O Presidente da República considerou esta sexta-feira que na Europa os partidos clássicos estão “à defesa” perante a direita radical, sem desmontar os seus argumentos, e ocupados mais a discutir “gestão do poder” do que “projetos de futuro”.

Marcelo Rebelo de Sousa falava em conversa com o jornalista Paulo Baldaia, numa edição especial do programa “Expresso da Manhã”, transmitida em direto a partir da Reitoria da Universidade Nova de Lisboa, no âmbito das comemorações dos 50 anos do Expresso.

Durante esta conversa, que durou cerca de meia hora, o chefe de Estado começou por ser questionado sobre um eventual regresso de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos da América e respondeu que isso seria “uma boa notícia para a Federação Russa e para o Presidente Putin” e “um teste à força efetiva do sistema político americano”.

Segundo o Presidente da República, a relação de Trump com a União Europeia foi de “confronto político” e “a fragilidade dos sistemas políticos europeus” também “tem muito a ver com o trumpismo”.

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Na Europa, identificou nas forças de direita mais radical “uma convergência objetiva com a Federação Russa, que vem desde o tempo em que a senhora Le Pen foi agradecer ao senhor Putin o apoio numa eleição presidencial”, porque “há convergências objetivas, táticas, que o trumpismo alimentou”.

Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou que “isto tem um efeito muito desgastante em relação aos sistemas políticos europeus”, em muitos dos quais a “emergência de radicalismos” ditou o fim dos dois polos alternativos, de centro-direita e centro-esquerda, criando “situações de tripolarização, ou de quatro polos”.

No seu entender, a resposta dos partidos clássicos e mais moderados à emergência da direita radical tem sido “criar coligações negativas, mas é à defesa”.

“Porque é fácil criar narrativas em torno de um tema ou dois temas ou três temas com os clássicos partidos europeus à defesa, sistematicamente à defesa, ou a discutir a repartição do poder ou a discutir a gestão do poder, mas não projetos de futuro“, observou.

Referindo-se ao tema das migrações, o chefe de Estado defendeu que é preciso “desmontar os argumentos, que não são reais”, da direita radical, considerando que Portugal “não é exceção” nesta matéria.

“Dizer-se que em determinadas sociedades há o crescimento da muçulmanização não é verdade. Não é verdade. O maior número de emigrantes vem de outras áreas geográficas completamente diferentes, como a Latino América. Não é verdade, mas passa como verdade”, declarou, contestando igualmente que se deixe passar “a ideia de que isto afeta o mercado de emprego”.

O Presidente da República lamentou que que essa seja “a narrativa que passa” e manifestou a expectativa de que as forças políticas a favor do projeto europeu coloquem o tema das migrações em cima da mesa num ano em que há eleições para o Parlamento Europeu, “a menos que o debate se traduza na ausência de temas, e na ausência de temas relevantes fundamentais para o futuro”.

“Um dia descobrimos que se está em cima das eleições europeias, ou se está em cima de qualquer eleição, e temas fundamentais não foram debatidos. E isso não é bom”, advertiu.

Em tom de aviso, Marcelo Rebelo de Sousa disse que “os vazios e os atrasos têm um preço enorme, porque para os partidos de contestação basta contestar, ninguém lhes pede que venham apresentar soluções”.

“Eles pegam em todas as questões que são de contestação, da direita à esquerda, económicas, financeiras, laborais, de segurança, e transformam numa expressão antissistémica, depois assistémica, e depois condicionando o sistema, e depois conquistando votos para intervir no sistema e chegar ao Governo — como aconteceu nos Países Baixos ou na Suécia”, acrescentou.

A propósito do caso de França, questionou quando é que chegará o momento da “normalização daquilo que foi criado como uma forma de dividir a direita clássica”.

Ainda sobre a possibilidade de Trump voltar a ser Presidente dos Estados Unidos da América, Marcelo Rebelo de Sousa realçou que durante o seu anterior mandato presidencial “a Rússia deixou de ser o adversário principal da NATO e “a NATO andou a discutir a forma de financiamento”.

“Recordemos que o Presidente Trump representou protecionismo, isolacionismo, antimultilateralismo, ant organizações internacionais, anti Nações Unidas, anti Acordo de Paris, anti prioridade das alterações climáticas, anti todas as questões fundamentais, das migrações aos problemas de desenvolvimento sustentável. Foi a sua posição sistemática”, apontou, antevendo que, “ganhando, não vai mudar, vai repetir”.