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Foi a última jovem que o Papa Francisco escutou esta quinta-feira de manhã na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa. Mahoor Kaffashian tem 25 anos, estuda Medicina Dentária em Viseu, e é “refugiada e deslocada inicialmente do seu próprio pais, Irão”, um país maioritariamente muçulmano e com uma minoria de católicos que rondará os 22 mil fiéis. Mahoor estudou na Ucrânia até 2022, quando uma “guerra real” que a fez sentir “uma sobrevivente” também a obrigou a fugir do país.
“Acima de tudo sou crente”, afirmou perante o líder da Igreja Católica. “Depois de ter ficado sem teto, universidade e dinheiro, sei que o conceito de força não significa que não me sinta cansada, exausta e abatida pela dor e pela perda. Significa apenas que tenho a força, fé e coragem de seguir em frente.”
Mahoor Kaffashian disse sentir-se “orgulhosa” de estar em Portugal, “num novo recomeço neste país tão belo e acolhedor”. “Não há palavras para descrever os meus sentimentos neste momento, mas tenho a sorte de estar aqui, a falar a Vossa Santidade com orgulho do passado, acreditando que melhores dias virão.”
A iraniana é estudante de Medicina Dentária na Faculdade de Medicina Dentária da Universidade Católica Portuguesa, em Viseu, ao abrigo do Fundo Social Papa Francisco, desde setembro de 2022.
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▲ Mahoor Kaffashian discursou perante as 6500 que estavam no campus da Universidade Católica Portuguesa em Lisboa
TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
“Ser uma mulher no Irão não é coisa fácil”
Filha única, Mahoor Kaffashian deixou os pais e o país com 18 anos. “Ser uma mulher no Irão não é coisa fácil. Sempre tive conflitos com o ambiente no Irão”, descreveu à agência Ecclesia. “Talvez pela minha família, talvez pelo tipo de família que tinha, eu queria ser quem sou realmente. E isso é difícil no Irão: sermos realmente nós mesmos.”
“Para ter o futuro que eu queria, tinha de sair.” E saiu: em 2018 foi para Kiev, Ucrânia, onde estudou durante quatro anos, até ao dia em que a Rússia invadiu o território ucraniano.
Fugimos com uma mala, apenas com comida seca, um relógio que a minha avó me deu e um gato. Um amigo foi apanhar-nos num carro e, nas primeiras horas, a nossa ideia não era deixar o país. Porque, na verdade, achávamos que o exército da Ucrânia não conseguiria resistir muito tempo.”
Mahoor e a família acreditavam que as forças russas tomariam a Ucrânia e que o conflito nunca chegaria a escalar para uma guerra total. “Mas, depois de 10 horas, ouvimos as sirenes e o som das bombas e pensámos que seria a hora de sair, permanecendo na fronteira. Apanhámos tudo o que pudemos e deixámos a Ucrânia”, relatou ao mesmo meio.
“Refugiado é a minha condição, não aquilo que sou”
O convite da Universidade Católica para que desse o seu testemunho diante do pontífice durante a Jornada Mundial da Juventude, que acontece até domingo, deixou Mahoor Kaffashian surpreendida. “Apesar de tudo o que passei, nunca me senti completamente orgulhosa de mim própria, mas devo dizer que este convite me fez sentir orgulho”, disse também à agência Ecclesia.
“Este encontro possibilita isso também – perceber como a minha história pode impactar outros que vão ouvir e poderão ajudar, dar mais atenção à situação dos refugiados, não apenas a minha, mas a todos que sofrem por não estar com a sua família por causa da cultura de um país –, espero que isso possa impactar quem pode fazer a diferença.”
A jovem iraniana quer terminar os estudos e construir a sua vida, recusando a palavra “refugiada” como definição única da sua identidade. “Refugiado é a minha condição, não aquilo que sou”, sublinha ao mesmo meio.
“Para mim, ser refugiado significa que não tenho permissão para sair de Portugal e visitar a minha família no Irão. E não vai ser tão cedo porque, quer dizer, como posso pedir documentos se o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras não colabora connosco?”, questiona. “Para mim, ser refugiado é daqui a dois anos ir defender a minha tese e os meus pais não poderem estar sentados ao meu lado. Para mim, ser refugiada é todas as vezes que sou questionada por não ser uma ucraniana que escapou da guerra, mas uma iraniana, que tem o seu próprio governo.”