“Isto é o dia 1 e é para ganhar.” Ainda o púlpito estava a ser montado e os detalhes para a apresentação do manifesto “Unidos pelo Liberalismo” ultimados e já a fasquia ia sendo colocada alta. A provocação para que Tiago Mayan Gonçalves sorrisse para a fotografia é reflexo da ambição que supera as letras do documento e que o ex-candidato a Belém acabou por assumir ao fim de muita insistência dos jornalistas:  “Estarei pronto para liderar uma candidatura à liderança.”

O timing de apresentação do manifesto, a três meses de uma convenção estatutária e a pelo menos quatro meses de uma convenção eletiva, é justificado com uma preocupação com o “estado atual do partido” e porque os mais de 200 membros, nas palavras de Mayan, “não desistem” da IL. “Sem deixar de respeitar os períodos eleitorais que se aproximam, as eleições regionais da Madeira e Europeias, consideramos que é necessário a mudança e propomos o caminho para essa mudança”, explicou, antecipando que, mais do que isso, “este movimento de membros da IL vai estar pronto para apresentar uma alternativa à liderança do partido”.

Questionado sobre uma candidatura encabeçada pelo próprio — tendo em conta que foi o único a falar e com vários liberais subscritores do movimento nas costas —, foi-se desdobrando em justificações para dizer que isso depende da equipa e que o importante é a “visão” e a “estratégia” para o futuro. Porém, perante uma grande insistência dos jornalistas, lá foi assumindo: “Se estou aqui perante vocês é porque estarei pronto para assumir todas as consequências do que está aqui manifestado.” O calendário é fundamental para a decisão e assumiu: “Quando estiver no período eleitoral estarei pronto para, se necessário e tendo a equipa para o fazer, liderar uma candidatura à liderança.”

Mais do que isso, falou em “refundar o partido em valores e princípios liberais” que considera ter-se perdido, desde logo através de uma tentativa de “capacitar o Conselho Nacional”, “recuperar e reforçar a autonomia dos núcleos”, “envolver sociedade civil e privilegiar o valor dos membros”.

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Para que tal aconteça, Tiago Mayan Gonçalves destacou um dos pontos do manifesto que tem como intuito “agregar todos os membros e aproveitar o valor acumulado” para argumentar que é também preciso o “regresso” de pessoas que deixaram o partido em rutura com a direção — um das preocupações da oposição interna, tendo em conta que algumas das pessoas que podiam alimentar este movimento acabaram por deixar a IL nos últimos meses. Exemplos disso são os ex-candidatos à liderança Carla Castro e José Cardoso.

Aos olhos do fundador do partido, a IL tem sido “incapaz de agregar e reter valor” e questionado diretamente sobre o caso de Carla Castro, Mayan Gonçalves garantiu que apesar de não ter falado com Carla Castro sobre a apresentação deste movimento, a ex-deputada foi um “ativo essencial” e “foi uma pena perder-se” — “Espero que sim, que com esta visão, se sinta de novo atraída a voltar ao partido. Da minha parte será bem-vinda.”

O grupo de membros onde estão reunidos alguns dos nomes que foram sendo mais críticos da oposição tem, segundo Mayan Gonçalves, é unido por um “objetivo comum: oferecer uma alternativa capaz de restabelecer na estrutura e na cultura os princípios liberais que estiveram na sua génese”. Com a ambição de um “partido único, unido, liberal, aberto, ambicioso e ativo focado na procura de soluções e apoiado na ação através do mérito, do conhecimento, da competência e da iniciativa pessoal”, o movimento pretende desde já apresentar “mudanças estatutárias” — que chegaram a estar previstas numa convenção que acabou adiada para julho.

No manifesto, os desalinhados com a corrente da liderança referem que “a estratégia desenvolvida pela atual direção do partido tem consecutivamente falhado em atingir os objetivos” eleitorais — Madeira, Açores e legislativas — e acusam a equipa de Rui Rocha de se ter vindo “continuamente a afastar dos princípios liberais que defendemos, seja na forma de agregar valor, seja na promoção de uma cultura de abertura aos membros e à sociedade civil, seja no foco da sua comunicação, seja no relacionamento com as demais estruturas internas nacionais e locais”.

Depois de uma primeira tentativa de união com uma proposta de alteração de estatutos, Tiago Mayan Gonçalves dá a cara por um novo movimento que tem como último fundamento a apresentação de uma alternativa à liderança do partido e que conta também com o ex-presidente da IL Miguel Ferreira da Silva. A menos de um ano de uma nova convenção eletiva, a oposição interna prepara-se para voltar a ter uma candidatura alternativa à da corrente da liderança e, desta vez sem Carla Castro, o ex-candidato a Belém é o nome mais bem posicionado para lá chegar.