O conselho de administração da Aicep foi nomeado esta segunda-feira através de resolução do Conselho de Ministros (CM). A resolução, assinada pelo primeiro-ministro, diz que foi solicitada a avaliação à Comissão de Recrutamento e Seleção para o Administração Pública (Cresap), nos termos do estatuto do gestor público.

O estatuto indica que a proposta de nomeação dos gestores “deve ser acompanhada de avaliação, não vinculativa, de currículo e de adequação de competências ao cargo de gestor público a que respeita a proposta de designação” realizada pela Cresap. No caso da agência para o investimento, a nomeação é feita sem o referido parecer, ainda que fique salvaguardado que os novos membros não podem iniciar funções até que esse parecer seja produzido, o que veio a acontecer esta quinta-feira já depois deste artigo publicado.

CRESAP considera “adequado” perfil dos membros da administração da AICEP já nomeados

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O parecer da Cresap não é vinculativo, no sentido em que o Governo pode nomear uma pessoa que não receba o selo de adequado, mas a lei determina que este tem de existir quando é feita uma nomeação de um gestor público. O artigo 13.º do estatuto do gestor público, citado na resolução que nomeia os novos gestores da Aicep, prevê que a nomeação é feita mediante resolução do Conselho de Ministros, devidamente fundamentada, e sob proposta dos membros do Governo responsáveis pela área das finanças e do setor de atividade da empresa. E essa proposta “deve ser acompanhada da avaliação da Cresap”. O que não aconteceu.

Nomeação sem parecer não é ilegal, mas é “estranha” diz antigo presidente da Cresap

Ao Observador, o ex-presidente da Cresap (entre 2012 e 2016), João Bilhim, defende que a opção do Governo, embora não seja ilegal, é “estranha” e coloca em causa o trabalho daquela entidade, que foi criada para garantir maior transparência no processo de nomeação de altos dirigentes e gestores públicos. No seu entendimento, para que a prática fosse ilegal, o estatuto de gestor público tinha de prever que a nomeação seria considerada nula caso não se verificasse a condição de o parecer da Cresap acompanhar a nomeação.

“É estranho na medida em que não é frequente serem nomeados antes do parecer da Cresap. Não há ilegalidade, uma vez que o parecer até é não vinculativo”, afirma João Bilhim, em declarações ao Observador. Mas “uma coisa é certa: quando os governos contrariam o parecer da Cresap precisam de fundamentar” a decisão, acrescenta.

Da sua experiência, não se recorda de outro caso igual — o mais próximo que encontra foi o anúncio da nomeação de Miguel Frasquilho também para a presidência da Aicep, em 2014, feito pelo governo de Pedro Passos Coelho antes do parecer da Cresap. A nomeação formal, porém — e ao contrário do que aconteceu agora — só ocorreu após conhecido o parecer. Na altura, Bilhim contestou esse anúncio.

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Questionado sobre o cumprimento deste requisito, fonte oficial do Ministério da Economia que tem a tutela setorial da agência para o investimentos respondeu: “O Governo entende que a nomeação dos novos membros do conselho de administração da AICEP cumpre as regras legais de recrutamento dos gestores públicos”. Isto porque, a “resolução do Conselho de Ministros estabelece que a nova administração da Agência só entrará em funções após o parecer da Cresap, apesar de este não ser vinculativo. O Governo solicitou prioridade na avaliação dos nomes à Cresap”.

Apesar de não ter parecer, a resolução de Conselho de Ministros que nomeia Ricardo Arroja, Madalena Oliveira e Silva, Joana Gaspar, Francisco Catalão e Paulo Rios de Oliveira não poupa nas qualidades dos novos gestores que irão fazer um mandato até 2026 e “cuja idoneidade, competência técnica, aptidão, experiência profissional e formação para o adequado exercício das respetivas funções são evidenciadas nas respetivas notas curriculares, que constam do anexo à presente resolução e da qual fazem parte integrante”.

Administração da Aicep demitida por conveniência

Por outro lado, a resolução de nomeação do conselho de administração liderada por Ricardo Arroja tem um alcance mais vasto. Aprova também uma dissolução da anterior administração da Aicep, com o respetivo fundamento, e estabelece já uma espécie de caderno de encargos para a nova equipa: “a revisão dos estatutos da Aicep e a definição de um novo modelo de financiamento para dar sustentabilidade, estabilidade e previsibilidade à gestão da agência, bem como assegurar os recursos necessários à reorganização e reforço da sua rede externa e do regime contratual de investimento.”

Apesar da Aicep ser da tutela do Ministério da Economia também é omissa qualquer referência a uma proposta de nomeação por parte de Pedro Reis ou do ministro das Finanças, sendo apenas indicado que toda a decisão — desde a dissolução do anterior conselho até aos nomes do novo — pertence ao Conselho de Ministros presidido por Luís Montenegro que é o único a assinar. Ainda que delegue no ministro da Economia as “competências que lhe são conferidas pela lei no que respeita à designação dos vogais não executivos do conselho de administração da AICEP, E. P. E., nos termos do n.º 2 do artigo 15.º dos Estatutos da AICEP, E. P. E., sem prejuízo do cumprimento das regras relativas aos respetivos procedimentos de seleção ou nomeação e de demissão.”

Recuando à anterior nomeação da Aicep feita pelo Governo socialista, verificamos que a mesma foi feita através de despacho assinado pelo ministro da Economia, António Costa Silva, pelo secretário de Estado de Internacionalização, Bernardo Ivo Cruz, e pelo secretário de Estado do Tesouro. Esta nomeação foi acompanhada do parecer favorável da Cresap.