Houve um pouco de tudo, só no final se percebeu que ainda houve um pouco mais. Na primeira final desde que assumiu o comando do AC Milan e com apenas um encontro realizado até então, Sérgio Conceição viveu tudo como se nunca tivesse feito um período sabático de seis meses afastado das zonas técnicas dos relvados (uma fase que descreveu como “muito má”). Mostrou-se chateado, festejou o livre direto que então reduziu a desvantagem, foi continuando a puxar pela equipa, celebrou com titulares que já tinham saído o empate, foi eufórico quando Rafael Leão assistiu Tammy Abraham para a reviravolta nos descontos. Depois, chorou, teve um período com mais tosse em que se afastou, abraçou todos os jogadores, ouviu o seu nome cantado pelas bancadas, acabou no balneário a dançar kuduro de charuto na mão. Pelo meio, ainda partiu um televisor.

“Isto é o AC Milan, jogamos por estes troféus. Se queremos ficar na história do clube temos de ganhar estas taças. Atingimos um dos nossos objetivos. O que procurávamos [com a mudança de treinador] era reação e esta é a nossa reação. Quero felicitar o treinador e a equipa. Em apenas alguns dias fizeram um excelente trabalho. Ainda bem que o treinador estava com febre, senão teria partido mais do que um televisor”, revelou Zlatan Ibrahimovic, antigo avançado que é diretor desportivo do AC Milan. “Parabéns aos jogadores, ganharam com suor, sacrifício e vontade. Quando uma equipa tem esta vontade, é difícil vencê-la. Quando o Campeonato começou, disse-vos que tudo depende de nós, está na cabeça. Provaram-no. Agora voltámos e trazemos esta mentalidade. Vamos conquistar pontos para chegarmos onde devemos estar”, acrescentou.

Dos jogadores aos dirigentes, dos adeptos à imprensa, Sérgio Conceição teve um impacto imediato em tudo o que é a realidade do AC Milan após a saída do também português Paulo Fonseca. É quase como se o tempo tivesse escrito direito por linhas tortas, tendo em conta os desencontros e possíveis caminhos alternativos que ambas as parte foram tomando. Já com a saída do FC Porto “assumida” no plano interno (ainda que sem qualquer comunicação para fora), o técnico foi falando com o agente Jorge Mendes para perceber as reais possibilidades de rumar à Serie A mas, no caso do AC Milan, Julen Lopetegui e Fonseca estavam à sua frente. Mais tarde, Conceição foi recusando as sondagens e propostas do Médio Oriente, do Brasil e de França para “esperar” pela sua vez no calcio mas esteve muito próximo de fechar contrato em dezembro.

Entre todas as abordagens, a possibilidade de suceder a Domenico Tedesco na seleção da Bélgica tornou-se um projeto apetecível em termos desportivos – e renderia muito mais no plano financeiro. O português, que teve a ponte do amigo Luciano d’Onofrio, chegou mesmo a falar com Vincent Mannaert, diretor desportivo da Federação belga, mas o aparecimento em cena do AC Milan abortou de imediato a hipótese, por pretender um desafio num clube. O acordo foi fácil de alcançar, a chegada não poderia ter mais sucesso e a nova realidade permite, por exemplo, que regressasse da Arábia Saudita depois da conquista da Supertaça e fizesse uma curta deslocação até Turim para ver o filho Francisco, que se lesionou no aquecimento da meia-final da competição realizada em Riade mas que já poderá ser opção no próximo encontro da Juventus.

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Agora, as atenções já estão centradas na Serie A, com o AC Milan a ter uma dura montanha pela frente com a prova a aproximar-se do final da primeira volta. Os rossoneri, que conquistaram o 50.º título oficial com a chegada do português, ocupam nesta fase o oitavo lugar da classificação com 27 pontos em 17 jogos, a cinco dos lugares europeus (a Fiorentina tem mais um encontro realizado), a oito da entrada direta na Champions (a Lazio tem mais duas partidas feitas) e a 17 do primeiro lugar (o Nápoles também tem dois jogos a mais). É por isso que os próximos dois compromissos são tão importantes, com a receção ao Cagliari e a deslocação a Como a meio da semana. E as diferenças nas rotinas também já se começam a sentir em Milanello.

De acordo com a imprensa transalpina, e entre as várias mudanças que tem vindo a efetuar, o antigo técnico do FC Porto recuperou um hábito perdido a partir da pandemia da Covid-19 e vai regressar aos estágios no centro de treinos na véspera de um encontro em San Siro, algo que não aconteceu com Stefano Pioli nem com Paulo Fonseca. Em paralelo, em mais uma das mudanças, todos os jogadores terão controlos diários de peso para acompanhamento do estado físico, só podendo sair a partir das 14h de Milanello mesmo em dias com uma única sessão de trabalho de manhã. Tudo rotinas que já tinha nos azuis e brancos visando a consolidação do espírito do grupo, a máxima exigência profissional e o maior compromisso possível.

“Se o treinador puder ajudar, o resto cabe-me a mim fazer. Tento sempre colocar as minhas caraterísticas à disposição da equipa. O Sérgio Conceição não está sempre a brincar e sabe como puxar por mim, vai ajudar-me a atingir um nível mais alto. Confiamos muito nele. Estou preparado para ouvir e seguir as suas ideias, que são boas”, destacou Rafael Leão em entrevista à Gazzetta dello Sport, depois de ter feito um regresso em grande após lesão na segunda parte da final da Supertaça de Itália frente ao rival Inter.

“Paulo Fonseca? Não tenho nada a dizer sobre a relação jogador-treinador, mesmo que tenhamos tido de resolver algumas questões. Não houve problemas ou situações. Tentou fazer o seu trabalho e aplicar as suas ideias. Podemos sempre aprender mas não funcionou. Todos tentaram dar o seu máximo e desejo-lhe o melhor. Frustrado pelos três jogos no banco ou motivado para voltar? Um bocadinho dos dois. Mas penso que pelo menos é devida uma explicação, mas às vezes os treinadores fazem isto… Foi a primeira vez que me aconteceu no AC Milan e também aprendi com isto. Espero que não volte a suceder, mas assim for, estarei mais atento sobre aquilo em que tenho de me focar para não perder a confiança em mim. Mas isso é passado, olho apenas para o futuro”, completou o internacional português na mesma entrevista.