Frederico Pinheiro garante ter sido “ameaçado” pelo Serviço de Informações de Segurança (SIS) no processo de recuperação do computador que usava no Ministério das Infraestruturas. O ex-adjunto de João Galamba compromete assim a versão apresentada por Adélio Neiva da Cruz, diretor do SIS, que garantiu que nunca houve qualquer tipo de coerção na noite em que o aparelho foi recolhido.
Recorde-se que o SIS não dispõe “de competências policiais, estando os seus funcionários, civis ou militares proibidos de exercer poderes, praticar atos ou desenvolver atividades do âmbito ou competência específica dos tribunais ou das entidades com funções policiais, sendo-lhes expressamente proibido proceder à detenção de qualquer indivíduo ou instruir processos penais”. Ou seja, está-lhe vedado, entre outras coisas, qualquer ato de revista, busca ou apreensão.
Na comissão parlamentar de inquérito que ainda decorre, Frederico Pinheiro foi taxativo: “Fui ameaçado pelo SIS“. Ora, quando foi ouvido no Parlamento, à porta fechada, Adélio Nevia da Cruz assegurou que o computador foi recuperado sem recurso a qualquer tipo de meios coercivos — versão corroborada pela secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Graça Mira-Gomes, e pelo Conselho de Fiscalização das secretas, órgão presidido pela ex-ministra Constança Urbano de Sousa.
Tal como contava aqui o Observador, o agente do SIS que abordou Frederico Pinheiro por telefone terá dito que os serviços sabiam a informação que estava no computador e que queria resolver as coisas a bem; caso contrário, tudo se podia complicar — frase que pode ser interpretada como possivelmente ameaçadora ou coerciva. A ter acontecido esta ameaça, velada ou não, torna-se ainda mais complexo enquadrar legalmente a atuação do SIS neste processo.
Daí que as secretas — SIRP, SIS e Conselho de Fiscalização — tenham reiterado em vários momentos que nunca houve qualquer ameaça e que as secretas só atuaram numa lógica de prevenção de riscos, atendendo à existência de uma ameaça de divulgação de informação considerada classificada.
Também no Parlamento, Adélio Neiva da Cruz assumiu a responsabilidade da decisão e insistiu em dois pontos centrais: não havia indícios de crime (havendo tornaria injustificável, do ponto de vista legal, a atuação do SIS); e desconhecia-se o verdadeiro teor da informação guardada no computador de Frederico Pinheiro. Factos que não convenceram os deputados da oposição.
Agente do SIS terá dito que estava a ser “muito pressionado de cima”
Questionado por André Ventura, Frederico Pinheiro dá mais detalhes sobre o contacto com o SIS e os momentos que se seguiram. Depois de enviar um email ao CEGER – Centro de Gestão da Rede Informática do Governo a disponibilizar-se para entregar o computador, com conhecimento de João Galamba e a chefe de gabinete, Eugénia Correia, recebeu um telefonema às 23h05 de número desconhecido. Não atende a essa primeira tentativa de contacto. Às 23h11, um novo telefonema e, dessa vez, atende.
“O homem identifica-se como agente do SIS e diz que está a ligar por causa do PC e da informação que está lá dentro. A minha primeira reação é choque e incredulidade. Obviamente imaginei que pudesse ser mentira”, começou por relatar Frederico Pinheiro. “Proponho ligar à sede do SIS e dizer palavra código e ele ligava-me de volta com código. Sou contactado as 23h39 com palavra código. Nesse momento as minhas dúvidas já se tinham adensado sobre a legitimidade do SIS”, continuou.
“Tenho juristas na família que me estavam a alertar. Digo isso ao agente e [ele] refere que está a ser muito pressionado de cima, que sabe que há informação classificada e que é melhor resolver a bem se não tudo se pode complicar. Ameaça repetida duas vezes. Digo que sei perfeitamente o que está no computador, informação da TAP. O agente indica que se entregar nunca mais ouviria falar do mesmo”, sublinhou Frederico Pinheiro.
O relato do ex-adjunto continuou. “Confio [no agente], mas peço para entregar na presença de uma familiar, que é a procuradora-geral adjunta. Fica preocupado e diz que estou a escalar. Rejeita a solução. Diz que é melhor resolvermos entre os dois e que, se eu quisesse, podia acompanhá-lo até à sede do SIS e entregar lá. Peço cinco minutos para refletir. Falamos mais cinco minutos. Saio de casa sozinho, encontro na minha rua, volta a referir que assunto morre ali. Entrego [o computador] pela meia-noite.”
“No meu entendimento, a ativação dos meios do Estado PJ ou SIS foi desnecessária – já me tinha voluntariado a devolver os meios – desproporcionada e ineficaz porque se a preocupação era a documentos a preocupação seria ineficaz se tivesse intenção de os divulgar”, concluiu Frederico Pinheiro.