O Santander Portugal fechou o exercício de 2022 com resultados de 568,5 milhões de euros, anunciou o banco esta quinta-feira em conferência de imprensa na sede em Lisboa. Pedro Castro e Almeida referiu, também, que tem tido “poucos milhares” de pedidos de renegociação de crédito e sublinhou que os portugueses de classe média (e média alta) continuam com “padrões de consumo muito elevados” – e isso pode-se constatar quando se “circula pelas ruas de Lisboa para jantar a uma 6ª feira à noite”.

“São resultados muito bons, que nos orgulham”, afirmou Pedro Castro e Almeida, o presidente da comissão executiva. Os resultados quase duplicaram em relação aos cerca de 298 milhões do ano anterior mas o banqueiro recusa que possa haver aqui “lucros excessivos”. Os 568,5 milhões são o resultado recorrente, que exclui uma mais-valia contabilística com a venda de uma unidade a outra área do grupo, pelo que o banco não a inclui no resultado recorrente.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre a situação económica dos portugueses.

Juros sobem, mas continuamos a “jantar fora à 6ª”?

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“Lá estamos nós em Portugal a demonizar quem tem um bom ordenado ou quem tem lucros. A revolução já lá vai há muito tempo, ter lucros é bom para toda a economia. O lucro excessivo tem de ser calculado em comparação com a rentabilidade do capital investido”, afirmou o presidente do Santander, lembrando que “este será o primeiro em que passamos a ter, na banca em Portugal, lucros em que a rentabilidade do capital é superior ao custo do capital”.

O responsável referiu, sobre as subidas da taxa de juro, que o banco analisou “todos” os clientes com crédito à habitação – entre 265 mil clientes – e “poucos milhares estão em risco de incumprimento”. Serão cerca de dois mil casos, segundo Pedro Castro e Almeida, em que clientes estão no PARI mas ainda não foram necessariamente renegociados.

“No Santander não vemos nenhuma alteração relevante no incumprimento no crédito à habitação“, afirmou o responsável, reconhecendo que a “rápida subida das taxas de juro” está a ter “um impacto muito grande sobretudo nas pessoas que compraram casa nos último quatro ou cinco anos”.

Existe uma enorme assimetria entre o que é falado por uma associação de defesa dos consumidores, que fala de um ou outro caso, e a realidade que vemos nos bancos”, diz Pedro Castro e Almeida.

Para o CEO do Santander, “o consumo está em níveis muito elevados e nós estamos em pleno emprego, enquanto estamos em pleno emprego pode haver aqui ajustamentos nas prestações, mas não vamos ter uma situação também muito complicada”.

Vocês veem“, afirmou Pedro Castro e Almeida, dirigindo-se aos jornalistas, que “não é uma questão de estrangeiros, podem circular por Lisboa que estão aqui, a jantar fora a uma sexta, ou um sábado de manhã podem circular pela rua e continuamos a ver as pessoas com um nível de um padrão de consumo, classe média e média alta, relativamente elevado face ao histórico e à situação em que está a economia. Isto tem a ver, também, com os níveis de poupança que foram acumulados durante a pandemia.”

O responsável reconheceu que há problemas na classe baixa e média-baixa mas “isso não é um problema do crédito à habitação”: “quem está a sofrer mais pela situação atual de aumento da inflação são as classes mais baixas e essas pessoas normalmente não têm crédito à habitação – estão a pagar mais pelos alimentos e pelas rendas” e essas deve o Estado ajudar com políticas sociais.

Nas classes média e média-alta, é verdade que há pessoas que se calhar estão a ter de tirar os filhos da escola particular, mas não são pessoas que estão a passar fome. Quando falamos do aumento das prestações do crédito à habitação não estamos a falar das classes baixas, estamos a falar das classes média e média alta”, diz o presidente do Santander.

Por outro lado, Pedro Castro e Almeida defendeu que “em vez de se falar de comissões bancárias” ou aumento das prestações, também se devia olhar para a carga fiscal que os portugueses pagam, “as taxas e taxinhas” que o banqueiro diz serem muito mais significativas do que, por exemplo, as comissões cobradas por quem presta serviços bancários.

O nível do consumo, em termos macroeconómicos, está em níveis muito elevados e estamos em pleno emprego. Enquanto estivermos em pleno emprego, não vamos ter uma situação muito complicada”, disse o presidente do Santander.

Sobre as taxas de juro do BCE e os indexantes de crédito, Pedro Castro e Almeida avisou que “se as taxas forem para 4% isso vai ter um impacto, em termos de arrefecimento, neste momento não estamos a ter muitas renegociações de crédito mas aí vão ser muito mais”.

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A “dissonância de comunicação” sobre a “marcação” de clientes

O presidente do Santander Portugal falou, também, sobre o que diz ser uma “dissonância de comunicação” sobre a questão da marcação de clientes. “O que o Banco de Portugal veio dizer é que não há marcação na Central de Responsabilidade de Crédito, e isso é verdade”, diz Pedro Castro e Almeida.

Mas “os bancos, por exigências da EBA e do BCE, são por questões prudenciais obrigados a registar nos seus sistemas todos os clientes com créditos reestruturados com indícios de dificuldades“.

Na nova concessão de crédito, naturalmente importa ao próprio banco saber se o cliente teve dificuldades financeiras”, explicou Pedro Castro e Almeida.

Claro que o cliente pode ir a outro banco e se o fizer “o outro banco tem na CRC que o cliente reestruturou mas não sabe se foi PARI. cabe a cada um dos bancos perguntar aos clientes qual foi a razão da reestruturação”, diz o banqueiro.

Bancos “marcam” clientes se tiverem “dificuldades financeiras” e renegociarem o crédito

Na conferência de imprensa, Pedro Castro e Almeida sublinhou a necessidade de o Governo manter como prioridade a consolidação orçamental para evitar o risco de que Portugal se veja em dificuldades caso a instabilidade nos mercados de dívida aumente e volte a haver dilatação dos prémios de risco da dívida, como aconteceu em 2010 e 2011.

O banqueiro elogiou, também, as empresas exportadoras e alertou que o aumento do peso do consumo na economia portuguesa “não é sustentável” é faz “lembrar tempos antigos”.

Instabilidade na maioria absoluta. “Com muito barulho no dia-a-dia torna-se mais difícil”

Questionado sobre a instabilidade no Governo nos últimos meses, o presidente do Santander referiu que, tal como um banco ter poucos problemas de balanço permite dedicar menos atenção ao dia a dia e mais atenção às grandes prioridades, o Governo quando tem uma gestão do dia a dia torna-se mais difícil olhar para as prioridades”.

A minha expectativa é que possa haver nos próximos três anos da maioria absoluta mais enfoque nas prioridades do país, “mais soluções para a burocracia, a retenção do talento, a boa gestão na saúde”. “Com muito barulho no dia-a-dia torna-se mais difícil“, atirou Pedro Castro e Almeida.

Olhando para 2023, Pedro Castro e Almeida referiu como risco que a inflação possa continuar elevada, sobretudo a inflação subjacente (que exclui os preços da energia). Outro risco é uma subida maior do que a prevista nas taxas de juro. “Não subestimaria o risco de as taxas irem entre 3,5% e 4%, o mercado não está a descontar essa situação e seria uma grande diferença, para os bancos e para as famílias”.

Porém, “a variável a que temos de estar mais atentos é o desemprego“. “Um desemprego abaixo de 8% é uma coisa, um desemprego acima de 8% é outra coisa”, referiu Pedro Castro e Almeida, que falou, também, do risco de “não execução do PRR de uma forma eficaz”, que poderá ser “uma janela de oportunidade perdida”.

Além disso, o banqueiro criticou o excesso de burocracia na economia portuguesa e o facto de, “em Portugal, ser um crime criar riqueza”. “Estamos todos os dias a discutir generalidades mas não devemos continuar assim nos próximos três anos“, atirou.

(Notícia expandida no dia 3 de fevereiro, às 6h30, com a totalidade das declarações de Pedro Castro e Almeida sobre os padrões de consumo dos portugueses, para que melhor se compreenda o sentido da declaração do CEO do Santander)