Uma empresa de origem portuguesa criou um “bacalhau Made In Angola”, usando peixe seco salgado da mesma família do legítimo, para ajudar os angolanos a contornar a crise e desfrutar da tradicional ceia de Consoada, gastando um pouco menos.

Apesar de não se tratar da espécie Gadus Morhua, conhecida pelo nome comercial de bacalhau, e sim de abrótea (Phycis Phycis), o promotor do projeto, o português António Cartaxo, batizou o produto como bacalhau angolano e assim pretende mantê-lo.

António Cartaxo, administrador e proprietário da Atlântico Foods, empresa sediada em Viana (Luanda), que criou em 2016, garante que nada está a ser escondido dos consumidores, porque na ficha técnica do produto consta o nome científico. “Como em Portugal o adotaram como bacalhau e não lhe meteram português, nós aqui somos muito patriotas e então metemos bacalhau angolano”, brincou o empresário.

O mentor do projeto, iniciado este ano, disse que a ideia surgiu do desafio de criar um “produto de excelência” no país, indo ao encontro da cultura do consumo de bacalhau que já está implantada no país, oriunda de Portugal.

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Segundo António Cartaxo, cidadão português residente em Angola há várias décadas, os angolanos não são ainda grandes consumidores de bacalhau, “mas já começa a haver o hábito e nomeadamente nas quadras festivas”.

Além disso, “existem muitos eventos durante o ano onde se confeciona o bacalhau. Como dizem os portugueses, o bacalhau tem 1001 formas de ser confecionado e começa já a enquadrar-se muito na cultura nacional”, referiu. A empresa, com 70 funcionários angolanos, tem já 23 toneladas produzidas, o correspondente a cerca de mês e meio de produção. O processo de secagem, natural, limita ainda a produção, mas António Cartaxo mostra-se confiante em relação ao futuro.

Com um investimento inicial em torno dos 50 milhões de kwanzas (56 mil euros), a empresa prepara-se para investir, no primeiro trimestre de 2024, um valor de 250 milhões de kwanzas (279.000 euros) a 300 milhões de kwanzas (335.000 euros) para produzir à escala nacional, perspetivando chegar então aos 100 trabalhadores.

O peixe com origem 100% nacional é pescado na costa angolana, nas zonas do Soyo (província do Zaire) ou Tômbua (província do Namibe), e adquirido a pescadores artesanais ou em parceria com embarcações industriais.

O processo começa pela aquisição de algum pescado fresco e maioritariamente congelado em navios em alto-mar, passando logo à chegada às instalações, localizadas no Polo Industrial de Viana, por uma seleção dos peixes por calibres, explicou o empresário.

“Temos o peixe corrente e o crescido, à posteriori fazemos a escala (…), depois a salga e a seca. No final da secagem é que definimos o calibre do produto, mas o processo é idêntico, igual mesmo, àquilo que se faz com o bacalhau importado”, acrescentou.

O que distingue o “bacalhau Made In Angola” do bacalhau legítimo é a espécie, aclarou António Cartaxo, apontando diferenças no rabo do pescado nacional, a abrótea, bem como a sua espinha ligeiramente mais saliente.

“A família do peixe é a mesma, são gadiformes, depois temos várias espécies, a nossa é similar ao legítimo bacalhau. Tem ligeiras diferenças, a única que se nota mais é no tamanho, este é muito mais pequeno, não conseguimos atingir bacalhaus muito grandes, graúdos e extras, conseguimos fazer um bacalhau crescido e corrente”, disse.

O administrador e proprietário da Atlântico Foods disse à Lusa que os portugueses que consumiram o ‘bacalhau’ angolano “ficaram agradados” e “surpreendidos com a qualidade do produto”. Alguns solicitaram o produto para o levar para o Natal para Portugal, atitude que o deixou “lisonjeado”.

“Pensamos num futuro próximo poder abrir os nossos horizontes para outros países, pensar numa exportação e levar o nome de Angola além-fronteiras”, referiu, adiantando que toda a produção está já vendida.

António Cartaxo garantiu que em termos de sabor e textura, o ‘bacalhau’ angolano “é em tudo similar ao importado”, salientando como vantagem a vertente económica, porque o produto acaba por ser mais económico.

“O ‘bacalhau’, neste momento, nas grandes superfícies ronda entre os 9.000 kwanzas (dez euros) e os 10.000 kwanzas (11 euros) o quilo, entre o crescido e o corrente”, disse, considerando que os angolanos têm a oportunidade de ter uma segunda escolha, um “produto nacional, feito em Angola”.

Já os preços do bacalhau importado, os preços variam entre os cerca de 11.000 kwanzas (12 euros) o quilo para o bacalhau miúdo e os 18.000 kwanzas (20 euros) para o quilo do bacalhau especial, o mais caro.

Nesta fase inicial, adiantou o responsável da Atlântico Foods, foi criada uma parceria com uma grande superfície para comercialização do produto, mas está abrir portas a outros parceiros, designadamente restauração e hotelaria.