O presidente da agência de fogos rurais considera que os incêndios de setembro mostraram que o sistema “ainda tem muitas fragilidades”, mais evidentes com a pressão meteorológica, estando a ser feito um relatório para perceber o que correu mal.

Em entrevista à agência Lusa, o presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), Tiago Oliveira, avançou que os incêndios que lavraram no país na terceira semana de setembro foram muito parecidos com os fogos de 15 de outubro de 2017 com condições meteorológicas extremas.

“E isso mostra que o sistema ainda tem muitas fragilidades. Essas fragilidades já tinham sido identificadas, muitas delas no incêndio de 2022 na Serra da Estrela, umas são institucionais, outras são de operação, outras são de processo e de qualificação de doutrina“, precisou, dando conta que a AGIF está a analisar a informação e a produzir um relatório para “perceber o que é que podia ter corrido melhor”.

Este relatório está a ser feito pela Subcomissão Nacional de Lições Aprendidas do Sistema de Gestão Integrado de Fogos Rurais (SGIFR), estrutura que integra a AGIF, tendo esta entidade produzido um relatório idêntico em 2022 para o incêndio que lavrou na Serra da Estrela.

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Segundo Tiago Oliveira, a Polícia Judiciária, Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) e Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) estão igualmente a fazer relatórios sobre os incêndios da terceira semana de setembro, que provocaram a morte a nove pessoas e consumiram cerca de 135 mil hectares de florestas nas regiões do norte e centro.

“Todas as entidades estão a fazer um relatório. Nós como coordenador estratégico do sistema, temos um mecanismo de lições aprendidas que já foi lançado e vamos perante as evidencias que vão surgindo, perceber o que se passou”, disse, frisando que no relatório feito em 2022 sobre a Serra da Estrela foram detetadas e identificadas “um conjunto de medidas” e agora vai verificar-se “se as entidades corrigiram ou não” essas falhas.

Tiago Oliveira sustentou que os incêndios de 2024 mostraram fragilidades e “que, numa circunstância meteorológica como não se via há 25 anos, tornaram-se mais evidentes”, mas também indicam que “houve coisas que foram bem feitas, que há um caminho e uma estratégia” conquistadas desde 2017.

“Houve coisas que correram bem, as evacuações, os rádios funcionaram, a comunicação com a população através de SMS, as pessoas estavam informadas“, disse, salientando: “o país está mais preparado. Houve avisos com tempo, a informação circulou, as entidades foram reagindo, coisa que não aconteceu no dia 15 de outubro de 2017”.

No entanto, considerou que é também importante compreender porque é que em 2024 os incêndios deflagraram “a norte do Vouga” e quais os motivos por terem essencialmente ocorrido no litoral povoado e não no interior desertificado.

“Isto suscita a questão do ordenamento, aqueles territórios estão muito urbanizados e, portanto, a floresta já lá estava. Não foram as áreas agrícolas abandonadas e as aldeias que ficaram cercadas pelo fogo. Poderá haver pontualmente, mas aquilo que vimos em Albergaria são polos industriais, é o desordenamento do território a poder construir em todos os lados. Aqui são as pessoas que constroem as casas naqueles sítios que ardem recorrentemente e a carta de perigosidade mostra exatamente isso”, disse.

O responsável disse igualmente que os incêndios de 2024 são “um abre olhos para muitas questões associadas ao ordenamento do território, à falta de valorização do valor do eucaliptal, enquanto madeira que pode pagar o justo valor”.

Esclarecendo que “ainda cedo” para se tirar conclusões, Tiago Oliveira disse que é necessário também perceber o que falhou no caso de não terem sido encerradas algumas estradas, como a A25, na zona de Albergaria-a-Velha.

“Tem que se perceber porque é que não foram canceladas as estradas quando havia informação para o fazer. Temos perceber o que falhou, a informação não chegou, mas também sabemos que hoje em dia as pessoas circulam numa estrada e as bermas são limpas”, frisou.

Criada após os incêndios de 2017, a AGIF tem como missão fazer o planeamento, coordenação estratégica e avaliação do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais.