O Conselho Europeu decidiu, esta quinta-feira, atribuir o estatuto de país candidato à Ucrânia e à Moldávia, uma decisão apelidada por vários líderes europeus como “histórica”, uma mensagem de “união” numa altura em que a guerra se prolonga em território ucraniano.
Volodymyr Zelensky, o Presidente da Ucrânia, agradeceu a atribuição do estatuto de candidato, defendendo que o “futuro da Ucrânia é dentro da União Europeia“. “É um momento único e histórico para a relação entre a Ucrânia e a União Europeia”, acrescentou, no Twitter.
Sincerely commend EU leaders’ decision at #EUCO to grant ???????? a candidate status. It’s a unique and historical moment in ????????-???????? relations. Grateful to @CharlesMichel, @vonderleyen and EU leaders for support. Ukraine’s future is within the EU. #EmbraceUkraine https://t.co/o6dJVmTQrn
— Volodymyr Zelenskyy / Володимир Зеленський (@ZelenskyyUa) June 23, 2022
Também a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, se congratulou com a decisão, classificando o momento como “definidor” e “bom” para a União Europeia, até porque os dois países são “parte da família europeia”, observou aos jornalistas. No Twitter, já tinha dito que a decisão “fortalece” todos os Estados-membros da UE e a Ucrânia, a Moldávia e a Geórgia face ao “imperialismo russo“. Em relação à Geórgia, o Conselho Europeu reconheceu a “perspetiva europeia”, um passo para que o país possa, eventualmente, vir a ser candidato.
Na mesma conferência de imprensa, Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, classificou a decisão referente à Ucrânia e à Moldávia como um “momento histórico”, que envia uma “mensagem muito forte” de “união e determinação”.
Michel falou ainda sobre o processo dos países dos Balcãs Ocidentais, que há anos esperam avançar nos respetivos processos — são eles Albânia, Montenegro, Macedónia do Norte e Sérvia (são candidatos), Bósnia-Herzegovina e o Kosovo (estes dois são potenciais candidatos, mas países como a Áustria e a Eslovénia pressionaram os restantes Estados-membros a garantir o estatuto de candidato à Bósnia), cujos líderes reuniram com os homólogos em Bruxelas. E criticaram a lentidão europeia.
“Os Balcãs Ocidentais são uma prioridade para nós. Este é um momento importante porque há uma grande vontade de dar nova vida ao processo”, assegurou Charles Michel, em resposta ao descontentamento expressado pelos países daquela região.
A “desilusão” dos Balcãs Ocidentais
Foi mesmo a “desilusão” dos países dos Balcãs Ocidentais que António Costa salientou, na primeira reação aos jornalistas. O primeiro-ministro avisou que é preciso “não criar falsas expectativas“, “não gerar frustrações que serão um amargo futuro na relação” entre esses países e a União Europeia. “Esta desilusão sinaliza que a atribuição deste estatuto de candidato à Ucrânia e à Moldávia constitui uma enorme responsabilidade para a UE”, disse.
Costa avisa UE que é preciso “aumentar a perna” para acompanhar novas adesões
Por isso, acrescentou que o trabalho que aí vem tem de ser “muito sério” para que não venha a realizar-se “uma reunião com a Ucrânia e a Moldávia como a que” aconteceu esta quinta-feira entre o Conselho Europeu e os países dos Balcãs Ocidentais.
A frustração dos Balcãs ocidentais tem toda a razão. Quando um país que há 20 anos pediu e ainda não cumpre os critérios de adesão, a falha não é só desse país mas é também um fracasso das instituições europeias que não foram capazes de se organizar no apoio a esse país para preencher esses critérios”, defendeu António Costa.
Os próprios líderes dos países dos Balcãs Ocidentais assumiram essa “frustração” ao longo do dia. O primeiro-ministro da Albânia, Edi Rama, mostrou-se no Twitter insatisfeito por a reunião não ter avançado no sentido de aproximar o país da adesão à UE. A Albânia e a Macedónia do Norte esperam há mais de dois anos que seja levantado o veto pela Bulgária, de forma a iniciar as negociações. “(…) Imaginem só como tudo seria ainda mais simpático se às promessas se seguissem ações simpáticas”, escreveu.
Nice place nice people nice words nice pictures and just imagine how much nicer could be if nice promises were followed by nice delivery… But we Albanians are not as nice as to give up nicely! So we will keep going and working even harder to make Albania a nice EU member???????????? pic.twitter.com/j057Ywf2tY
— Edi Rama (@ediramaal) June 23, 2022
Também o primeiro-ministro da Macedónia do Norte, Dimitar Kovacevski, criticou a atuação da UE. “O que está a acontecer agora é um problema grave e um duro golpe na credibilidade da União Europeia”, afirmou, lembrando que “a Macedónia do Norte é candidata há 17 anos, a Albânia há oito”. “Por isso, boas-vindas à Ucrânia e boa sorte”.
O caminho que ainda falta percorrer
A Ucrânia já passou uma de três fases do processo de adesão à UE: conseguiu o estatuto de candidato. Mas o processo para que, efetivamente, se possa vir a juntar ao bloco da união é longo. Basta olhar para a Croácia, o último país a aderir (em 2013): desde que se candidatou até efetivamente ter-se tornado membro passaram dez anos.
Isso não quer dizer que a Ucrânia demore o mesmo período. O progresso depende do próprio mérito em corresponder aos chamados “critérios de Copenhaga” — os pontos a que os países têm de obedecer para poderem fazer parte da UE, nos quais estão incluídas regras a nível do Estado de direito, consolidação democrática ou combate à corrupção, entre outras.
Um exemplo de como nem todos os processos andam da mesma forma é o da Bósnia. O país apresentou o pedido de adesão em fevereiro de 2016, mas ainda não ganhou o estatuto de candidato — é apenas “potencial candidato” — com a Comissão a estabelecer, em 2019, 14 princípios que o país tem de concretizar para avançar na adesão. Já o caso da Ucrânia foi muito mais célere: Zelensky assinou o pedido oficial de adesão a 28 de fevereiro, quatro dias depois da invasão pela Rússia. Bastaram quatro meses para uma decisão favorável.
Há mais questões a ter em conta. Um rascunho das conclusões do encontro desta quinta-feira, obtida pelo The Washington Post, indica que a entrada da Ucrânia na UE pode depender da “capacidade” do bloco de “absorver novos membros”. É que a Ucrânia seria o país mais pobre na UE e o quinto mais populoso, o que faz com que alguns países na Europa Ocidental estejam preocupados com a possibilidade de um novo alargamento poder complicar a tomada de decisão na união e desequilibrar a balança do poder, de forma a fazer pender a mesma para a Europa central e de leste.
“Hoje marca o início de um caminho longo que faremos em conjunto”, disse Josep Borrell, o chefe da diplomacia europeia. Os líderes europeus sublinharam, também, que o caminho tanto para a Ucrânia como para a Moldávia se avizinha longo e difícil. “Estou convencida de que eles (Ucrânia e Moldávia) vão avançar o mais rapidamente possível e trabalhar o mais arduamente possível para implementar as reformas necessárias”, defendeu, por sua vez, Ursula Von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia.
A Reuters também fala em preocupações dentro da UE sobre como o bloco pode manter-se “coerente” à medida que se expande. É que são 27 estados-membros, alguns com realidades económicas e sociais muito distintas, e enfrentam desafios complexos, desde as alterações climáticas ao crescimento da China.
Além da fase que atribui o estatuto de candidato, há outras duas. A segunda implica negociações formais, o que inclui já a transposição de leis europeias à lei nacional, e a implementação de reformas judiciais, administrativas, económicas, entre outras. As negociações envolvem ministros e embaixadores da UE e do país candidato.
Eventuais bloqueios podem fazer-se sentir pelo caminho. É que nenhuma negociação, em nenhuma fase, fica concluída sem que todos os governos, de todos os Estados-membros, estejam satisfeitos com o progresso do país candidato. A terceira fase é a própria adesão: assim que as negociações estiveram completas e o país cumprir os critérios, pode juntar-se à UE.