História
É para a estação quente que somos transportados quando o vemos ao longe: alto e escondido por chapéus de sol pintados a verde escuro contornado a branco, o terraço do Corleone parece saído de um dia de férias, daquelas passadas no sul, junto à praia. Esta podia ser qualquer uma das que compõem a Costa Amalfitana, não fosse ser essa a inspiração deste Ristorante al Mare, mas, falamos da praia da Ribeira, na Baía de Cascais.
Foi aqui que Miguel Garcia viu a oportunidade de trazer o sul de Itália até Portugal. Numa casa centenária, antiga residência aristocrática do século XIX, que dá também lugar ao Villa Cascais Boutique Hotel, o Corleone Ristorante al Mare nasceu para ser um “italiano italiano”, descreve o empreendedor, que, afirma convicto, faltava nesta vila plantada à beira mar. “Há muitos restaurantes que dizem que são italianos. Têm carpaccio, pizza ou carbonara. Tudo bem, é inspiração italiana. Aqui não. Seguimos à risca a tradição”, defende, antes de se aventurar pelo menu, onde já iremos.
Antes, é preciso perguntar: porquê Itália? A resposta está em Rodolfo de Santis, o chef italiano natural de Puglia que Miguel Garcia conheceu há 22 anos, quando vivia e trabalhava na Suíça. “Trabalhámos juntos no restaurante Il Lago, que fica no Four Seasons Hotel Des Bergues, em Genebra. Depois, o Rodolfo sai de Genebra e vai para o Brasil. Eu venho para Lisboa. Voltámos depois a encontrar-nos no Brasil, onde eu vivi 10 anos”, conta Miguel. “O Rodolfo vai para São Paulo, abre o primeiro restaurante, abre o segundo, isto em 2016, e vira um fenómeno no Brasil”, explica, referindo-se ao Nino Cucina, que fez de Rodolfo um dos chefs italianos mais conhecidos daquele país da América do Sul.
Em 2022, quatro anos depois de voltar para Portugal, Miguel adquire ambas as localizações do Café de São Bento e, um ano depois, abre o Bougain Restaurant & Garden Bar, irmão mais velho do Corleone, também ele em Cascais. “Quando resolvo fazer este restaurante, tem de ser o Rodolfo”. E assim foi. Rodolfo de Santis aceitou o desafio e assinou a carta do Corleone, que se apresenta como la vera cucina italiana. Sob a sua consultoria, esta está nas mãos do chef Victor Vieira.
Espaço
Dentro ou fora? Difícil de responder. Plantado à beira mar, o Corleone é composto por dois espaços que dialogam entre si, numa sintonia de cor, frescura e luz. Cá fora, sentamo-nos para almoçar com o mar a fazer-nos companhia e o sol a querer esgueirar-se pelo chapéus que cobrem este terraço, sem nunca impedirem a iluminação de passar. Nas mesas, vestidas de branco, descansam loiças da Vista Alegre e vasos Testa di Moro, que tanto cumprem o seu propósito — com pequenas plantas a encher o seu interior — ou são utilizados como copos.
“São vasos feitos por um artesão em Sicilia. A Teste di Moro é a história de uma siciliana e de um mouro do Norte de África que se apaixonam. O jovem comerciante estava de passagem por Palermo e eventualmente teria de voltar para casa, onde a sua mulher e filhos o esperavam. E há um dia em que ela descobre que ele a traía. A siciliana recebe-o e não faz mais nada, só cortar a cabeça dele. E põe a cabeça na varanda de casa, com uma planta de flores em cima”, conta Miguel, acrescentando: “No fundo, a mostrar à região onde ela vivia o que é que ela fazia a quem a traísse. E está aí a Teste di Moro.”
Não só no terraço, também cá dentro estes vasos decoram as mesas, que imitam as lá de fora. De toalha branca, todas têm vista para o mar, assegura Miguel. E é a este mar que as paredes vão buscar o tom, num azul mais escuro que serve de base para os quadros de inspiração italiana que decoram o espaço. Já a meio da principal sala, o limoeiro, num vaso terracota, estica-se até ao teto e contagia a tela branca com os desenhos de folhas e de limões que, como ramos, se espalham até ao bar. “Um bocadinho como o Bougain, o Corleone também tem os seus recantos”, afirma o dono do restaurante, referindo-se a três espaços mais reservados e igualmente decorados, mas com uma diferença: as paredes são revestidas com azulejos da Viúva Lamego.
“Nós pegámos pelo sul de Itália. Fomos buscar várias referências de Costa Amalfitana, de Sicília. Ambientes, no fundo, de restaurantes positanos, em cima do mar. Restaurantes al fresco, as cores, tudo. E chegámos aqui”, conclui Miguel.
Comida
Se pelo espaço e pelo nome — que remete para a comuna italiana — não fosse claro que o Corleone é um restaurante italiano, a comida tira todas as dúvidas. Com os limões aqui também a marcarem presença, esteticamente, o menu do novo restaurante da Baía de Cascais é curto e direto: antipasti, primi, secondi e dolci. A começar, num vaso Testa di Moro, chega o cocktail basilico al limone (13€), que introduz os sabores de Itália com o Limoncello, acompanhado por Gin Beefeater, limão e espuma de manjericão. Também esta carta, aqui pensada pelo chefe de bar Manuel Frazão, é baseada em produtos tipicamente italianos.
Na carta principal, estes surgem logo de início nos antipasti com o vitello tonnato (16€) a tomar conta da mesa. Com alcaparras fritas, estas finas fatias de vitela quase crua são escondidas pelo molho de atum e a salada frisé antes de serem substituídas pelo crudo di Tonno (17€), que se apresenta em fatias de atum cru com creme mascarpone, gema de ovo curada e alcachofra. Por fim, antes de os primi chegarem, é a vez do arancini (12€) brilhar. Bem redondinhas, estas bolinhas de risoto crocante invadem o paladar com o sabor do tomate e da mozzarella.
Vamos às pastas. Todas clássicas, diz-nos Miguel, a maioria é feitas com massas grano duro enquanto que quatro das opções são pasta fresca, feita diariamente na casa: a Cavatelli all’Arrabiata (26€), “no fundo é um gnocchi penteado” que é servido com o molho tomate all’Arrabiata, levemente picante, com polvo e tutano; o Tortellini (22€), recheado com vitela, manteiga e sálvia, servido com ragu de cogumelos porcini; o Gnocchi alla Fontina (20€) com molho rosé de tomate San Marzano e queijo Fontina; e o Taglioni que, fugido dos secondi, acompanha o Polpettone (27€), um rolo de carne clássico com molho rosé.
Quanto às grano duro, não faltam a La Carbonara (22€), a Linguine al Pesto (22€), a Cacio e Pepe (20€), que pode vir decorada com lascas de trufa preta, a Amatriciana (22€) e o Spaghetti alle Vongole (26€), com amêijoas, alho, azeite e butarga ralada. Nos secondi, há ainda pratos de peixe e carne com Miguel a dar destaque ao Ossobuco di Vitello (28€), acompanhado de risoto de açafrão, e o Polpo ai Ferri (28€), servido com beringela assada.
Há tiramisù? Nem se pergunta. O típico dolci vem terminar esta experiência italiana com os sabores do café e do cacau a predominarem e a cremosidade do mascarpone a acompanhar os biscoitos savoiardi. A partilhar esta secção bem doce estão mais clássicos, que vão chegando um a um a este início de tarde com cheiro a verão. Bem branquinha, e antes de ser regada com molho de morango “puro”, como descreve o dono, a Meringata ai Frutti di Bosco (13€) esconde dentro deste suspiro italiano crocante uma mousse de chocolate branco com limão que vem cortar o doce do seguinte e último prato: os Profiteroles (12€). Redondinhos e fresquinhos são também eles regados mas, desta vez, com uma calda de cacau que amolesse a massa choux com craquelin que abraça o gelado de nata.