O Governo prometeu a Bruxelas 1.125 milhões de euros em consolidação adicional que considera estruturais, mas Bruxelas só aceitou 845 milhões de euros das medidas apresentadas como estruturais. A Comissão manteve a intransigência na classificação de algumas medidas, e o resultado são duas previsões para ao ajustamento estrutural diferentes: uma do Governo, outra da Comissão.

Bruxelas pediu explicações por carta na semana passada. Depois de uma semana de intensas negociações, o Governo deu a resposta final nesta sexta-feira, no mesmo dia em que apresenta a proposta de Orçamento do Estado para 2016.

As medidas que o Governo prometeu a Bruxelas

  • Poupança com pagamentos antecipados do empréstimo do FMI – 50 milhões de euros.
  • Aumento do imposto sobre veículos – 70 milhões de euros.
  • Aumento do imposto sobre o tabaco – 100 milhões de euros.
  • Aumento adicional (para além do já previsto) no imposto sobre os produtos petrolíferos – 120 milhões de euros.
  • Fim da isenção do IMI para fundos de investimento e fundos de pensões – 50 milhões de euros.
  • Agravamento da contribuição sobre o setor bancário – 50 milhões de euros.
  • Controlo adicional de recrutamento no Estado (só entra um trabalhador, por cada dois que saem) – 100 milhões de euros.
  • Novo sistema de controlo de remunerações na Segurança Social – 50 milhões de euros.
  • Melhoria no controlo da atribuição de baixas médicas – 60 milhões de euros.
  • Não aplicação da redução da TSU para os trabalhadores com salários até 600 euros – 135 milhões de euros.
  • Reavaliação do valor patrimonial tributário dos ativos das empresas – 125 milhões de euros.

O total das medidas (as que avançam e que caem) é de 910 milhões de euros. O Governo também apresentou a Bruxelas melhores perspetivas sobre duas rubricas das contas do ano passado que ajudam a reduzir o esforço necessário deste ano. Por um lado, o Banco de Portugal irá distribuir ao Estado mais 40 milhões de euros em dividendos do que o previsto. Por outro lado, as contas da Segurança Social terão uma melhoria superior ao previsto em dezembro e janeiro deste ano, na ordem de 175 milhões de euros.

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O diferendo sobre o que é estrutural e o que é temporário

Muita da discussão do Governo com Bruxelas por estes dias passou pela forma de classificação de algumas medidas dentro ou fora do saldo estrutural. As contas enviadas pelo Governo no Esboço do Orçamento do Estado para 2016, remetidas a Bruxelas há duas semanas, contabilizavam como temporária, e assim sem impacto no défice estrutural, a reversão de algumas medidas que tinham sido contabilizadas como estruturais no passado, sendo o caso mais evidente o dos cortes salariais.

O Governo entendia que estes cortes foram apresentados pelo Governo como temporários, e as decisões do Tribunal Constitucional apoiavam esse raciocínio, mas foram registados como permanentes em Bruxelas, porque os cortes deviam ter sido substituídos por outras medidas para compensar o seu impacto na despesa quando aqueles desaparecessem.

No entanto, segundo a carta enviada por Mário Centeno, ministro das Finanças, aos comissários Pierre Moscovici e Valdis Dombrovskis, o Governo conseguiu apenas que a contribuição para o Fundo de Resolução Europeu, que devia ter sido transferida no ano passado para ter impacto neutro nas contas orçamentais após a sua receção pelos bancos mas que não foi efetivamente transferida, não tivesse impacto no cálculo do saldo estrutural deste ano, apoiado no facto de esta contribuição ter de seguir todos os anos para aquela entidade. Esta transferência vale 130 milhões de euros.

Para além desta medida, as equipas chegaram a acordo em não classificar como estrutural uma operação de molde muito semelhante, mas de uma PPP (parceria público-privada). A empresa pública Infraestruturas de Portugal recebeu fundos europeus que devia ter transferido para a subconcessão Transmontana, mas não o fez, o que empolou a receita no ano passado. A transferência iria agora agravar as contas de 2016, quando, se fosse transferida em 2015, seria nula em termos orçamentais. Assim, o Governo conseguiu tirar do peso do saldo estrutural 164 milhões de euros.

No final, segundo as contas da Comissão Europeia, o Governo chegou-se à frente com 845 milhões de euros em novas medidas, com impacto estrutural, nesta carta. O valor total das medidas terá sido de 1.125 milhões de euros, porque Bruxelas não aceita que a reavaliação do valor patrimonial tributário seja considerada como estrutural.

No final, fica o diferendo. Bruxelas diz que o esforço estrutural fica entre 0,1 e 0,2 pontos percentuais e o Governo mantém que é de 0,3 pontos percentuais, como diz na carta.