L Jinny, nome artístico do rapper Abdel-Majed Abdel-Bary, 24 anos, cresceu na zona leste de Londres, num bairro com uma grande comunidade imigrante. É provável que tenha sido lá que teve pela primeira vez contacto com a filosofia do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL). O nome dele é relativamente conhecido na cidade, as suas músicas passaram na BBC e os videoclipes têm milhares de visualizações no YouTube. Só que agora, se todas as suspeitas se confirmarem, em vez de lançar rimas e criticas à sociedade, é o homem que aparece nos vídeos a decapitar jornalistas.

Algumas provas correspondem, outras não. As certezas sobre a identidade do jihadista que decapitou os jornalistas norte-americanos são poucas, mas muitas provas apontam para o rapper. “O modus operandi do rapper e do decapitador escondido é o mesmo, e isto pode-nos ensinar algo sobre a forma de agir não só deste homem, mas de todos como ele”, escreve Richard Spencer no Telegraph. ‘Jihadi’ John, nome pelo qual foi batizado nos meios de comunicação internacional, conhece o poder da performance.

David Cameron, primeiro ministro do Reino Unido, presente na Cimeira da NATO que se realiza nesta quinta-feira, afirmou que “o Jihadi John vai ser capturado”. Esta reação surge depois de o Estado Islâmico ter sido anunciado que o próximo indivíduo “na fila” para ser decapitado é britânico.

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No início deste ano, apareceu no Twitter com a cabeça decepada de um soldado do regime iraquiano na mão, com um mar de corpos como cenário de fundo, lembra o Independent“A relaxar com o meu amigo, ou o que resta dele”, escreveu.

Dois anos antes, no Reino Unido, eram estas as rimas que ele lançava: “Estou a tentar mudar as minhas atitudes mas tenho sangue nas minhas mãos e não consigo mudar as minhas atitudes até que tenha dinheiro no banco. Não consigo diferenciar os anjos dos demónios, o meu coração começa a desintegrar-se. Não tenho sentimentos normais.”

Naquela altura, ele já se pronunciava um jihadista, um guerreiro santo. Antes, era um guerreiro das ruas, a falar das drogas e da vida de gangster, um sucessor “legítimo do mercado revolucionário da música”, segundo alguns amigos. No YouTube é possível encontrar diversos videoclipes de música onde L Jinny aparece.

https://www.youtube.com/watch?v=LpuBpz4rNw0

O contexto familiar em que cresceu pode ser um fator a ter em conta enquanto se reúnem provas sobre a identidade do jihadista mais conhecido do Ocidente. L Jinny terá sido uma criança alienada durante a infância, criada numa grande família com uma mãe a ficar todas as responsabilidades enquanto o pai estava preso”, uma série de elementos comuns em alguns criminosos violentos. “Mas este caso tem uma reviravolta”, escreve o Telegraph.

“Deem-me o orgulho e a honra como a do meu pai, eu juro que no dia em que vieram buscar o meu pai eu podia ter morto um ou dois polícias”, diz uma das suas letras. “Imaginem que eu só tinha seis anos, na altura, pensem no que eu era capaz de fazer agora com a arma carregada. Como uma multa ao som das balas, eu gostava que estivesses morto.”

O pai de L Jinny, contudo, não era um gangster, mas um islamita. Quando foi preso em 1998, o jovem Abdel tinha seis anos. Aquele foi um dos processos legais mais controversos na história judicial britânica. Exilado devido a atividades islamitas no Egito, onde segundo a sua família foi repetidamente torturado, o pai do rapper tinha sido acolhido no Reino Unido cinco anos antes. Não obstante, o pai estava registado nos ficheiros das autoridades como simpatizante jihadista. Quando a al-Qaeda rebentou com as embaixadas americanas na Tanzânia e no Quénia, a polícia bateu-lhe à porta.

Adel Abdel-Majed, o seu pai, era associado a Ayman al-Zawahiri, líder da primeira jihad egípcia e agora da própria al-Qaeda. Foi ilibado de todas as acusações, mas depois voltou a ser preso devido a conspiração contra os EUA. Foram precisos 14 anos para o deportar.

O Telegraph lembra um episódio importante na história de L Jinny.

A jornalista Victoria Brittain entrevistou a mãe do rapper para um livro sobre mulheres com os maridos detidos e descreveu o ambiente em que este cresceu: “Ragga, não preparada para a língua do país e ou tradições, tornou-se uma mãe solteira, ligada ao marido pelo telefonema diário que recebia da prisão, ou visitas à cadeia quando um organização de caridade muçulmana a levava”, escreveu a autora.

Presa dentro da própria casa e a viver sobre os ditames da sua versão do islão, Ragaa ficou deprimida e assustada com o mundo exterior, tão diferente da aldeia onde tinha crescido no Egito.

“Quando as crianças começaram a ficar mais velhas começou a ouvir sobre Londres e mundo fora do seu apartamento, com histórias de drogas, violência e tensões que os filhos viviam com os colegas de escola. Isso aterrorizou-a. Tirou-os da maior parte da escola e ensinou-os em casa. O cansaço de fazer tudo isto, o peso desta responsabilidade, tirou grande parte da saúde de Ragga. E o dinheiro era muito pouco.”

L Jinny, o filho, cresceu no meio de uma mescla de influências: um pai preso; uma casa dominada pela pobreza; uma mãe aflita; e as ruas de Londres nos anos 1990 com todos os problemas sociais associados. Mas chegará isto para justificar o que aconteceu a L Jinny? Shiraz Mahler, especialista na comunidade jihadista, afirma que não, porque não existe qualquer relação entre os filhos de jihadistas e a captação de outros jovens muçulmanos para se juntarem ao Estado Islâmico.

Mas é verdade que nos anos 1990, a capital de Inglaterra era conhecida por “Londonistan”, devido aos vários exilados árabes, na maioria com origem nas ex-colónias, que se envolveram em grupos militantes naquela cidade. Abu Musab al-Suri, o estratega sírio que comandou alguns dos ataques mais conhecidos da al-Quaeda depois do 11 de Setembro, vivia em Londres, na época.

Dada a natureza dos crimes de L Jinny (deixando de lado se ele é ou não o “Jihadi” John), é mais provável que ele vá ser preso caso regresse ao Reino Unido do que ser enviado para as escolas de “desradicalização”  — uma das medidas anunciadas por David Cameron na segunda-feira.

Devido à sua nacionalidade, L Jinny faz parte da lista de jihadistas britânicos alcunhados de “Beatles”, conta o Daily Mirror. Segundo o mais recente discurso de David Cameron, existem cerca de 500 cidadãos do Reino Unido a lutar ao lado do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).

Paul Kerswill, linguista da Universidade de York, afirmou que o responsável pela decapitação de James Foley e Steven Sotloff falou num “inglês multicultural de Londres”, usualmente encontrado na zona leste da cidade. “Ele provavelmente tem conhecimento de línguas estrangeiras, mas quando falou soou a inglês multicultural de Londres”, o que é comum num morador da zona leste da cidade, devido a ser um bairro com muitos emigrantes. Outros especialistas afirmaram o mesmo ao Guardian.

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No vídeo, o jihadista encoberto é visto a brandir uma faca e a ameaçar os Estados Unidos da América, antes de decapitar o jornalista. Pensa-se que John seja um dos principais guardas dos reféns estrangeiros capturados em Raqqa, na Síria. Um cargo de baixa importância dentro do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, tal como acontece com a maioria dos jihadistas estrangeiros que se juntaram ao “califado”. Um ex-refém que esteve sobre a vigilância de L Jinny descreveu-o como inteligente, educado e um crente devoto dos ensinamentos islâmicos.

No Reino Unido, a caça a L Jinny começou e promete não ter desistências.

O almirante Lorde West of Spithead, um ex-ministro da segurança do Reino Unido, afirmou, na quarta-feira, que o rapper vai ser caçado “como foi Osama Bin Laden”, acrescentando que é muito provável que os serviços de segurança britânicos já o tenham identificado, em declarações ao Telegraph.

“Gostaria de o ver a ser julgado em Haia por crimes de guerra”, afirmou. Mas acrescentou que o mais provável é que os Estados Unidos da América lidem com ele como fizeram com o líder terrorista da Al-Qaeda – uma missão especial com intuito de eliminar aquele indivíduo logo naquele momento.