O Governo espanhol vetou esta terça-feira a entrada do grupo Ganz-MaVag na empresa ferroviária Talgo. Em causa estão as ligações do consórcio húngaro ao governo de extrema-direita de Viktor Orbán e, por consequência, à Rússia e a Vladimir Putin. Uma das empresas do grupo pertence ao empresário András Tombor, conselheiro para os assuntos de segurança nacional durante o primeiro mandato do primeiro-ministro húngaro.
“O Conselho de Ministros decidiu hoje não autorizar o investimento direto estrangeiro na Talgo por parte da Ganz-Mavag Europe Private Limited”, declarou o ministério da Economia espanhol num comunicado, revelando que “a análise determinou que a autorização desta operação implicaria riscos para a segurança nacional e a ordem pública”.
Segundo o El País, o Executivo de Pedro Sánchez nunca escondeu as suas dúvidas sobre a oferta, liderada por empresários próximos do primeiro-ministro de extrema-direita, Viktor Orbán. Assim, baseou a sua decisão final em relatórios do Centro Nacional de Informações e da Segurança Nacional para vetar a compra. O organismo encarregado da segurança nacional em Espanha trabalhava há 18 meses na análise da rede húngara, mesmo antes do lançamento da oferta pública de aquisição da empresa ferroviária espanhola — no valor de 620 milhões de euros — a 7 de março.
O capital do consórcio húngaro tem uma composição mista pública e privada. Um fundo de investimento estatal chamado Corvinus International Investment, gerido pelo Ministério da Economia húngaro, detém 45% da Ganz-Mavag Europe Private Limited, enquanto que os restantes 55% do capital é detido pela empresa ferroviária húngara Magyar Vagón, de András Tombor.
Esta última empresa manteve alianças com a Transmashholding russa (THM) antes da invasão da Ucrânia. Oficialmente, assim que Washington e Bruxelas começaram a estabelecer sanções contra os interesses empresariais russos, houve um afastamento entre os grupos russo e húngaro, mas o relatório espanhol sugere que mantêm ligações informais.
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No comunicado divulgado pelo Executivo espanhol sublinha-se que a Talgo é “uma empresa estratégica” num sector que é “fundamental para a segurança económica, a coesão territorial e o desenvolvimento industrial”. Segundo fontes próximas do processo, o relatório da secreta espanhola baseia-se na necessidade de defender as tecnologias críticas da Talgo, com destaque para a mudança automática de via, que permite que os seus comboios de alta velocidade circulem em diferentes bitolas (largura dos carris) e, por conseguinte, atravessem as fronteiras entre países.
Tal tecnologia teria o potencial de facilitar a logística militar da Rússia em plena guerra com a Ucrânia. Acresce que a Rússia tem material Talgo pendente de manutenção, que não tem como tornar funcional devido às sanções contra Moscovo desde a invasão em grande escala da Ucrânia, em fevereiro de 2022.
De acordo com fontes internas da empresa da Europa de Leste, a Ganz-MaVag já está a preparar a sua resposta jurídica e vai dirigir-se tanto às instâncias judiciais competentes em Espanha como à Comissão Europeia. Aliás, começou a fazê-lo com antecedência, há várias semanas, antevendo o atual cenário de bloqueio e numa justificação para acelerar a sua resposta jurídica.
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Ao longo dos anos, a empresa espanhola entrou em vários concursos para reforço da frota da CP. Pretendia reforçar a sua presença em Portugal. “Como fabricantes ibéricos eu acho que somos os mais bem preparados”, defendia a responsável da empresa espanhola em Portugal, referindo as “caraterísticas próprias” do sistema ferroviário português que, assim como o espanhol, tem linhas com uma bitola diferente do resto da Europa. Em Portugal e Espanha, a bitola ibérica é a que costuma ser utilizada, enquanto que nos restantes países da Europa ocidental a bitola europeia é a mais comum.
Em janeiro de 2023, o consórcio germano-espanhol Siemens/Talgo ficou de fora do concurso de 819 milhões de euros lançado pela transportadora ferroviária nacional em dezembro de 2021 para fornecer novas composições para o serviço suburbano e regional em Portugal.