O antigo diretor das Florestas da Madeira defendeu esta segunda-feira a proibição de queimadas todo o ano na ilha para evitar o risco de incêndios, salientando que a orografia não permite o combate a pé dos fogos nos declives.
“É preciso proibir as queimadas 365 dias por ano“, disse esta tarde Miguel Sequeira na comissão parlamentar de inquérito sobre o “Apuramento de responsabilidades políticas no combate aos incêndios ocorridos entre o dia 14 e 26 de agosto”, na Assembleia Legislativa da Madeira, numa informação divulgada pelo parlamento madeirense.
O docente da Universidade da Madeira considerou que a estratégia do combate ao fogo deve começar “com a não ignição”, acrescentando que os “hábitos absolutamente ultrapassados do ponto de vista cultural (queimadas e uso do fogo permanente), são impossíveis de manter“.
“Nós temos cada vez mais áreas cobertas com floresta e cada vez mais estamos a colocar em contacto as áreas florestais com as áreas agrícolas, mantendo o velho hábito da utilização do fogo”, argumentou.
Miguel Sequeira salientou que “uma floresta é demasiado importante para continuarmos a ter pequenas regras e exceções que não funcionam”, sustentando que o coberto florestal deveria ser dotado de “uma força especial de bombeiros em permanência”.
No seu entender, a região devia também ter uma rede de monitorização para estudar o que acontece “nas áreas intervencionadas”, nomeadamente na faixa corta-fogo e naquelas “onde consideram que está a correr tudo bem”.
“Era muito importante estabelecer uma rede de monitorização permanente preparada para subsistir nos próximos 50 anos e onde, de forma periódica, se fizessem estudos sobre a floresta, sobre o coberto vegetal e sobre as plantas invasoras dentro de todo o território da Madeira”, opinou.
O professor universitário ainda indicou que “a floresta que está a aumentar é a Laurissilva, vegetação nativa, e as espécies invasoras, que não trazem boas notícias do ponto de vista das aluviões”.
Para Miguel Sequeira, “o desaparecimento do coberto vegetal nos picos, como aconteceu com os incêndios de agosto passado, vai ter um efeito no balanço hídrico“, com redução da quantidade de água, que pode afetar também a Laurissilva.
Miguel Sequeira enfatizou não ser possível assegurar que “a Laurissilva não foi atingida pelos incêndios de agosto”, acentuando existir “uma confusão entre o bem Laurissilva, enquanto parte da Rede Natura 2000, e o habitat Laurissilva”.
“Arderam fragmentos de Laurissilva que não estão dentro da Rede Natura 2000 e não é por isso que deixam de ser habitats protegidos pela Comunidade Europeia. Os urzais da Madeira são também um habitat da diretiva com proteção. Cada vez que fazemos desaparecer uma vegetação de urzes estamos a fazer regredir um processo de sucessão ecológica que já teria 10, 20 ou 30 anos, e, portanto, estamos a andar para trás”, explicou.
O docente apontou que o Curral das Freiras, as Rabaças e a Ribeira Brava como as localidades onde houve danos na Laurissilva.
O parlamento madeirense informa que, a pedido dos deputados da Iniciativa Liberal e do PAN, e devido ao adiantado da hora, a audição com Miguel Sequeira irá continuar noutro dia, ainda por agendar.
Na próxima quarta-feira, a comissão de inquérito aos incêndios vai ouvir o engenheiro geólogo João Baptista.
Esta comissão de inquérito, requerida pelo PS, o maior partido da oposição madeirense, integra deputados dos sete partidos com representação parlamentar — PSD, PS, JPP, Chega, CDS-PP, IL e PAN.
A comissão de inquérito sobre o “apuramento de responsabilidades políticas no combate aos incêndios ocorridos entre o dia 14 e 26 de agosto” iniciou as audições na terça-feira da semana passada com o secretário regional de Saúde e Proteção Civil, Pedro Ramos, que reiterou que a estratégia adotada no combate ao incêndio em agosto foi correta, não havendo registo de mortos, feridos ou danos graves, sublinhando também que a região nunca recusou a ajuda externa, apesar de só ter sido ativada quatro dias após o início do fogo.
O presidente do Governo Regional decidiu responder por escrito aos deputados, que devem entregar até domingo as perguntas que pretendem colocar a Miguel Albuquerque.
O incêndio rural deflagrou na ilha da Madeira em 14 de agosto, nas serras do município da Ribeira Brava, propagando-se progressivamente aos concelhos de Câmara de Lobos, Ponta do Sol e Santana. No dia 26, ao fim de 13 dias, a Proteção Civil regional indicou que o fogo estava “totalmente extinto”.
Dados do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais apontam para mais de 5.104 hectares de área ardida, embora as autoridades regionais tenham sinalizado 5.116.