2 de maio.
A Rússia não permite que navios entrem ou saiam. Está a controlar o Mar Negro”, denunciou Zelensky nesse dia.
O bloqueio dos portos da Ucrânia pode desencadear uma crise global de segurança alimentar e levar milhares a morreram de fome, uma vez que Kiev é um dos maiores exportadores de grão, segundo já foi denunciado. O bloqueio não é fácil de terminar, mas, mesmo que chegasse ao fim este domingo, os especialistas preveem que a crise pode seguir-se nos próximos meses e pode ter consequências devastadoras para os países mais pobres, escreve o think tank Atlantic Council.
Ucrânia acusa Rússia de roubar cereais
As autoridades ucranianas garantem que a Rússia está a roubar grãos e a transportá-los para a Crimeia, onde são carregados em navios russos das regiões de Kherson e Zaporíjia e levados para mercados internacionais, como para a Síria.
O bloqueio dos portos ucranianos deixou cerca de 22 milhões de toneladas de grãos retidos na Ucrânia, disse este sábado Volodymy Zelensky, segundo o jornal Kyiv Independent. “A comunidade mundial deve ajudar a Ucrânia a desbloquear os portos marítimos, caso contrário a crise energética será seguida por uma crise alimentar”, reforçou o Presidente da Ucrânia.
Um dia depois das declarações de Zelensky, a Rússia veio dizer que espera safras recordes de trigo e que poderá oferecer a exportação de 25 milhões de toneladas de grãos a partir do dia 1 de agosto e até ao final deste ano.
????????envoy to @UN #Nebenzia: This year #Russia expects record crops of wheat. In this regard, starting from 1 August and until the end of the year, we can offer to export 25 mln tons of #grain through the Novorossiysk port. pic.twitter.com/ReNCJwPGbk
— Russian Embassy, UK (@RussianEmbassy) May 22, 2022
Qual é a solução para terminar com o bloqueio?
A criação de uma zona marítima protegida por parte da comunidade internacional pode ser a única solução viável, refere o think tank Atlantic Council. A forma como este objetivo pode ser alcançado tem sido debatida por especialistas que acreditam que seria necessário um corredor de navegação patrulhado por navios e aviões da NATO para garantir a segurança dos portos e da navegação comercial.
Mesmo assim, e apesar de a segurança alimentar mundial estar em risco, chegar a um consenso dentro da NATO poderá não ser simples. À ideia de uma possível criação de uma zona marítima protegida pode acontecer o mesmo que à de uma no-fly zone — com o fecho do espaço aéreo ucraniano — que foi rejeitada.
Acredita-se então que à medida que a guerra avança e o medo da escassez mundial de alimentos também cresce, o corredor para os navios saírem do Mar Negro poderá ser a melhor opção. Mesmo assim, seria necessário que a Rússia colaborasse.
O que diz a Rússia sobre uma possível reabertura dos portos?
O Kremlin tinha acusado a Ucrânia de estar a reter os navios com cereais e negou as acusações de que seria responsável pelo bloqueio. Porém, a Rússia acabou por se contradizer ao afirmar que para abrir o acesso aos portos ucranianos do Mar Negro, para que os grãos possam ser exportados, será necessária uma revisão das sanções do Ocidente contra a Rússia.
Desde que Moscovo enviou as suas tropas para a Ucrânia, Kiev foi obrigada a fazer exportações apenas por via terrestre, através das ligações ferroviárias e rodoviário a oeste do país ou através de pequenos portos no rio Danúbio, noticia a agência Reuters. Mesmo assim, só é possível exportar um milhão de toneladas de cereais por mês, número que contrasta com os cinco milhões que, antes, eram exportados mensalmente.
E se existisse um acordo?
António Guterres já alertou que a fome global atinge “milhões de pessoas” e está prestes a atingir um “novo recorde”. O secretário-geral da ONU refere que muitos indivíduos caíram “na insegurança alimentar, seguida de desnutrição, fome em massa”, numa crise que “pode durar anos”.
Por isso, é necessário que exista um acordo para reabrir os portos. O jornal Moscow Times explicou que é preciso proteger os navios das minas que foram colocadas tanto por forças russas como por forças ucranianas. Um processo difícil e demorado. O porta-voz da Marinha francesa, Eric Lavault, disse que desminar os locais poderá demorar dias ou até mesmo semanas. “É como construir uma estrada para que os barcos possam passar uns pelos outros”, explicou garantido que será preciso “limpar tudo”.
Para essa limpeza seria também necessário apoio aéreo e naval, mas permanece incerto se a Ucrânia aceitaria remover as minas de Odessa e de outros portos, mesmo que as forças russas concordassem em retirar as suas.
Tal como o preço da energia, também o preço do cereais já começou a subir como consequência do bloqueio. Com a perspetiva de que a fome mundial se poderá espalhar a ainda mais cidadãos, principalmente dos países mais pobres, os líderes mundiais — principalmente Zelensky — alertam para a necessidade de terminar com o bloqueio.