O que levou à saída de Alexandra Reis da TAP? Que divergências com a presidente executivo foram insanáveis para que Christine Ourmières-Widener quisesse que a gestora saísse? Perguntas que depois da audição da CEO da TAP não ficaram totalmente esclarecidas para os deputados que esta quarta-feira insistiram no tema com Alexandra Reis.

E depois da CEO ter falado de divergências quanto ao plano de reestruturação, Alexandra Reis trouxe um desmentido. “É normal haver diferenças de opinião sobre alguns assuntos”, como “temas relacionados com a contratação de pessoas e o procurement [compras]”. Já o “provável desalinhamento com o plano de reestruturação”, Alexandra Reis diz que “não considero que seja verdade, pelo contrário”.

“Eu estive diretamente envolvida na elaboração do plano. Houve uma revisão ao plano em junho de 2021 que eu trabalhei, e essa versão foi aprovada em dezembro de 2021”.

Houve depois uma análise de sensibilidade ao plano discutida em conselho de administração a 3 novembro 2021, que a administradora considerou “ambiciosa” porque previa mais 30% de receita face a junho. “Mas o tema não é a receita, é saber como se operacionaliza essa receita, e sobre isto tinha preocupações. Não acreditava que fosse possível voar toda aquela capacidade. Não ia haver aviões. Tinha havido uma alteração ao plano de frota que me deixava preocupada. O meu dever enquanto administradora era levantar dúvidas, deixei claro que a empresa devia ter um mecanismo de gestão de risco para acomodar aquela capacidade”.

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E foi dizendo que já ouviu razões como divergências irremediáveis, falta de perfil para as divergências. “Li no relatório da IGF que seriam divergências irreconciliáveis. Ontem ouvi que seria uma questão de perfil. Não consegui entender. Eu também poderia dizer que a CEO poderia não ter o perfil ,mas não vou dizer. Não consigo identificar razões especificas. Essa questão tem de ser colocada a Christine Ourmières-Widener. O número de divergências, Alexandra Reis não quantifica. Diz apenas que já viu serem referidas sete: sede, viaturas, contratação, procurement, otimismo do plano de reestruturação, conversão do empréstimo acionista e o tema sobre a frota de aviações do ATR versus Embraer. “Vi estas serem referidas”, mas não quantifica as que considera serem as suas.

Assumindo no entanto que “sempre tive relação cordial com todos os membros da comissão executiva”, acrescenta que “ter uma opinião diferente não são divergências irremediáveis. É normal. Eu manifestava a minha opinião porque entendi que devia fazê-lo”, declarou, para garantir que nunca falou com a CEO da TAP sobre a proposta que a empresa do marido de Christine Ourmières-Widener fez à companhia.

Esse foi um tema que o Chega colocou na audição de Christine Ourmières-Widener que considerou ser um não assunto por não ter sido feito qualquer contrato, mas não disse, nessa reunião, se era um dos assuntos de divergência com Alexandra Reis. Esta gestora, inquirida esta quarta-feira, respondeu à Iniciativa Liberal que “nunca falei com a CEO sobre propostas que essa empresa [Zamna, do marido da CEO] fez à TAP. Nunca comentei com ela nem ela comigo. O processo foi iniciado em outubro. Foi feito o esforço comercial normal de uma empresa que tenta vender uma solução a outra. Mantive a minha equipa de sobreaviso e dei instruções muito claras, em dezembro, sobre nenhuma contratação àquela empresa”, revelou.

Questionada sobre se a CEO teve essa informação, a ex-administradora disse que não obteve informação de que a CEO estaria “descontente”. “Entendi dar aquelas indicações porque além do potencial conflito de interesses, aquela aquisição não estava orçamentada, nem prevista nem era uma necessidade que a empresa tivesse identificado. Achei que não valia a pena ter recursos da empresa a investir em análises detalhadas sobre este tema porque havia sempre um conflito subjacente”. Não tem, no entanto, evidência que CEO queria fazer aquele contrato.

O Chega insiste na questão da Zamna Technologies, nomeadamente como é que a proposta chegou ao conhecimento de Alexandra Reis, porque “há centenas de propostas” que chegam à TAP.

Foi a equipa de compras, revela, que alertou que aquela empresa, que pertence ao marido da CEO da TAP, estava a apresentar uma proposta, que não correspondia a um concurso que tivesse sido lançado ao mercado. “A equipa entendeu que eu devia ser alertada sobre este tema tendo em conta o potencial conflito de interesses”.

O deputado da IL prosseguiu na clarificação das divergências entre as duas gestoras. Alexandra Reis confirma as “imensas reservas” à mudança de sede para fora do aeroporto. A TAP paga zero pelo edifício onde está, mudar ia exigir pagar uma renda nas novas e um custo extra de redesenhar dessas instalações. Era uma mudança que entendia como penalizadora para os trabalhadores, para além de representar um ónus adicional para a empresa que ia ser privatizada.

A gestora descreve as instalações da TAP como “vintage”, apesar de pouco modernas, mas sublinha que são funcionais e os trabalhadores estão adaptados. Revela que tentou encontrar alternativas, tendo proposto opções (mais baratas que o noticiado edifício sede dos CTT), mas nenhuma solução foi acolhida.

A mudança da sede não foi tema muito discutido na Comissão Executiva, tendo tido mais oposição no conselho de administração, pela generalidade dos administradores não executivos, que “levantaram muitas questões”. Essa mudança não estava prevista no plano de reestruturação nem estava orçamentada para 2021, adiantou.

Uma outra alegada divergência, das referidas ao longo dos tempos, está relacionada com contratação de pessoas. Alexandra Reis lembra que a TAP passou por um período muito duro no primeiro semestre de 2021. A partir de junho, achou que era muito importante que a TAP tivesse estabilidade e tranquilidade para as pessoas que ficaram, mesmo com um corte salarial.

Admite que havia algumas posições a preencher, três a quatro, mas a dada altura diz que o número de contratações começou a subir. O que a preocupou porque achava que devia haver equidade face às pessoas que estavam na empresa que sofreram cortes salariais.

Por outro lado, e sem dar grandes detalhes, Alexandra Reis disse que a presidente executiva quis substituir algumas pessoas que considerou não serem certas para a função. E defendeu a importância de encontrar alternativas para essas pessoas dentro da TAP. Questionada sobre as razões avançadas por Christine Ourmières para substituir essas pessoas, disse que a CEO entendia que não eram as pessoas certas, adequadas à função, pelo seu perfil e o nível de inglês, exemplifica. Mas acrescenta que foram casos pontuais.

Além disso, Alexandra Reis refere possíveis diferenças sobre a questão do recrutamento, nomeadamente sobre a contratação de pessoas no estrangeiro. Alexandra Reis revela que vieram sobretudo do Reino Unido, de França e uma pessoa da América do Sul. E que “algumas pessoas não escondiam proximidade com a CEO”, eram “transparentes no tipo de relação que tinham com a CEO”. Questionada sobre a nacionalidade destas pessoas, adiantou que “penso que eram franceses”.

Estes novos recrutamentos, por serem “mais difíceis de fazer”, “ficaram mais caros”, afirmou ainda. Porque o corte de salários em vigor “tornava a empresa menos atrativa” e “competindo no mercado internacional acaba por ser assim”.

Alexandra Reis acaba por dizer que até hoje são “difusas” as razões da sua saída. E assume que com o CFO, Gonçalo Pires, só teve um momento de tensão.

A ex-gestora garantiu que as relações eram cordiais com os outros membros da comissão executiva, mas confrontada com momentos de tensão que teria tido com o administrador financeiro, relatados por Christine Ourmières, admite apenas uma situação. Segundo Alexandra Reis, aconteceu numa reunião a 27 de janeiro de 2022 (já perto da sua saída) quando a sua equipa a informou que recebeu instruções de Gonçalo Pires, o administrador financeiro que ficaria com os seus pelouros. A ex-gestora da TAP diz que tal comportamento não era comum e que chamou a atenção do administrador financeiro na tal reunião da comissão executiva na qual, admite, terá havido momentos de tensão. A frota tinha passado para o CFO e Gonçalo Pires pediu trabalhos diretamente ao procurement.

Já a decisão da presidente executiva de que Alexandra Reis deveria entregar a tutela da frota automóvel a Gonçalo Reis (que foi nomeado para o cargo em outubro de 2021, mas que antes já estava na TAP), foi pacífica, garantiu, ainda que assuma que não lhe fazia sentido migrar o procurement para as mãos do CFO.

Um outro tema que acabou por chegar à comissão de inquérito foi a alegada pretensão da CEO da TAP de despedir um motorista não vacinado, a mesma pessoa que tinha denunciado a alegada utilização de carros da empresa para motivos não profissionais da presidente e que acabou por se perceber que é também familiar do presidente de um dos sindicatos da TAP.

Alexandra Reis diz que CEO da TAP tentou despedir motorista não vacinado, o mesmo que denunciou uso pessoal do carro pela presidente

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