O tema esteve em cima da mesa no encontro em Washington, entre Joe Biden e Keir Starmer, na sexta-feira, e suscitou preocupação entre ambas as partes: os EUA e o Reino Unido receiam que Moscovo tenha partilhado segredos nucleares com o Irão, em troca de mísseis balísticos que podem vir a ser usados na guerra na Ucrânia. A notícia é avançada pelo The Guardian, que cita fontes britânicas.

A questão já tinha sido endereçada, ainda que superficialmente, por Antony Blinken, secretário de Estado norte-americano, numa visita a Londres para um encontro com o homólogo britânico, David Lammy, na terça-feira. “Por seu turno, a Rússia partilha tecnologia que o Irão procura — é uma via de dois sentidos — incluindo em questões nucleares, bem como alguma informação espacial”, afirmou, na altura.

Países como o Reino Unido, França e Alemanha já alertaram para o aumento significativo das reservas de urânio enriquecido no Irão “sem qualquer justificação civil credível” e para a acumulação de “quantidades significativas” que poderiam ser usadas para fabricar uma bomba nuclear.

O The Guardian escreve que, não sendo claro qual a capacidade de Teerão para construir uma bomba nuclear, uma parceria com a Rússia ajudaria a acelerar o processo. O Irão tem negado a intenção de construir uma bomba nuclear.

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Keir Starmer viajou para Washington na quinta-feira para um encontro especial com Joe Biden na Casa Branca em que, segundo o jornal britânico, durante 70 minutos foi discutida a crise na Ucrânia, a guerra no Médio Oriente, o Irão e a concorrência com a China. Os dois líderes políticos reconheceram que estão a reforçar a cooperação militar numa altura em que se suspeita que o Irão esteja a enriquecer urânio para construir uma bomba nuclear. Fontes britânicas adiantaram ao jornal que foram levantadas preocupações sobre a venda de tecnologia nuclear pelo Irão, como parte de uma aliança que se aprofunda entre Teerão e Moscovo.

Mas nem Starmer nem Biden adiantaram publicamente o conteúdo do encontro, nem confirmaram se será dada luz verde à Ucrânia para que use mísseis de longo alcance na Rússia. Keir Starmer disse apenas que ambos tinham tido “uma longa e produtiva discussão sobre uma série de frentes, incluindo a Ucrânia, como seria de esperar, e o Médio Oriente”. A Casa Branca afirmou, por sua vez, que os dois presidentes manifestaram “profunda preocupação com o fornecimento de armas letais à Rússia por parte do Irão e da Coreia do Norte”.

Centenas de mísseis balísticos do Irão “já chegaram” à Rússia e preocupam Ocidente: “Escalada dramática”

A troca de acusações entre o Ocidente e Moscovo e Teerão acontece numa altura em que o Kremlin tenta repelir a ofensiva da Ucrânia na região de Kursk e, escreve a AP, pode dar força a Volodymyr Zelensky para que suba a pressão sobre os EUA e outros aliados no sentido de darem luz verde ao uso de mísseis de longo alcance em território russo.

Na terça-feira, os EUA e o Reino Unido já tinham formalmente acusado o Irão de estar a enviar para a Rússia mísseis balísticos de curto alcance para usar na Ucrânia e anunciaram novas sanções. Antony Blinken disse em Londres que o Irão ignorou os avisos segundo os quais o envio do armamento seria uma clara escalada do conflito. Blinken adiantou mesmo que dezenas de militares russos estão a ser treinados no Irão para usarem o sistema de mísseis Fath-360, que pode atingir até 120 quilómetros.

“A Rússia recebeu carregamentos destes mísseis balísticos e irá provavelmente utilizá-los dentro de semanas na Ucrânia, contra os ucranianos”, afirmou Blinken, citado pela AFP. Esse fornecimento “permite à Rússia usar mais do seu arsenal para alvos que estão mais longe da linha da frente”.

Já este sábado, foi a vez do vice-ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergey Ryabkov, acusar os EUA de tentarem criar divergências entre a Rússia e o Irão com as declarações sobre as alegadas entregas de mísseis balísticos à Rússia. “A América quer criar um fosso entre os nossos países e jogar no terreno de outros para defender os seus próprios interesses. Não vão conseguir”, afirmou.

“A nossa cooperação tem resistido ao teste do tempo e não contém elementos que violem o que quer que seja do ponto de vista das obrigações jurídicas internacionais e que afetem de alguma forma negativamente a segurança de quem quer que seja ou os equilíbrios regionais”, acrescentou.

Também Teerão tem rejeitado o fornecimento destas armas a Moscovo. “Publicar informação falsa e enganadora sobre a transferência de armas iranianas a alguns países é simplesmente uma propaganda feia e uma mentira que visa esconder o apoio ilegal e maciço dos EUA e de algumas nações ocidentais ao genocídio na Faiza de Gaza”, de acordo um comunicado do ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão.