A empresária Daniela Martins, mãe das gémeas luso-brasileiras tratadas com Zolgensma, e a ex-ministra da Justiça Catarina Sarmento e Castro vão ser as próximas a serem ouvidas na Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso da administração irregular do medicamento às duas crianças, nos dias 21 e 25 de junho, respetivamente, disse ao Observador o presidente da comissão de inquérito, Rui Paulo Sousa.
Depois de, inicialmente, Rui Paulo Sousa ter admitido que a a audição da mãe das gémeas, que se encontra a viver em São Paulo, seria feita “em princípio, por videoconferência”, esta quarta-feira o presidente da CPI anunciou que Daniela Martins vem para Portugal para ser ouvida pelos deputados, sendo que todas as viagens serão pagas pela Assembleia da República.
Está, assim, ultrapassado a resistência inicial da mãe das gémeas que fez saber, através do advogado, que preferia ser ouvida à distância para não prejudicar o acompanhamento das filhas — uma vez que é “a única cuidadora das crianças”. A audição será na próxima sexta-feira, às 14 horas.
Já no dia 25, à mesma hora, é a vez de a ex-ministra da Justiça Catarina Sarmento e Castro depor perante os deputados acerca da atribuição da nacionalidade portuguesa às duas crianças, um processo concluído em apenas 14 dias, como revelou o Observador. O pedido de nacionalidade deu entrada no Consulado Geral de Portugal em São Paulo no início de setembro de 2019 e duas semanas depois estava finalizado — um prazo muito inferior à demora média dos processos tramitados pela representação consultar de Portugal naquele estado brasileiro.
Embora, à data, a ministra da Justiça em funções (com tutela sobre o Instituto dos Registos e Notariado, a entidade pública que atribui a nacionalidade) fosse Francisca Vanem Dunem, é Catarina Sarmento e Castro quem vai prestar declarações, uma vez que a também ex-ministra pediu informação ao IRN, antes de ir ao Parlamento, em janeiro, falar sobre o caso. Na altura, Sarmento e Castro explicou a conclusão célere do processo por se tratar de um “processo diferente”, instruído num Consulado, e com o facto de o pai ser português. A audição está marcada também para as 14 horas.
No dia 28 de junho, será a vez do advogado da mãe das gémeas, Wilson Bicalho, ser ouvido na CPI. De seguida, os deputados tinham intenção de ouvir o pai das crianças, mas Rui Paulo Sousa sublinha que ainda não foi possível obter qualquer resposta de Samir Assad Filho. O presidente da CPI adianta que, para dia 3 de julho, estava prevista a audição de Nuno Rebelo de Sousa, filho do Presidente da República, embora o depoimento esteja ainda pendente de confirmação, uma vez que o empresário, que vive no Brasil, se recusou a prestar declarações perante a comissão de inquérito. Essa informação consta da carta que os advogados enviaram ao presidente da comissão de inquérito.
Caso das gémeas: Nuno Rebelo de Sousa não quer falar na CPI e também não pretende enviar documentos
Nuno Rebelo de Sousa é, como recordam os advogados na carta a que o Observador teve acesso, visado no processo-crime aberto pelo Ministério Público. No documento, os advogados referem que Rebelo de Sousa, filho, não prestará quaisquer declarações perante os deputados nem facultará qualquer documentação relacionada com este caso — admitindo apenas fazê-lo perante o titular do inquérito, ou seja, o próprio Ministério Público. Depois da reunião de mesa e coordenadores desta quarta-feira, Rui Paulo Sousa disse que a CPI poderá avançar com uma queixa por desobediência no Ministério Público contra o filho do Presidente da República, caso este se recuse a ser ouvido.
Na lista de audições, que vão decorrer a um ritmo de duas por semana, estão ainda a ex-secretária de Estado das Comunidades Berta Nunes, a ex-ministra da Saúde Marta Temido, o presidente do Infarmed, Rui Ivo, o ex-diretor clínico do Hospital de Santa Maria (e, tal como o ex-secretário de Estado Lacerda Sales, também arguido no processo-crime aberto ao caso) Luís Pinheiro, o ex-presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Norte (onde se integrava o Hospital de Santa Maria) Daniel Ferro, a ex-secretária-geral do Ministério da Saúde, a atual ministra da Saúde, Ana Paula Martins, a jornalista Sandra Felgueiras (autora da investigação que despoletou o caso) e ainda o chefe da Casa Civil da Presidência da República, Fernando Frutuoso de Melo, e a assessora para os assuntos sociais, Maria João Ruela.
Em aberto está ainda a possibilidade de ser ouvido o próprio Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Os trabalhos da comissão de inquérito parlamentar vão decorrer até 26 de julho, sendo suspensos durante o mês de agosto, e retomam no dia 10 de setembro.
O ex-secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales foi o primeiro a depor na comissão de inquérito, esta segunda-feira. Perante os deputados, Lacerca Sales acusou a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde de ter feito o relatório ao processo de atribuição do medicamento às crianças com base em “suposições” e garantiu que a sua intervenção “não é censurável”. Mas, sobretudo, remeteu-se ao “silêncio” invocando a sua condição de arguido no processo judicial.