As autoridades chinesas intensificaram o “assédio” e a “perseguição” de ativistas, por lembrarem o massacre de Tiananmen, de 4 de junho de 1989, disse esta sexta-feira a organização de defesa dos Direitos Humanos Human Rights Watch.

A HRW afirmou que o governo chinês “deve reconhecer” e “assumir” a responsabilidade pela sangrenta repressão do movimento pró-democracia de Tiananmen.

Num relatório publicado nas vésperas do 33.º aniversário desde o massacre, a HRW disse ainda que as autoridades chinesas devem permitir as comemorações na China continental e nas regiões semiautónomas de Macau e Hong Kong, e deixar de censurar as discussões sobre a repressão.

Ativistas de Hong Kong estão a ser presos por comemorarem o aniversário do massacre de Tiananmen”, lembrou Yaqiu Wang, observadora para a China da Human Rights Watch.

Vinte e seis ativistas pró-democracia — incluindo Joshua Wong, o empresário Jimmy Lai ou a jornalista Gwyneth Ho — foram presos por participar ou “incitar” outros a participar da vigília em homenagem às vítimas. Receberam penas suspensas ou penas de prisão entre quatro e 14 meses.

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Magnata de Hong Kong Jimmy Lai condenado por participar em vigília de Tiananmen

Na cidade chinesa de Hong Kong, que goza de um estatuto semiautónomo, todos os anos se realizava uma vigília para lembrar o massacre, até que, há dois anos, Pequim impôs uma lei de segurança nacional no território que passou a punir a dissidência.

No continente chinês, “à semelhança de anos anteriores, as autoridades restringiram o movimento e a comunicação de membros das Mães de Tiananmen”, explicou a HRW.

“Muitos ativistas, como Hu Jia, Gao Yu e Zhang Lifan, You Weijie e Zhang Xianling, cujo marido e filho foram mortos na repressão, respetivamente, disseram que as autoridades bloquearam chamadas internacionais para os seus telemóveis”, lê-se no relatório.

A polícia de Hong Kong advertiu já que qualquer reunião em 4 de junho, para lembrar o massacre de Tiananmen, seria considerada ilegal. O superintendente  Liauw Ka-kei, questionado pelo The Guardian se os residentes da cidade poderiam usar roupa preta, levar flores ou velas e aparecer perto do Parque Victoria, explicou que “se uma pessoa nos fizer sentir que o seu propósito para aparecer é incitar outros [a fazê-lo], claro que iramos procurar por provas“.

Quando há outras pessoas lá [no parque de Hong Kong], e partilham todos o mesmo objetivo de expressar alguma reivindicação, já é o suficiente para tornar uma pessoa membro de uma assembleia ilegal.”

Desde 2020, várias foram as medidas adotadas pelas autoridades chinesas para eliminar as homenagens às vítimas do Massacre de Tiananmen. Vários ativistas foram detidos, e a Aliança de Hong Kong, o maior grupo de apoio às vítimas do massacre, foi julgada como um “agente estrangeiro” por “incitarem à subversão.

Homenagem às vítimas de Tiananmen passa das ruas de Macau para a segurança de casa

Em Macau, a PSP citou, no ano passado, pela primeira vez, razões políticas para interditar a comemoração, alegando risco de violações do Código Penal, nomeadamente dos artigos sobre a “ofensa a pessoa coletiva que exerça autoridade pública” e o “incitamento à alteração violenta do sistema estabelecido”. Uma decisão validada posteriormente pelo Tribunal de Última Instância (TUI), quando apresentado recurso da decisão das autoridades.

Em 2020, as autoridades citaram preocupações com a Covid-19 como motivo para proibir a vigília.

“A proibição da vigília à luz das velas em Hong Kong é bastante indicativa do histórico de Direitos Humanos do Governo chinês: 33 anos após o Massacre de Tiananmen, apenas aprofundaram a repressão”, disse a HRW.

Como parte de vários tratados internacionais sobre Direitos Humanos e membro do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o governo chinês deve “respeitar os direitos à liberdade de expressão, associação e reunião pacífica” e “investigar e processar adequadamente todos os funcionários do governo e militares que planearam ou ordenaram o uso ilegal de força letal contra manifestantes pacíficos”, apelou a organização.

A derrota do último bastião da democracia em Pequim

Iniciado por estudantes da Universidade de Pequim, o movimento pró-democracia alastrou-se a toda a sociedade chinesa e, em meados de maio, o Governo decretou a lei marcial em Pequim.

O movimento foi esmagado na noite de 3 para 4 de junho de 1989, quando os tanques do exército foram enviados para pôr fim a sete semanas de protestos.

O número exato de pessoas mortas continua a ser segredo de Estado, mas as “Mães de Tiananmen”, associação não-governamental constituída por mulheres que perderam os filhos naquela altura, já identificaram mais de 200.