O PS vai requerer ao Banco de Portugal “toda a documentação e informação” que justificaram a intervenção do ex-governador Carlos Costa no processo Eurobic/BPI, anunciou esta quarta-feira o líder parlamentar socialista.
“O Grupo Parlamentar do PS, como primeira iniciativa, vai requerer ao Banco de Portugal toda a documentação e informação – quer ao departamento de supervisão, quer a outros departamentos que o Banco de Portugal entenda por pertinente -, sobre o processo de intervenção do Banco de Portugal no processo do Eurobic e sobretudo na semana entre 10 e 17 de abril de 2016″, anunciou Eurico Brilhante Dias numa conferência de imprensa na Assembleia da República.
Brilhante Dias considerou ser “muito importante” perceberem-se “os fundamentos” desta intervenção, adiantando que o PS quer “os documentos, as atas, a fundamentação técnica” que a motivou.
Acompanhado pelos dirigentes do PS Jamila Madeira e Miguel Costa Matos, o líder parlamentar socialista considerou que a carta enviada pelo primeiro-ministro na terça-feira à noite em resposta às perguntas do PSD sobre alegadas interferências no Banco de Portugal mostram que se mantém, “de facto, uma nebulosa” sobre este caso.
Há “uma parte que não está esclarecida, mas que não diz respeito à intervenção do senhor primeiro-ministro, mas sim do senhor ex-governador Carlos Costa, em particular no Banco de Portugal no quadro da sua intervenção no BPI”, afirmou.
Brilhante Dias citou a carta enviada pelo primeiro-ministro, que refere que “após um intenso processo de negociação, os acionistas do BPI comunicaram publicamente, em 10 de abril de 2016, ter chegado a um acordo que garantia que o banco BPI solucionava o problema da ultrapassagem do limite dos grandes riscos e dessa forma evitava medidas sancionatórias que punha em causa”. No entanto, António Costa refere que, três dias depois, a 13 de abril de 2016, o seu executivo tomou conhecimento de que Isabel dos Santos “estava a pôr em causa o acordo a que os acionistas do BPI tinham chegado em 10 de abril e soube que tal era resultado de uma intervenção do governador do Banco de Portugal relativa ao EuroBic”. Nessa resposta, António Costa realçou que no dia seguinte, a 14 de abril de 2016, o Governo acabaria por aprovar em conselho de ministros aquele que ficou conhecido como diploma BPI. É que para o primeiro-ministro a incerteza no BPI colocava em causa a estabilidade do sistema financeiro. “Era esta a análise do Governo português e ainda hoje se estranha que não fosse uma evidência para todos os que tinham por dever cuidar da estabilidade financeira”, e é aqui que assume que isso mesmo transmitiu ao então governador de forma “leal, direta, informalmente e sem publicidade”, no “quadro do contacto que mantinham”.
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Segundo Eurico Brilhante Dias, é a alegada intervenção do ex-governador Carlos Costa que importa esclarecer, uma vez que a mesma acabou “por sabotar um acordo entre acionistas” e “punha em causa a estabilidade do sistema financeiro português”.
“A 17 de abril o acordo caiu e nós queremos conhecer os fundamentos da intervenção que levaram a que o acordo de acionistas fosse bloqueado e não se concretizasse conforme anunciado a 10 de abril de 2016”, salientou.
Brilhante Dias vincou que a alegada intervenção em questão neste processo poderia ter posto em causa “todo o sistema financeiro português porque uma intervenção na Comissão Europeia, da União Europeia, em particular do BPI, levaria a que o banco fosse sancionado financeiramente, colocando em causa até outros processos em paralelo, como era por exemplo o caso da capitalização da Caixa Geral de Depósitos”.
Horas antes o PSD declarou que António Costa continua sem dar esclarecimentos cabais sobre as alegadas pressões do primeiro-ministro sobre António Costa, então governador do Banco de Portugal, num caso que envolvia Isabel dos Santos, e ainda as decisões do Governo no processo de resolução do Banif.
No Parlamento, Miranda Sarmento, líder parlamentar social-democrata, acusou o primeiro-ministro de se estar a “furtar” em “responder aos portugueses” e admitiu que o PSD pode repetir perguntas que não mereceram resposta de António Costa ou fazer “novas perguntas” — de fora pareceu ficar a hipótese de avançar com uma comissão parlamentar de inquérito.
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Brilhante Dias admitiu, por seu turno, que este requerimento de documentação ao Banco de Portugal é apenas uma “primeira iniciativa”. O líder parlamentar do PS diz que o seu partido vai “ler com atenção” a documentação, não querendo antecipar um segundo passo, mas referiu que, caso venha a ser necessário, irão solicitar “mais esclarecimentos”.
“Os mais esclarecimentos podem ter figuras diferentes: ou pedir mais esclarecimentos, ou ouvir o senhor governador do Banco de Portugal em exercício [Mário Centeno] e, no futuro próximo, se entendermos muito pertinente, outras personalidades”, disse.
Questionado se essas outras personalidades podem incluir uma audição com o ex-governador Carlos Costa, Brilhante Dias respondeu: “Uma coisa de cada vez”. “Nós estamos a pedir os documentos, se não ficarmos esclarecidos e entendermos que é precisa mais informação, admitimos audições. A primeira audição é naturalmente do titular do Banco de Portugal neste momento”, frisou.
Interrogado ainda se, uma vez que não está constituída uma comissão de inquérito sobre este assunto, o Banco de Portugal é obrigado a entregar a documentação solicitada, Brilhante Dias respondeu: “Não precisamos de comissões parlamentares de inquérito para requerer documentação e pedir a melhor colaboração às entidades públicas”.
“O Banco de Portugal é uma entidade pública, que tem um conjunto de obrigações, mas também tem deveres de esclarecimento junto do parlamento. Por isso, aguardaremos seguramente que o Banco de Portugal, de forma colaborativa – aliás como costuma ser -, colabore com o parlamento no esclarecimento disto que nos parece crítico”, disse.