Numa altura em que o preço (elevado) é apontado como um dos principais motivos pelos quais não há mais condutores a aderir a uma mobilidade 100% eléctrica, chega a confirmação que ter um eléctrico amigo do ambiente e eficiente, afinal, não tem de ser necessariamente um balúrdio. Isto porque, para o “braço verde” do Euro NCAP, o chamado Green NCAP, o melhor modelo exclusivamente a bateria que foi testado em 2022 pelos especialistas do consórcio europeu é o acessível Dacia Spring.

O eléctrico romeno foi submetido aos mais variados testes e passou com distinção em todos eles, conseguindo a proeza de ficar à frente do Tesla Model 3, que até há bem pouco tempo, era a referência em termos de eficiência, ainda que obviamente maior, mais pesado e mais potente. No processo, o crossover citadino da Dacia ainda conseguiu ofuscar o desempenho de modelos como o Renault Mégane E-Tech, seu “parente” de grupo, o Cupra Born e o Nio ET7. Para trás ficaram também o Audi Q4 e-tron e o Hyundai Ioniq 5.

Mas, antes de avançarmos com a classificação final atribuída pelo Green NCAP, importa clarificar como é que este organismo elege o carro que menor impacto tem no ambiente e que, fruto de uma ponderação alicerçada em três critérios, se impõe como a melhor opção de compra entre os novos modelos introduzidos no mercado europeu, conciliando uma reduzida pegada ambiental com o melhor aproveitamento da energia que armazena na bateria. Isto é, tendo uma gestão energética eficiente, o que, em última análise, se traduz por um baixo custo de utilização.

Ranking Green NCAP 2022

1.º Dacia Spring9,9

2.º Tesla Model 39,8

3.º Nio ET79,6

3.º Renault Mégane E-Tech9,6

3.º Cupra Born9,6

Clicando em cada um dos modelos, acede ao relatório completo.

Os três critérios avaliados pelo Green NCAP são o Índice de Ar Limpo, o Índice de Eficiência Energética e, por fim, o Índice de Gases de Efeito Estufa (GEE). Os dois primeiros são mais facilmente inteligíveis, indicando, respectivamente, os poluentes emitidos pelo tubo de escape – o que num eléctrico puro é garantia imediata de pontuação máxima (10) – e a capacidade do veículo rentabilizar a energia que armazena nos acumuladores. Já o terceiro baseia-se numa abordagem “do poço à roda”, ou seja, considera as emissões de GEE associadas ao fornecimento de energia.

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Spring é “um exemplo” para a indústria

Como o próprio Green NCAP explica, foi fácil para o Dacia Spring arrecadar a pontuação máxima no Índice de Ar Limpo. Contudo, o pequeno modelo do Grupo Renault que quer mudar a paisagem urbana, conquistou a vitória por ter atingido a classificação mais elevada no Gases de Efeito Estufa e, mais importante que isso, um nunca antes alcançado score de 9,8 (em 10) no Índice de Eficiência Energética. A explicação para tal reside essencialmente no peso, de apenas 1045 kg. Sendo muito leve e tirando proveito da pequena e pouco potente motorização eléctrica, “o urbano compacto da Dacia recebeu a pontuação máxima em três dos quatro testes realizados, com um consumo de energia inferior ao limite máximo de pontos do Green NCAP”, refere o consórcio sob a égide do Euro NCAP. O mesmo acrescenta que “89% da energia retirada da rede eléctrica está disponível na saída da bateria, o que significa que o processo de carga e descarga é eficiente”, para o que contribuem os carregamentos em DC com baixa potência (somente 30 kW).  Para o Green NCAP, não há dúvidas que o Dacia Spring se destaca pelo baixo consumo de energia e que, “com este excelente resultado”, o eléctrico do construtor romeno “define um padrão para a indústria”, conseguindo ser simultaneamente barato, apelativo no design e ecofriendly.

Dacia Spring. Guiámos o eléctrico mais barato e dizemos-lhe como é

“Com este modelo, a Dacia está à frente de muitos outros fabricantes, em termos de impacto no meio ambiente”, conclui o Green NCAP. O veredicto deste organismo não poderia ser mais taxativo, ao reconhecer que os apenas 33 kW de potência limitam a dinâmica do pequeno citadino, mas a sua estética e a sua eficiência apelarão “a quem procura uma mobilidade urbana individual, limpa, eficiente e acessível”. Certo é que a fraca potência e o ambiente espartano a bordo deverão, em breve, ser compensados com a chegada da versão Extreme, conforme já aqui lhe indicámos.

Por apenas mais 50€, Dacia Spring melhora (muito)

Desde que foi lançado, o Dacia Spring já acumula para cima de 100 mil encomendas, com as entregas a serem asseguradas pela única fábrica onde este modelo é produzido, a unidade da Dongfeng, em Shiyan, na China, de onde é exportado para os diferentes mercados, incluindo o português. O citadino com ares de SUV não impressiona pela potência (apenas 45 cv) e está limitado a 125 km/h de velocidade máxima, mas com uma bateria com apenas 27,4 kW de capacidade total (26,8 kWh úteis), consegue anunciar uma autonomia em cidade de 314 km e em ciclo misto, segundo o protocolo europeu WLTP, de 230 km. A realidade de utilização, à semelhança do que acontece noutros modelos eléctricos, aponta desvios. Diz a Green NCAP que a uma temperatura ambiente de 23ºC, o Spring não deverá fazer mais que 140 km em auto-estrada, precisamente a condição simulada laboratorialmente em que o consumo disparou para 23,0 kWh/100 km. Em média, o consumo andará mais próximo dos 18,5 kWh/100 km, o que redunda num alcance de 180 km entre visitas ao posto de carga.

Então, e o Tesla Model 3?

O eléctrico mais barato da Tesla, o Model 3, continua a ter um desempenho quase inatacável. Daí o 9,8 que lhe foi atribuído na classificação geral do Green NCAP. Há que frisar que a berlina desportiva do construtor norte-americano nada tem que ver com o crossover romeno, em termos de filosofia, performance, dotação tecnológica e… preço. Enquanto, por cá, o Dacia Spring é neste momento comercializado por valores a partir de 20.400€, o Model 3 mais barato custa 44.990€, oferecendo em troca um motor eléctrico com 208 kW/283 cv de potência e 353 Nm de binário, que lhe permitem ir de 0 a 100 km/h em 6,1 segundos, para depois atingir uma velocidade máxima de 225 km/h. Ou seja, mais 100 km/h que o Spring que, por sinal, é inevitavelmente mais lento no sprint (passados 19,1 segundos é superada a fasquia dos 0 a 100 km/h).

Muito mais pesado que o Dacia (massa de 1760 kg contra apenas 970 kg), o Model 3 anuncia um consumo médio de 14,1 kWh/100 km, pelo que a sua bateria de 60 kWh lhe permite anunciar 491 km de autonomia em ciclo misto e 603 km em cidade. Diz o Green NCAP que o Tesla andará mais próximo dos 450 km de autonomia real, mas “apresenta valores de consumo muito baixos, o que prova que foi projectado com especial enfoque na eficiência e na autonomia”. Acrescenta ainda que o Model 3 é uma espécie de rei da auto-estrada, tendo sido o veículo que neste requisito obteve a pontuação mais elevada de todos os veículos testados, ao registar um consumo de 21,1 kWh. Contudo, o Tesla perde e muito do seu alcance quando as temperaturas baixam para menos de 7ºC. Aí, segundo o organismo europeu, o consumo dispara 72%. Isso e as perdas detectadas nos testes de carregamento (11 kW em corrente alternada) afastam o Model 3 do Dacia Spring, permitindo-lhe que este triunfe na categoria mais verde do Green NCAP.

No entanto, o organismo tutelado pelo Euro NCAP, ao mesmo tempo que atribui a liderança ao Spring em termos ambientais e de eficiência, também aproveita para relembrar que no domínio da segurança, o eléctrico romeno foi um desastre. Mereceu apenas uma estrela nos testes do Euro NCAP, com 79% na protecção de adultos, 65% na protecção de crianças, 39% na protecção de peões e 32% nos sistemas de segurança. Por seu lado, o Model 3 conquistou as cinco estrelas com, respectivamente, 96%, 86%, 74% e 94%. Daí que o Euro NCAP tenha incentivado a Dacia a “assumir, a longo prazo, o mesmo compromisso com a segurança”.