O novo primeiro-ministro da Síria, Mohammed al-Bashir, garante que o novo regime sírio vai “garantir os direitos de todas as pessoas e grupos” do país, assegurando uma governação pluralista e não apenas dirigida aos muçulmanos.
Numa entrevista ao jornal italiano Corriere della Sera publicada esta quarta-feira — a primeira entrevista a um meio de comunicação social ocidental —, Bashir deixa uma garantia a todos os sírios que estão fora do país desde que fugiram do regime de Bashar al-Assad: agora, é seguro voltar.
Na entrevista, Bashir (que garante ocupar o cargo transitoriamente, até março de 2025) explicou que o novo regime sírio tem três objetivos principais.
O primeiro é “restaurar a segurança e a estabilidade em todas as cidades da Síria”.
“Os sírios estão exaustos da injustiça e da tirania. A autoridade do estado tem de ser restaurada, para permitir que as pessoas regressem ao trabalho e à vida normal”, disse o governante interino.
O segundo objetivo, acrescentou, é “trazer de volta os milhões de refugiados sírios que estão no estrangeiro”.
“O seu capital humano, a sua experiência, vai permitir ao país florescer. O meu apelo é para todos os sírios no estrangeiro: a Síria é agora um país livre que recuperou o seu orgulho e dignidade. Voltem. Temos de reconstruir, renascer e precisamos da ajuda de todos”, assinalou na entrevista.
Por fim, disse Bashir, o terceiro objetivo passa pelo planeamento estratégico, já que “os sírios não podem viver com a precariedade de serviços essenciais, como eletricidade, pão e água”.
“Somos um governo de transição, mas temos de começar a trabalhar nisto. Quando entrámos em Alepo, Hama e Damasco, os sírios viviam numa dupla escuridão: a escuridão do regime e a escuridão dos cortes de eletricidade. É absolutamente inaceitável”, sublinhou.
Questionado sobre como é que os rebeldes podem dar estas garantias tendo em conta o passado jihadista de muitos elementos — vários deles ligados à Al-Qaeda e até ao Estado Islâmico —, Bashir procurou distanciar o movimento rebelde do “comportamento errado de alguns grupos islamistas”.
Esse comportamento, diz o primeiro-ministro interino, “levou muitas pessoas, especialmente no Ocidente, a associar os muçulmanos ao terrorismo e o Islão ao extremismo”.
“Esta é uma questão de comportamentos errados e de falta de compreensão. Assim, o significado do Islão, que é a ‘religião da justiça’, foi distorcido. Precisamente porque somos muçulmanos, vamos garantir os direitos de todas as pessoas e grupos na Síria”, disse.
Questionado sobre se a nova constituição da Síria será islâmica, o novo primeiro-ministro disse que o governo interino sírio pretende “clarificar todos esses detalhes durante o processo constituinte”.
“O regime devorou-se a si próprio”
Na mesma entrevista ao Corriere della Sera, o primeiro-ministro interino da Síria revelou que os rebeldes encontraram um cenário negro do ponto de vista financeiro ao assumir a liderança do país.
“Sabemos que estamos a herdar uma administração gigante, atormentada pela corrupção”, explicou Bashir. “Em última análise, o regime devorou-se a si próprio, mas ao mesmo tempo as pessoas viviam mal.”
Sublinhando que a maioria dos ministros do antigo governo estão a colaborar na transição, Bashir disse também que as finanças sírias estão num estado “muito mau”.
“Nos cofres só temos libras sírias, que valem pouco ou nada. Com um dólar americano é possível comprar 35 mil das nossas moedas. Não temos moeda estrangeira e, no que toca a títulos e empréstimos ainda estamos a recolher informação. Por isso, sim, do ponto de vista financeiro estamos muito mal”, diz o responsável.
Garantindo que só vai ficar no cargo até março de 2025 (para dar lugar a uma eleição democrática), Bashir assinalou que “a dívida é enorme e o desafio é ciclópico”.
Contudo, os rebeldes dizem ter a experiência de governar Idlib, onde afirmam ter “sucesso” com Bashir como presidente de câmara.
“Claro que uma província não é o país e ainda assim conseguiremos melhorar a Síria. Vai demorar, mas vamos conseguir”, diz.