O aumento do custo de vida nos últimos anos tem-se feito sentir não apenas em Portugal e nos países da Europa, mas também no outro lado do oceano Atlântico, com um grupo específico de imigrantes a apostar cada vez mais em viver na zona do Mediterrâneo.
Em 2022, havia cerca de 10 mil norte-americanos a viver em Portugal, um número que ganha mais relevância quando significa um aumento de 239% face a 2017, segundo o The New York Times. Em Espanha, as vendas de imóveis a norte-americanos aumentaram 88% entre o primeiro semestre de 2019 e o primeiro semestre de 2022, com os imigrantes dos Estados Unidos da América a serem aqueles que estão dispostos pagar mais por metro quadrado, ultrapassados apenas pelos dinamarqueses. O ano passado, os norte-americanos foram também aqueles que adquiriram mais vistos gold em Portugal, quando quatro anos não faziam sequer parte das cinco principais nações que o faziam.
Viver o sonho americano no sul da Europa é uma visão apelativa para quem ganha pouco para viver de forma tranquila nas grandes cidades dos Estados Unidos, mas mais do que o suficiente para permanecer financeiramente estável durante todo o ano junto do Mediterrâneo. Segundo informação do World Data referente a 2021, o salário médio anual nos Estados Unidos da América era de 70.930 dólares — o equivalente a cerca de 65.948 euros — o que coloca o país no sétimo lugar de uma lista que inclui 69 nações. Portugal aparece em 32º lugar na mesma lista, com um salário médio anual de 23.890 dólares, cerca de 22.208 euros. Espanha, uma posição acima, apresenta um rendimento médio anual de 29.690 dólares, o equivalente a 27.597 euros.
A capacidade dos imigrantes norte-americanos em suportar os preços praticados pelo mercado imobiliário em Portugal é superior à maioria da população portuguesa, que tem sido cada vez mais forçada a procurar habitação na periferia das grandes cidades como Porto e Lisboa. As casas deixadas para trás no centro das metrópoles em Portugal e Espanha são o sonho para quem se despediu do Uncle Sam.
O NYT conta a história de Ben Mitas, de 40 anos, e Megan Mitas, de 31 anos, que se mudaram da Florida para Lisboa em 2019 com os seus dois filhos, Alexandria e Nicolai. Ben trabalha como agente imobiliário especialista em hipotecas e viaja frequentemente entre Lisboa e Florida em trabalho. A família vive num T2 no Campo de Ourique, cuja renda custa 2.500 euros por mês, um valor bastante acima do salário médio mensal português. Em 2022, o casal comprou uma vivenda do século XIX na Lapa, que tem estado a renovar para se tornar na sua “casa permanente”. Além das famílias que optaram por Portugal e Espanha em vez de New Jersey ou São Francisco, a introdução de vistos a nómadas digitais permite aos trabalhadores de tecnológicas norte-americanas viver em Portugal por um período prolongado de tempo.
No entanto, não é apenas o sol, o vinho, a praia e o fado que cativam os turistas a mudarem-se para Lisboa. Uma das razões para que Portugal seja tão atrativo para os imigrantes de língua inglesa é a facilidade com que os portugueses tentam imediatamente comunicar em inglês quando se apercebem que estão a falar com alguém que não é de Portugal.
A principal preocupação deles é uma migração em busca de um estilo de vida”, explicou ao jornal nova-iorquino Luís Mendes, especialista em geografia urbana da Universidade de Lisboa. “Eles querem verdadeiramente viver aqui e ter um estilo de vida mais cosmopolita.”
O mercado de habitação tornou-se, por outro lado, cada vez menos acessível para os portugueses. Segundo o Eurostat, em 2021, 95% dos portugueses entre os 18 e os 34 anos viviam em casa dos pais. Em 2017, a percentagem era de 91%. Em Espanha, o número de adultos não emancipados é de 93%. Em Itália, a percentagem atinge os 96%. Em Lisboa, em fevereiro, o preço médio de uma renda para um T2 era de 1.700 euros, um aumento de 39% em relação ao ano anterior.
Para Simão Martins, de 22 anos, o futuro poderá passar por sair do país em busca de maior qualidade de vida. O estudante de economia na Universidade de Lisboa trabalha a tempo inteiro num restaurante, e vive com a mãe, como muitos dos jovens adultos na cidade. “Eu não quero viver sob o mesmo teto que a minha mãe para sempre“, explicou ao The New York Times. “Portugal é barato para vocês [norte-americanos], mas não para nós, e isso incomoda-me.” O jovem estudante contempla a hipótese de emigrar para o Brasil ou para a região rural de Itália, onde o custo de vida é mais barato em relação a Portugal.