O CEO da Google tinha prometido na semana passada novidades na área da inteligência artificial (IA) nas “próximas semanas e meses”. Afinal, foram precisos apenas alguns dias para a gigante da internet oficializar a experiência com que pretende responder ao ChatGPT da rival OpenAI.
A revelação do Bard foi feita através de uma publicação no blog da Google, assinada por Sundar Pichai, CEO da companhia. “Temos estado a trabalhar num serviço de conversação experimental de IA, alimentado pelo LaMDA [modelo de linguagem para aplicações de diálogo desenvolvido pela Google], que chamamos Bard”, escreve Sundar Pichai.
A Google tem já há alguns anos a inteligência artificial como uma das prioridades e não é segredo que nos bastidores há várias investigações em curso. Além de ser dona da Deepmind, uma empresa de IA, a tecnológica também investiu na semana passada 400 milhões de dólares numa startup que está a desenvolver um “chatbot” para rivalizar com a OpenAI.
Google investe 400 milhões na Anthropic, a startup que rivaliza com a criadora do ChatGPT
O LaMDA é um dos exemplos mais conhecidos e, no ano passado, até foi notícia quando um dos engenheiros da empresa alegou que este modelo tinha chegado a um patamar tão avançado que já teria consciência. A empresa negou esta teoria e o investigador foi afastado da companhia.
Google. Como é que um sistema de IA conseguiu “enganar” um engenheiro só com palavras?
O LaMDA é o modelo de linguagem que vai fazer com que o Bard funcione, ainda que o serviço esteja a ser lançado “inicialmente” com uma versão mais simples do modelo de linguagem. A Google explica que isso faz com que seja necessário um menor poder de computação e, consequentemente, permite “escalar para mais utilizadores”.
Nas entrelinhas fica, assim, um recado para a responsável pelo ChatGPT. Devido à popularidade deste serviço e do número crescente de utilizadores curiosos, já acima da cifra dos milhões, o ChatGPT tem estado muitas vezes indisponível para os utilizadores. Ainda esta terça-feira, quem quiser conversar com este modelo é recebido com a mensagem “o ChatGPT está cheio neste momento”. Só os subscritores do ChatGPT Plus, um modelo de subscrição lançado recentemente pela OpenAI e com mensalidade de 20 dólares, é que conseguem aceder ao site. Neste momento, este serviço está apenas disponível nos Estados Unidos.
O Bard da Google é descrito por Sundar Pichai como um modelo que “procura combinar a amplitude do conhecimento mundial com o poder, a inteligência e a criatividade dos nossos grandes modelos de linguagem.” A empresa deixa alguns exemplos do que é que este modelo vai conseguir fazer: “(…) pode ser uma saída para a criatividade e para despertar a curiosidade ajudando a explicar as novas descobertas do Telescópio Espacial James Webb da NASA a uma criança de nove anos ou aprender mais sobre os melhores avançados do futebol do momento e, em seguida, obter exercícios para desenvolver as suas competências.”
Neste lançamento, há duas grandes diferenças entre o Bard e o ChatGPT. O Bard não vai, por enquanto, poder ser usado pelo público, enquanto o ChatGPT ficou disponível para acesso generalizado em novembro, quando foi lançado. Sundar Pichai explica que o Bard vai ficar primeiro ao alcance de pessoas “confiáveis antes de o tornar amplamente disponível ao público nas próximas semanas”. A segunda diferença é que o Bard vai estar baseado em “informações da web para oferecer respostas novas e de alta qualidade”. O ChatGPT não está ligado à internet e foi desenvolvido com informação que vai apenas até 2021. Se quiser fazer uma pergunta sobre algo mais recente, o modelo da OpenAI não consegue responder.
Pelos exemplos de imagens da Google, o Bard vai funcionar no mesmo modelo de perguntas e respostas do ChatGPT. Haverá uma caixa de texto para o utilizador escrever as perguntas e, na parte inferior do ecrã, alguns ícones para poder deixar indicações positivas ou negativas à resposta.
Os comentários e reações vão ser importantes para a Google, que explica que vai “combinar as reações e comentários externos com os nossos próprios testes internos para garantir que as respostas do Bard respondem aos elevados padrões de qualidade, segurança e fundamentação em informações do mundo real.”
A empresa explica também que o Bard não é a única faceta em que pretende mostrar aos utilizadores o potencial da inteligência artificial. Sundar Pichai descreve que esta tecnologia pode ser útil também nas pesquisas no próprio motor Google, sintetizando ideias para perguntas mais complexas. E promete que os utilizadores da pesquisa da empresa vão começar a ver funcionalidades baseadas em IA, para resumir “informações complexas e várias perspetivas em formatos fáceis de assimilar para que se possam compreender rapidamente o panorama global e aprender mais na web (…)”. A companhia não concretiza quando é que estas novidades vão chegar, indicando apenas que será “em breve”.
Foi dado um exemplo do aspeto desta informação na pesquisa. Em vez de ver um conjunto de ligações disponíveis com a informação pesquisada, será visível um pequeno texto-resumo no topo da página.
Nas primeiras semanas do ChatGPT, muitos utilizadores estavam a usar o modelo da OpenAI como uma espécie de Google que conseguia fazer resumos – mesmo que as respostas nem sempre fossem as mais corretas.
A popularidade do ChatGPT, desenvolvida pela OpenAI, tem estado no centro das atenções e já valeu um reforço do investimento que a gigante Microsoft tinha na empresa liderada por Sam Altman. A Microsoft anunciou recentemente um investimento de vários “milhares de milhões” de dólares na OpenAI, ao longo de vários anos. Não foi concretizado um valor, mas na altura a Bloomberg avançou que o montante rondaria os 10 mil milhões de dólares. A Microsoft tem também uma parceria com a OpenAI para integrar os modelos da empresa na suite de ferramentas que disponibiliza aos clientes empresariais.
Microsoft confirma que vai investir “vários milhares de milhões” na criadora do ChatGPT
Perante a atenção à OpenAI, a Google estava a ser cada vez mais pressionada para responder, especialmente tendo em conta que há vários anos que desenvolve investigação na área da inteligência artificial. Segundo a imprensa norte-americana, um dos pontos de pressão terá vindo até dos próprios empregados. De acordo com a CNBC, alguns dos responsáveis da empresa defenderam que a Google temia os dados reputacionais de divulgar ao público um modelo ou serviço que ainda não estivesse totalmente desenvolvido. Tal como outras empresas da indústria, a Google tem consciência de que muitos destes modelos baseados em IA podem reproduzir comportamentos tendenciosos, racistas ou estereótipos, algo que tem consequências junto do público.
A inteligência artificial aprendeu a ser preconceituosa. Ainda vai a tempo de ser ética?
O serviço Bard foi oficializado um dia antes de a Microsoft marcar um evento surpresa, que vai estar dedicado à inteligência artificial. Decorrerá a partir do quartel-general de Redmond, e arranca às 18 horas desta terça-feira (hora de Lisboa).
Google investe 400 milhões na Anthropic, a startup que rivaliza com a criadora do ChatGPT