Foi há quase 73 anos que a rainha Isabel II deu à luz o primeiro de quatro filhos. Um ano após o casamento com Filipe, duque de Edimburgo, nasceu Carlos — o herdeiro do trono britânico. Corria o ano de 1948. Dois anos mais tarde nasceu a princesa Ana, a única filha do casal, e, três anos depois, quando Isabel tinha apenas 25 anos, subiu ao trono britânico, onde se manteve até ao dia da sua morte.

A família não viria, porém, a ficar por aqueles dois filhos. Mais de uma década depois, a rainha voltou a engravidar: primeiro de André, o duque de Iorque, e, depois, de Eduardo, o conde de Wessex, que nasceram em 1960 e 1964, respetivamente. A verdade é que a rainha Isabel foi rainha, sim, mas também foi mãe, ainda que muitas vezes esse seu “papel” tenha sido alvo de críticas. Foi acusada de ser “fria” na relação com os filhos e de não passar tempo com eles. Apesar de tudo há também vozes contraditórias, que afirmam que a rainha foi uma boa mãe, mas que a vida que teve “não a deixou ser a mãe que ela queria”. Como era, afinal, a rainha Isabel II enquanto mãe e qual era a natureza da sua relação com o príncipe Carlos — o filho herdeiro do trono?

Tinha 21 anos e estava no auge da sua juventude quando Carlos recebeu o título de príncipe de Gales em 1969, atribuído pela sua mãe, momento em que percebeu que ia ser o sucessor da rainha de Inglaterra. A relação dos dois foi, contudo, desde cedo questionada pelos ávidos seguidores da vida da família real britânica. A polémica instalou-se cedo, quando em 1953, após ter sido coroada, a rainha Isabel viajou com o marido pela Commonwealth, deixando os filhos entregues aos cuidados das amas e criados durante seis meses, bem como da avó, com quem Carlos começou a desenvolver uma relação muito próxima. Nesta altura, começou a ser criticada precisamente por deixar os filhos pequenos — Carlos, de cinco anos, e Ana, de três, — sozinhos durante tanto tempo, colocando os deveres enquanto rainha à frente da própria família.

De acordo com o autor de “The Crown: The Official Companion“, o historiador Robert Lacy, a rainha acreditava que era melhor deixar as crianças ao cuidado das amas ao invés de as levar consigo pelo mundo fora. “Ela foi educada nesse estilo, com os pais a deixá-la em casa, por sua conta, e a confiarem a sua educação a uma governanta e aos caseiros“, afirmou . Talvez por esta razão, os vínculos criados entre mãe e filho tenham sido questionados por muitos. A relação que tinha com a mãe não era, nem de perto nem de longe, tão próxima como aquela que tinha com as amas e com a avó, de quem tanto gostava — “Desde criança que a adoro”, disse o príncipe Carlos, em 2002, no seu funeral. Em 2013, cartas privadas revelaram que foi precisamente ela, a Rainha-Mãe, como é conhecida, quem tentou convencer Isabel e Filipe a não mandarem Carlos para a escola Gordonstoun, na Escócia, mas sim para Eton, perto de Londres. Um gesto que mostra o carinho que nutria pelo neto: “Ele ficaria terrivelmente isolado e sozinho no norte“, argumentou na altura. Sem qualquer sucesso.

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Na biografia autorizada do príncipe Carlos, de 1994, Jonathan Dimbleby cita o príncipe a dizer que as pessoas que o educaram não foram os pais, mas “inevitavelmente as amas”, que o ensinaram a brincar, o ajudaram a dar os primeiros passos, o castigaram e recompensaram. A autora da mais recente biografia do príncipe de Gales — “Prince Charles: The Passions and Paradoxes of an Improbable Life” –, partilha de uma visão semelhante. Quando Isabel se tornou rainha, após a morte do seu pai, a enorme dedicação à sua função “era sinónimo de ainda menos tempo para os filhos”, escreveu Sally Bedell Smith, acrescentando que “Ela [a rainha] dependia cada vez mais do marido, para tomar grandes decisões familiares, e das amas“, para supervisionarem o quotidiano dos seus filhos. A autora escreve mesmo que a rainha Isabel II e o príncipe Filipe só viam os filhos depois do pequeno-almoço e na hora do chá — “ao estilo da classe alta, nenhum deles era fisicamente demonstrativo”.

A rainha não é boa a mostrar afeto“, explicou o ex-conselheiro sénior de longa data de Isabel II, na biografia. Aliás, quando regressaram da viagem de seis meses à Commonwealth, tanto a rainha como o príncipe Filipe demonstraram o seu distanciamento relativamente aos filhos, não recorrendo a grandes abraços ou longos beijos. Ao invés disso, apenas deram um aperto de mão aos filhos ainda pequenos.

O papel de rainha colocou-se muitas vezes à frente do de mãe e Isabel chegou a sentir-se desesperada pelos laços que não tinha criado com Carlos. Em 2002, o antigo conselheiro da rainha, Graham Turner, escreveu no The Telegraph sobre uma dada altura em que a rainha Isabel e o príncipe Filipe discutiram o desespero que sentiam relativamente às crianças: “Onde é que errámos? O que é que podemos fazer agora? O Carlos tem quase quarenta anos“, questionou a rainha. Turner chegou mesmo a escrever que ela se sentia “tremendamente” culpada pelo facto de o trabalho a ter guiado noutra direção, tendo acabado por sacrificar a vida familiar pelo país.

De acordo com uma amiga próxima, a rainha estava com muito medo quando se viu com o primeiro filho nos braços, porém, à medida que foi tendo os outros, ficou com cada vez menos receios sobre como ser mãe. Mas nem os medos fizeram com que não dedicasse tempo aos filhos. Por exemplo, Carlos tinha apenas quatro anos quando Isabel o começou a ensinar a andar a cavalo. Na mais recente biografia, e segundo um antigo membro da família real, lê-se que a rainha “era muito mais próxima” dos filhos “do que o Carlos faz querer parecer”. Outros “tempos mágicos, cheios de diversão e amor” eram os que passavam em Balmoral, onde os filhos da rainha tinham de “fazer as próprias camas e ajudar nas limpezas”, mas onde ela lhes “cozinhava o jantar”, algo que “eles adoravam”. Também Margaret Rhodes, prima de Isabel II, falou sobre a relação mãe-filho de Isabel e Carlos: “A rainha adora o Carlos profundamente. É só que eles têm diferentes visões e às vezes não estão de acordo. Ele é uma pessoa do tipo copo meio vazio, enquanto ela é do tipo copo meio cheio”.

Apesar de o príncipe Carlos e a princesa Ana serem os dois irmãos mais velhos e terem pouca diferença de idades, as suas perceções relativamente às experiências que vivenciaram enquanto crianças são bastante distintas. Em 2002, em entrevista à BBC, a única filha da rainha opôs-se publicamente aos rumores de que a mãe não era carinhosa para com eles. “Simplesmente não acredito que haja alguma evidência que possa sugerir que ela não se importa“, afirmou na altura. De acordo com Robert Lacy, a princesa Ana cresceu muito próxima da mãe, até mesmo durante a adolescência. “Eu não acredito que algum de nós por um segundo pudesse pensar que ela não quer saber de nós, exatamente da mesma maneira que qualquer outra mãe quer“, clarificou a princesa Ana durante a entrevista.