Não há coincidências. O dia 7 de junho, em que comemora o 64.º aniversário, foi a data escolhida por Mike Pence para oficializar a já antecipada candidatura à Casa Branca. Num comício em Des Moines, no estado de Iowa, o republicano anunciou que quer chegar à Casa Branca em 2024, numa campanha que o vai opor ao antigo aliado Donald Trump. No seu discurso de apresentação disse estar orgulhoso de ter estado ao lado de Trump durante a sua administração, mas não se deteve no tema. Já o Presidente Joe Biden foi o alvo escolhido para responsabilizar pelos problemas do país. As palavras mágicas chegaram pouco depois: “Há muito tempo que acredito que a quem muito é dado, muito será exigido. É por isso que hoje, diante de Deus e da minha família, anuncio que estou a concorrer à presidência dos Estados Unidos da América“.

Pence entrou em palco juntamente com a mulher, Karen, que numa curta apresentação destacou o percurso do marido ao serviço dos EUA e a família que sempre o tem apoiado. Quando passou a palavra ao candidato era esperado que dedicasse uma parte da sua intervenção a falar sobre os seus rivais, em particular Donald Trump, e o candidato não desapontou. “Eu percebo o porque de as pessoas fazerem grandes anúncios na cidade natal, nos seus resorts, no Twitter”, começou por dizer, numa alusão indireta à escolha de Trump em apresentar a sua candidatura na sua mansão em Mar-a-Lago e de Ron DeSantis, governador da Flórida, ter escolhido para o mesmo efeito o Twitter.

Mas esta não foi a única referência ao ex-Presidente norte-americano. Apesar de se ter mostrado orgulhoso do tempo em que juntos colaboraram para tornar “novamente a América grande”, Pence acusou o antigo aliado de ter pedido que escolhesse apoiá-lo em vez de defender a Constituição. “O dia 6 de janeiro foi trágico na história da nossa nação. Como disse várias vezes, as palavras do Presidente Trump foram irresponsáveis e colocaram-me a mim, à minha família e a todos no Capitólio em perigo. Mas os americanos também merecem saber que nesse dia o Presidente Trump exigiu que escolhesse entre ele e a Constituição. Agora os eleitores serão confrontados com a mesma escolha“, afirmou. “Eu escolhi a Constituição e vou fazê-lo sempre”, garantiu.

“Acredito que se coloca à frente da Constituição jamais deveria ser Presidente dos Estados Unidos. E alguém que tenha pedido a outra pessoa para o colocar acima da Constituição nunca deveria ser Presidente dos EUA”, sublinhou.

Depois de destacar alguns feitos da administração de Trump, por quem tem “rezado” nos últimos anos, Pence foi traçando um afastamento do antigo aliado dos verdadeiros princípios conservadores, nomeadamente na questão do aborto. “Quando Donald Trump concorreu à presidência em 2016, prometeu governar como conservador. Juntos, fizemos isso. Hoje, ele não faz essa promessa”, afirmou.

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O candidato à Casa Branca não foi mais contido nas críticas a Joe Biden, que responsabilizou pelas grandes “crises” nos EUA. “Sabemos que sob a presidência de Joe Biden a América se tornou uma nação com muitos problemas. A nossa economia está em perigo e a inflação atinge valores recorde. Os salários caíram e as nossas fronteiras estão abertas a imigrantes ilegais e drogas perigosas, como o fentanil, que está a matar a nossa juventude”, continuou Pence.

Uma candidatura exigida pelos “tempos diferentes”

Ao início da manhã, Pence já tinha divulgado o vídeo com que formalizava a candidatura à nomeação do Partido Republicano para as eleições presidenciais de 2024. O conservador apresentou-se com a mensagem “Tempos diferentes exigem lideranças diferentes”, garantindo que “os melhores dias da Maior Nação da Terra estão ainda por vir” e assegurando ter “fé de que Deus ainda não desistiu da América”.

Mike Pence divulga vídeo de candidatura à Casa Branca: “Tempos diferentes exigem lideranças diferentes”

A candidatura de Pence surge depois de ter passado meses a viajar por estados chave para apresentar o seu livro “So help me God” — num aparente teste à sua candidatura presidencial –, enquanto se apresentava como um “cristão, conservador e republicano, nessa ordem”. Nas recentes aparições públicas, o ex-governador do estado do Indiana tem sido claro no seu apoio à proibição do aborto a nível nacional, apesar da reação de contestação à anulação do processo Roe vs. Wade ter tornado alguns republicanos mais cautelosos sobre o assunto.

Para o comício desta quarta-feira Pence escolheu Iowa como palco, em vez de o estado natal, Indiana, onde chegou a serviu como governador. É esperado que o candidato à Casa Branca venha a passar muito tempo neste estado uma vez que, como refere o New York Times, é uma região onde a posição conservadora de linha dura em temas como o aborto pode ter adesão junto dos eleitores evangélicos.

Mike Pence, que entre 2016 e 2020 foi o número dois de Trump, é o mais recente candidato a umas primárias republicanas concorridas. Somam-se já dez concorrentes, depois de esta quarta-feira de manhã o governador de Dakota do Sul, Doug Burgum, se ter juntado ao leque de aspirantes a Presidente dos EUA. Na lista incluiu-se também Ron DeSantis, governador da Flórida, Nikkie Haley, a antiga governadora da Carolina do Sul, e Tim Scott, senador da Carolina do Sul.

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O candidato à Casa Branca foi um aliado próximo de Donald Trump, mas os acontecimentos depois da derrota nas eleições presidenciais de 2020 colocaram-nos em rota de colisão. Na altura Pence recusou o pedido do ex-Presidente para rejeitar a certificação dos resultados que deram a vitória a Joe Biden. Depois de a 6 de janeiro do ano seguinte manifestantes pró-Trump invadirem o Capitólio a gritar para que fosse enforcado, chegou a acusar o antigo aliado de o colocar e à sua família em risco. Mais tarde chegou a testemunhar sobre o episódio perante um conselho especial de investigação — a primeira vez na história moderna em que um vice-presidente foi compelido a testemunhar sobre um Presidente que serviu.