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Bénédicte Blondeau e "Ondes": admirável mundo velho

"Ondes" vem reforçar a crescente vitalidade dos fotolivros em Portugal, com a surpresa e o encantamento que o trabalho da fotógrafa belga proporciona e que a excelência da impressão sublinha.

A riqueza pictórica deste livro obriga a uma lenta apreciação das duplas páginas, e o grafismo sem margens nem brancos tem o efeito da nossa total absorção no mundo subtil de Blondeau
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A riqueza pictórica deste livro obriga a uma lenta apreciação das duplas páginas, e o grafismo sem margens nem brancos tem o efeito da nossa total absorção no mundo subtil de Blondeau

A riqueza pictórica deste livro obriga a uma lenta apreciação das duplas páginas, e o grafismo sem margens nem brancos tem o efeito da nossa total absorção no mundo subtil de Blondeau

A edição de foto-livros em Portugal está a demonstrar uma enorme capacidade de nos surpreender, seja pela quantidade seja pela qualidade, tratando-se em todo o caso — verdade seja dita — de tiragens reduzidas, com distribuição em lojas e feiras da especialidade e sem favores duma crítica de imprensa que a ignora quanto pode. E no entanto há por aqui muito que admirar: a originalidade das obras, mas também a elevada tecnicidade implicada na impressão destes objetos, a qual está a puxar para cima a competência das nossas melhoras oficinas — das quais, e digo-o mais uma vez, se destaca claramente a Gráfica Maiadouro, que há anos constitui já um notório laboratório de experimentação e inovação escolhido por fotógrafos, designers, académicos e editores, em diálogo com os impressores.

A continuar assim, e com a expansão por redes de boca a ouvido e com o acumular de prémios da sua especialidade, é de prever que editoras e gráficas portuguesas venham a polarizar atenções de fotógrafos e editores de foto-livros doutros países europeus — o que já ocorre com este segundo livro de Bénédicte Blondeau (1986-) com a da XYZ Books, de Tiago Casanova e Pedro Guimarães, que serve de catálogo a uma exposição itinerante e tem financiamento de quatro instituições da Bélgica.


Título: “Ondes”
Fotografias: Bénédicte Blondeau
Design: Joana Durães
Editor: XYZ Books
Apoios: Direcção-Geral das Artes e outros

Páginas: 60

O primeiro, Ce qu’il reste, saiu em 2019, com 450 exemplares. Ondes tirou 600. Nem um nem outro trazem ensaio crítico, nota biográfica ou o que seja que os apresente ou explique, ficando por nossa conta observar as imagens, desprevenidos dessa elucidação. Esta maneira radical reforça a surpresa e o encantamento que o trabalho de Bénédicte Blondeau proporciona e a excelência da impressão sublinha. As ondas a que a artista se refere são, afinal, o vaivém perpétuo da vida do planeta onde nos cabe existir, entre os testemunhos dos grandes deslocamentos de lava, da solidificação de muito antigos glaciares e, claro, das grandes massas de água oceânica fustigando altas ravinas litorâneas, ou não.

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Em Ce qu’il reste essa glorificação do mundo natural coexistia com grandes obras de arquitetura neoclássica, ou do urbanismo visto do céu à noite, mas em Ondes surge-nos transposta para a promessa dada pela gravação visual de ondas ultra-sons da gravidez da própria artista, a par de visões microscópicas de gotas de água ou da poeira de espuma que resulta do choque entre mar e pedra. Essa atenção cruzada ao mundo subtil, por vezes quase imperceptível, que a ciência instituiu e o progresso da sensibilidade fotográfica garante, confere ao trabalho de Bénédicte Blondeau uma invulgar beleza poética (à falta de melhor expressão), que certamente a distingue inter pares.

Não há ensaio crítico, nota biográfica ou o que seja que os apresente ou explique, ficando por nossa conta observar as imagens, desprevenidos dessa elucidação

A laboriosa sequência, conjugação e alternância de imagens e motivos — decidida com os dois editores (v. badana final) — destas afinal 60 páginas estende exponencialmente a riqueza pictórica deste livro, obrigando a uma lenta apreciação das duplas páginas, e o grafismo sem margens nem brancos tem o efeito da nossa total absorção no mundo subtil de Blondeau, em que as formas naturais, na sua infinita variedade, têm sempre destaque.

Este é um mundo desconhecido que queremos descortinar, e a ausência de coordenadas de referência — e repito-me — aponta-nos diretamente para a pergunta essencial: que estamos nós aqui a fazer, e como o podemos merecer. Não é pouco, de facto.

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