Investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) alertaram esta quinta-feira que o uso de antidepressivos é crucial para prevenir ideias e comportamentos suicidas em jovens adultos com depressão, contrariando um alerta internacional com mais de 20 anos.

Em entrevista à agência Lusa, a professora Maria Augusta Vieira-Coelho — que assinou com outros investigadores da FMUP um estudo publicado em agosto no jornal oficial da European Psychiatric Association [Associação Psiquiátrica Europeia] — frisou a ideia de que “os medicamentos são seguros, mas demoram um tempo a atuar”.

“A população tem de perceber que vale a pena tratar a depressão e que os medicamentos são eficazes, mas demoram um tempo a atuar. E, durante esse tempo, os doentes devem ter um acompanhamento muito próximo, especialmente quanto mais jovem é o doente”, referiu a docente.

No Dia Mundial da Saúde Mental, que se assinala esta quinta-feira, Maria Augusta Vieira-Coelho recorda um alerta que a Food and Drug Administration (FDA), a equivalente americana à Agência Europeia do Medicamento, fez em 2004 que relacionava os antidepressivos com o suicídio, algo que se veio a revelar “contraproducente”.

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“Quase há 20 anos, a FDA resolveu emitir um alerta sobre a utilização de antidepressivos nas pessoas jovens até aos 18 anos [alerta que depois, em 2007, estendeu aos ‘jovens adultos’, ou seja pessoas até aos 24 anos] alegadamente por aumento dos comportamentos suicidas. A preocupação era bem-intencionada, mas, na prática, este alerta foi muito negativo para a saúde mental”, contou a investigadora.

Lembrando que chegaram a circular anúncios na televisão e em rádios e que, nos primeiros 10 anos após esse alerta, menos pessoas procuraram ajuda para tratar a depressão, e a taxa de suicídio em pessoas jovens aumentou, a professora procura agora desmistificar esta questão e lança até um desafio às agências internacionais.

“Acho que poderiam corrigir este alerta e explicar. Os antidepressores são fármacos relativamente bem tolerados e eficazes no tratamento da depressão, mas demoram cerca de duas a três semanas, às vezes quatro, a fazer efeito. O doente nas primeiras semanas está muito frágil. Às vezes até há ativação comportamental. Deve ser muito bem acompanhado”, referiu.

A título de exemplo, Maria Augusta Vieira-Coelho lembrou que “a depressão é muito frequente nos alunos universitários por causa das mudanças, aconselhando: “Durante as primeiras semanas se calhar a família tem de se alterar, estar mais presente, ou o doente ir para casa da família. Não é um comprimido que vai resolver a situação”.

Partindo desta convicção, um grupo de investigadores da FMUP levou a cabo um trabalho, entretanto publicado no European Psychiatry, com o objetivo de avaliar se o tratamento com antidepressivos, nomeadamente com inibidores da recaptação da serotonina e da noradrenalina, está associado a um risco maior de comportamentos suicidas nos jovens medicados.

“Os resultados mostram que esses receios não têm fundamento”, refere a FMUP em comunicado.

Os investigadores averiguaram o que aconteceu numa série de ensaios clínicos e concluíram que o tratamento com estes fármacos reduziu o suicídio em doentes diagnosticados com depressão, muitas vezes grave.

Os investigadores sublinham, ainda, que evitar a toma de antidepressivos devido a “receios infundados” pode ter o efeito contrário, ou seja “pode efetivamente aumentar o risco dessas ideias e desses comportamentos que ameaçam a própria vida”.

“Existe evidência crescente de que os fármacos para a depressão são seguros nas diferentes idades”, concluem.

Além de Maria Augusta Vieira-Coelho, participaram neste estudo Inês Fonseca Pinto, Alexandra Elias Sousa.