Na véspera de rebentar a crise política, o Parlamento ouviu o ministro da Economia, António Costa Silva, sobre a alienação da Efacec ao grupo alemão Mutares, e antecipava-se o apoio dos partidos à direita à criação de uma comissão parlamentar de inquérito à operação que foi apresentada no feriado de 1 de novembro.

Com a dissolução da Assembleia da República — acompanhada do desvio das atenções para os negócios que estão sob a investigação do Ministério Público — já não existem condições na atual legislatura para avançar com uma comissão parlamentar de inquérito à venda da Efacec. Mas a alienação da empresa industrial que foi nacionalizada em 2020 deverá ser abrangida pela auditoria que o Tribunal de Contas está a realizar à nacionalização da Efacec, em resposta a um pedido feito pelo Parlamento há quase um ano.

Quando esta auditoria foi inicialmente pedida não se conheciam os termos da operação de venda da Efacec que irá implicar ainda um esforço financeiro público adicional de cerca de 160 milhões de euros, além do dinheiro que será emprestado pelo Banco de Fomento. Considerando estes valores e as injeções realizadas nos últimos dois anos para manter a tesouraria da empresa, a nacionalização e venda da Efacec terão custado cerca de 400 milhões de euros em fundos públicos. Isto porque o Estado foi metendo 200 milhões de euros, sob a forma de suprimentos, para manter a empresa à tona de água e para a Efacec ter fundo de maneio para as operações. E agora na venda ainda colocou, em termos líquidos, mais 160 milhões, a que acrescem 35 milhões de empréstimo do Banco de Fomento. A Mutares ficou com a totalidade da Efacec e pagará ao Estado na venda da companhia ou se distribuir dividendos. Na nacionalização de 2020, o Estado não teve de pagar qualquer indemnização à anterior acionista, Isabel dos Santos, porque a situação líquida da empresa era negativa.

Estado sai da Efacec, Mutares entra numa empresa “sem espinhas”. A que preço?

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em resposta ao Observador, o Tribunal de Contas indica que o plano global de auditoria à gestão pública da empresa que foi pedida pelo Parlamento foi aprovada apenas no final de outubro de 2023 no plenário deste órgão de controlo interno. Ou seja, a poucos dias de se concretizar a venda ao grupo Mutares. Questionado sobre se o referido exercício vai incluir os fundamentos desta transação, fonte oficial do Tribunal de Contas reconhece que o plano inicial para os trabalhos foi aprovado sem contemplar a venda, mas acrescenta que agora a sua inclusão, no quadro desta auditoria, será “ponderada”.

Para explicar o tempo que levou a aprovação do plano interno para a auditoria à Efacec, o órgão presidido por José Tavares explica que o pedido do Parlamento foi apreciado pelo Tribunal em janeiro deste ano, tendo-se iniciado logo os trabalhos que envolveram alterações ao programa de fiscalização aprovado um mês antes, bem como das equipas de auditoria. Foram ainda conduzidos estudos preliminares sobre o objeto a auditar “que permitem a elaboração do plano global de auditoria, com pormenorização dos aspetos que devem ser confirmados posteriormente”. É neste contexto que foram feitas as declarações do presidente do Tribunal de Contas quando em janeiro José Tavares disse aos deputados que a referida auditoria já estava em marcha.

Acrescenta o Tribunal que a aprovação do plano global de auditoria é já uma fase avançada do referido trabalho.

Além da Efacec, o Tribunal de Contas tem em curso uma auditoria à TAP que deverá estar concluída no próximo ano e na qual serão avaliados vários factos e suspeitas suscitadas durante a comissão parlamentar de inquérito, desde o impacto dos Fundos Airbus para a companhia até à assunção pelo Estado de 100% da empresa na sequência da compra em 2020 da posição de David Neeleman.

Fundos Airbus. Tribunal de Contas não viu riscos relevantes em 2017, mas vai insistir em nova auditoria à TAP

Até ao final do ano, e já com atraso em relação ao calendário indicativo dado em janeiro, deverá ficar finalizada a auditoria à privatização da ANA (Aeroportos de Portugal) de 2012/13, processo que, fruto de várias vicissitudes, tem vindo a sofrer demoras significativas. Um dos argumentos invocados pelo Tribunal é o da existência de pedidos de auditoria com prioridade vindos da Assembleia da República, nomeadamente sobre o Novo Banco.

De maior receita das privatizações a “péssimo negócio para o Estado”. Como a venda da ANA escapou ao Tribunal de Contas até agora