O meio empresarial costuma ser frio e impessoal, mas o respeito e a notoriedade que Oleksiy Vadatursky conquistara ao longo da vida levou a que praticamente todos os empresários ucranianos — incluindo os seus rivais — o tratassem por “avô”. Era um dos homens mais ricos da Ucrânia com uma fortuna avaliada nos 400 milhões de euros, tendo-a angariado essencialmente através do negócio da exportação de cereais.
Nascido em 1947 numa aldeia perto de Odessa, Oleksiy Vadatursky começou a sua carreira como engenheiro, ao mesmo tempo que geria uma rede de padarias estatais, num país com cicatrizes do Holodomor, a grande fome ucraniana decretada por Estaline. Foi nessa altura que percebeu as debilidades do sistema agrário soviético, que, com as quintas coletivas, não potenciava a plantação de trigo.
Após a independência, Oleksiy Vadatursky fundou a Nebulon, uma empresa agrária dedicada à plantação de trigo. Apesar as dificuldades iniciais numa altura em que a Ucrânia — enquanto Estado soberano — se reorganizava, o empresário conseguiu ter sucesso no meio, conta a Al Jazeera, sendo um dos principais contribuidores para a Ucrânia se ter transformado num dos principais exportadores de trigo.
No mundo empresarial, um dos maiores trunfos de Oleksiy Vadatursky passava pelo controlo que detinha nos portos fluviais, que já vinha desde os tempos soviéticos. Os críticos apontavam que o empresário fazia de tudo para manter o monopólio da gestão fluvial na Ucrânia — e não se inibia de estender a sua influência à esfera política. Não é de estranhar que o seu filho, Andryi Vadatursky, estivesse no Parlamento ou que, nos últimos meses, tivesse tentando manipular a seu favor o partido de centro-direita da ex-primeira-ministra ucraniana, Yulia Timoshenko.
Ainda assim, contrariamente a vários magnatas, Oleksiy Vadatursky era visto com bons olhos pela maioria dos ucranianos. “Ele trabalhou. Ele não explorou a herança industrial soviética. Ele construiu o seu império no campo”, recorda à Al Jazeera Vadim Karasev, analista político ucraniano, caracterizando-o como alguém que “criou o milagre ucraniano da exportação de grãos”.
A popularidade de Oleksiy Vadatursky devia-se também ao facto de ser patriota. Financiou o exército desde o início da guerra no leste ucraniano e na Crimeia e, em 2018, entrou na lista negra da Rússia. Após a invasão, o magnata decidiu permanecer na Ucrânia, numa atitude que destoou da maioria dos oligarcas ucranianos, que fugiram para o estrangeiro.
Oleksiy Vadatursky ficou na Ucrânia, mas soube que corria risco de vida. Vivia em Mykolaiv, perto da frente de guerra, e o Kremlin não gostava particularmente dele. Contudo, de acordo com o Corriere dela Sera que cita fontes ucranianas, a Rússia chegou a propor, logo após a invasão, que o magnata se convertesse num colaborador oculto do regime russo.
A Rússia queria aproveitar a influência no mundo rural e empresarial de Oleksiy Vadatursky, conseguindo assim tomar a região do sul da Ucrânia mais rapidamente — cortando também o acesso aos portos fluviais a Kiev. Em troca, Moscovo prometia proteger o património do magnata, assim como benefícios na indústria agrícola e naval no país após a conquista da região.
As propostas russas foram em vão, sendo que Oleksiy Vadatursky nunca as terá aceitado. O magnata acabou por morrer no passado sábado após um ataque preciso das forças russas, que terá sido direcionado ao seu quarto, o que motivou que surgissem vários rumores de que a sua morte foi um ato de vingança do Kremlin. Por exemplo, nas redes sociais, o conselheiro do Presidente ucraniano, Mykhailo Podolyak, denunciou que a casa do empresário foi claramente um “alvo”.
O negócio e o monopólio dos portos fluviais ficam agora nas mãos do filho, Andrii Vadaturskyi, e dos três netos.