A apanha da castanha nos Soutos da Lapa, na região de Penedono, tem vindo a ser cada vez mais mecanizada devido à falta de mão-de-obra para realizar o trabalho que é um dos mais duros na agricultura.
“Isto não é um trabalho fácil, é muito duro mesmo. Há dias em que até os olhos parecem inchados de andarmos o dia todo com o foco do olhar no chão e o foco nos ouriços, para detetar a castanha que é boa e não é”, relataram Liliana e Luís Frias.
Este casal há 10 anos que faz a apanha da castanha de Fernando Pereira, um produtor que completou 90 anos em agosto e que não abdica da apanha manual do seu fruto, que “é uma relíquia, não há melhor que esta Martaínha” na região dos Soutos da Lapa.
“Mas isto é muito duro, para as costas e para as pernas. De vez em quando é cada picadela nos joelhos! É dos mais duros na agricultura. Antes, ainda se podia comparar à apanha da azeitona, mas agora é muito mais fácil. Já a castanha, não”, acrescentaram.
Na freguesia de Penela da Beira, concelho de Penedono, distrito de Viseu, a castanha “é um dos motores mais fortes” da economia local, mas “há muito que deixou de haver mão-de-obra para a apanha, porque é muito difícil”.
“Tive durante muitos anos um grupo certo de mulheres que vinha sempre apanhar, mas todos envelhecemos, elas deixaram de poder e já não conseguimos arranjar quem queira fazer este trabalho”, disse à agência Lusa Fernando Pereira.
Na experiência dos seus 90 anos, disse que “não há fruto como este e apanhado à mão” e, este ano, conseguiu que se juntasse ao casal “o irmão dele para ajudar, para ser mais rápido”, embora tenha ido “obrigado pela patroa”.
“Peço a uma amiga que me dispense os trabalhadores. Mas eu pago-lhes e trato-os bem. Pago ao dia, dou uma gorjeta de 50 euros no final da campanha e ainda levam castanhas, maçãs e azeite, porque eu sei que é um trabalho duro”, contou.
Questionado sobre a possibilidade de fazer a apanha com máquina, Fernando Pereira recusou-se: “Nem pensar, é à mão, porque não há comparação”. “Enquanto eu viver, é assim. E depois quem cá ficar que faça o que quiser”, reagiu.
Já Mário Pereira, com 88 anos, um outro produtor e “um dos maiores na freguesia” de Penela da Beira, pensou de forma diferente e há dois anos adquiriu uma máquina, porque para isso “bastam duas pessoas e é muito mais rápido”.
“Eu tinha muitos hectares, mas já fiz as partilhas. Ando aqui neste lugar, com 15, mais ou menos 700 castanheiros. Fui eu que os plantei a todos e comigo, ao longo de 30 anos, andou um grupo de mulheres a apanhar, mas também deixaram de poder. Então comprei uma máquina e eu mais um rapaz cá fazemos a apanha”, disse.
A exceção vai para as “zonas muito inclinadas do souto, onde é mais difícil ir”, o que o levou a procurar trabalhadores, “mas não foi fácil, mas apareceram esses cinco rapazes imigrantes, do Nepal, que aceitaram fazer o trabalho”.
No entanto, Mário Pereira não esconde a importância da “rapidez da apanha com a máquina e por menos dinheiro”, já que, depois do investimento inicial, “já só é preciso combustível”.
“Tenho é depois o trabalho extra de limpar toda a castanha, porque a máquina apanha tudo. Apanha a boa, a faneca, a bichada, o refugo e também os pauzitos. Depois, em casa, tenho de a limpar e colocar na água, para separar a que é boa. A que vier ao de cima, não presta. É um trabalho adicional que não tinha e agora tenho”, disse.
Na Cooperativa Agrícola de Penela da Beira sabem distinguir a que é apanhada à mão e com a máquina, “e há clientes que também sabem e não se importam de pagar mais por isso”, admitiu à agência Lusa o presidente, Aires António Macieira.
“Na apanha manual há outro cuidado. As máquinas apanham tudo, há muito mais bichadas, nota-se a diferença. Nós, na cooperativa, é que temos de ter mais cuidado na seleção, porque o cliente vai reclamar e é a credibilidade que está em causa”, apontou.
Aires António Maceira afirmou que a apanha por máquina “é a realidade e o futuro, e por isso a cooperativa é que tem de se adaptar à nova realidade”.
“Se me perguntar o que seria o ideal. Sem dúvida nenhuma que seria apanhar à mão, mas é um ideal que não é possível. Não há mão-de-obra e, por isso, temos de ser nós, cooperativa, a adaptarmo-nos a uma nova realidade”, rematou.