Nos últimos dois dias, Estados Unidos, Alemanha e Eslováquia anunciaram que vão enviar mais armas para a Ucrânia para que o exército do país possa defender-se da invasão e da tentativa de domínio russo.
As armas mais importantes são os Himars, mísseis enviados pelos EUA que, pelo poder de alcance, podem ter um impacto significativo na evolução da guerra. Mas o envio de armas pela Alemanha é igualmente significativo, mais até por um motivo simbólico: sugere um reforço substancial do apoio germânico às forças ucranianas, que alguns analistas vinham considerando até aqui excessivamente tímido.
Da Alemanha, armamento para “proteger uma grande cidade inteira de ataques aéreos”
Ainda é apenas uma promessa, mas é a primeira garantia de envio de armamento pesado da Alemanha para a Ucrânia. Esta quarta-feira, o chanceler do país, Olaf Scholz, anunciou que vão ser enviados brevemente não apenas “sistemas de radares” como novos mísseis de defesa anti-aérea, noticia a Euronews.
Scholz discursou no Bundestag, o Parlamento alemão, e prometeu que o país irá mesmo entregar estes meios de interceção aérea — particularmente importantes dado que as forças russas têm utilizado os ataques aéreos com grande regularidade para atingir alvos ucranianos. Estes serão aliás os sistemas de defesa aérea mais modernos de que a Alemanha dispõe, segundo o seu chanceler.
De acordo com a estação alemã Deutsche Welle, Scholz afirmou que com a ajuda de estes sistemas a Ucrânia conseguirá “proteger uma grande cidade inteira de ataques aéreos russos”. E acrescentou que os “radares” que serão enviados permitirão detetar “howitzers” [obus, um tipo de boca de fogo de artilharia], “morteiros” e um tipo de artilharia que utiliza rockets como projéteis. O objetivo é localizar ofensivas aéreas russas antes de estas atingirem os alvos, de modo a intercetar os ataques.
O chanceler alemão indicou ainda que Berlim vai enviar vários sistemas de lançamento de rockets de forma coordenada com os Estados Unidos da América. Olaf Scholz não deu mais pormenores, mas o portal de notícias alemão dpa avançou, segundo o Deutsche Welle, que a intenção passa por enviar quatro destes sistemas para a Ucrânia, cabendo depois aos EUA assegurar o treino a soldados ucranianos para operarem os mesmos.
O país tem vindo a ser criticado por alguns analistas militares internacionais pelo apoio militar mais tímido à Ucrânia, por comparação com, por exemplo, potências como os EUA e o Reino Unido. A agência de notícias Associated Press refere mesmo que este será o primeiro lote de armas de defesa aérea de longo alcance enviadas para a Ucrânia a partir da Alemanha, desde o início da guerra. Até aqui foram cedidas sobretudo munições, além de algum armamento mais ligeiro.
Oito veículos militares “Zuzana 2”, made in Eslováquia, também a caminho
Também a Eslováquia anunciou que irá enviar mais armas para território ucraniano. Esta quinta-feira, o ministério da Defesa do país anunciou que serão entregues oito “Howitzers Zuzana 2” para a Ucrânia, relata a BBC.
Trata-se de oito veículos capazes de atirar obuses, isto é, peças de artilharia destinadas a lançar projéteis com trajetórias muito curvas.
Este veículo de artilharia, que é mesmo eslovaco na sua produção, tem um longo alcance e uma alta precisão. É capaz de disparar munições de 155m — de que os Estados-membros da NATO dispõem —, andar a uma velocidade de até 80 quilómetros por hora e atingir alvos a até entre 40 e 50 quilómetros de distância (dependendo do tipo de munição utilizada).
Os 700 milhões de dólares em armamento enviados pelos EUA
Se o anúncio da Alemanha pode contribuir para uma defesa mais eficaz do espaço aéreo ucraniano, e tem também importância simbólica por indiciar uma nova estratégia de apoio militar germânico ao país presidido por Volodymyr Zelensky, é o armamento que será enviado pelos EUA que pode ter mais impacto na evolução da guerra.
O novo pacote de apoio norte-americano à Ucrânia — o 11.º desde o início da invasão russa — está avaliado em 700 milhões de dólares, aproximadamente 655 milhões de euros à taxa de câmbio atual. E é particularmente extenso, incluindo:
Dois radares de vigilância aérea
Seis mil armas de combate anti-tanques
15 mil carregamentos de munições de artilharia de 155mm
quatro helicópteros Mi-17 (por sinal, desenvolvidos na União Soviética e usados pela Rússia)
15 “veículos táticos” (isto é, blindados contra explosivos e projéteis)
Equipamentos e peças de reserva (substituição)
Mil Javelins (sistemas de mísseis anti-tanques) e 50 sistemas CLUs, que facilitam a identificação dos alvos para quem opera os Javelins
Cinco sistemas de radar COBRA, que a partir da localização da trajetória de projéteis inimigos (por exemplo, rockets) conseguem localizar no terreno o sistema e equipamento de lançamento
Quatro HIMARS e munições
A reação do Kremlin com uma ameaça: EUA podem estar a arrastar “3º país” para a guerra
Num texto publicado no jornal The New York Times em que justifica o envio de armamento para a Ucrânia, o Presidente dos EUA, Joe Biden, explicava ter decidido enviar para a Ucrânia “sistemas de mísseis mais avançados e munições que lhes permitirão atingir alvos estratégicos no campo de batalha”.
Biden, porém, fez questão de fazer uma ressalva: “Não estamos a encorajar ou a permitir à Ucrânia fazer ataques para lá das suas fronteiras. Não queremos prolongar a guerra simplesmente para infligir dor à Rússia”.
Em troca do envio de armamento, a Casa Branca exigiu ao Presidente ucraniano Volodomyr Zelensky que garantisse que estas armas não serão utilizadas para atingir alvos em território russo, adiantaram responsáveis norte-americanos. Zelensky confirmou que não o fará em entrevista ao meio norte-americano Newsmax: “Não estamos interessados no que está a acontecer na Rússia. Só estamos interessados no nosso próprio território, na Ucrânia”.
Já no jornal britânico de The Guardian escreve-se que das várias vezes que as forças ucranianas atacaram territórios russos (próximos da fronteira com a Ucrânia, como as regiões de Kursk e Belgorod), em alguns dos casos para atingir alvos estratégicos de armazenamento de combustível, armas e munições, fizeram-no com os seus próprios rockets, drones e helicópteros.
Apesar de tudo isto, a reação russa ao envio de mais armamento para a Ucrânia foi, como expectável, particularmente crítica. O porta-voz do Kremlin Dmitry Peskov acusou os EUA de estarem a “juntar propositadamente lenha à fogueira” e defendeu que estes pacotes de ajuda militar “não contribuem para a vontade da liderança ucraniana de voltar às negociações de paz”. As declarações são citadas pela BBC.
A Ucrânia e a Rússia chegaram a encetar negociações com o intuito de encontrarem uma solução de paz mas a soberania ucraniana e sobretudo a integridade territorial do país — que a Rússia contesta, apoiando repúblicas separatistas pró-russas no leste da Ucrânia — inviabilizaram o acordo e fizeram com que as negociações fossem interrompidas.
Agora, Lavrov alerta que o envio de armamento dos EUA pode arrastar “um terceiro país” para a guerra, segundo a BBC: “Para termos confiança [nas promessas de que estas armas não serão usadas para atacar território russo], precisávamos de ter histórico de Kiev cumprir as suas promessas — o que não existe”, acrescentou.
Nota – Artigo atualizado às 11h de 03/06/2022 com correção relativamente ao material militar que será enviado pela Eslováquia para a Ucrânia