Seis meses depois de ter sido multado em 476 mil euros, a boa nova: o português que lidera o Lloyds Bank Group vai receber um bónus de um milhão de euros pelo desempenho que teve à frente do banco britânico. O prémio de Horta Osório está ainda dependente de alguns pontos, como a venda da fatia de 9% que o Estado ainda detém na instituição. Ainda assim, a “disciplina” com que tem conduzido a gestão do banco foi avaliada em mais um milhão.

Um dos analistas britânicos que acompanha o desempenho do Lloyds Bank explicou ao Observador que o trilho traçado pelo português de 52 anos tem sido fundamental na direção assumida pelo banco. “Ele percebeu claramente que a vida estava a mudar e foi muito rápido a reestruturar o grupo”, afirmou. Já outro analista destaca a “disciplina”, a “simplicidade” e a “facilidade” da estratégia que decidiu adotar.

António Horta Osório lidera o segundo maior banco britânico (nasceu da fusão dos bancos Lloyds TSB e HBOS) desde novembro de 2010 — quase dois anos depois de ter sido resgatado pelo Estado, que ficou a controlar 43,4% da instituição. Hoje, é apontado pelo The Guardian como uma das 11 figuras da economia mundial que vai enfrentar os maiores desafios de 2016: conseguir vender a fatia que o Estado ainda detém no banco, nos próximos três anos.

O que fez Horta Osório para conseguir um bónus de um milhão de euros?

Reduziu mercados e focou-se no retalho

Quando chegou à liderança do banco, Horta Osório viu-se confrontado com uma dívida de 384 mil milhões de euros e a instituição estava presente em 30 países. Hoje, opera em apenas seis, através das marcas Lloyds Bank, Halifax, Bank of Scotland e Scottish Widows. Cerca de 95% das operações do Lloyds Bank acontecem no mercado britânico.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Reduzindo a dispersão geográfica, reduziu também o foco do negócio, direcionando a atividade para o crédito a consumidores, a empresas pequenas (deixando os negócios de maior dimensão de lado) e promovendo soluções para a reforma. Ou seja, para fazer crescer as receitas do banco, optou por aumentar os empréstimos hipotecários.

Apesar de achar que esta escolha “não faz muito sentido”, um dos analistas financeiros contactado pelo Observador afirma que Horta Osório fez um “ótimo trabalho ao simplificar a estratégia do Lloyds”, diminuindo a dispersão de mercados em que estava presente e focando-se na banca de retalho e comercial do Reino Unido.

Despediu e fechou agências

No primeiro plano de três anos de redução de custos que traçou para o banco, Horta Osório anunciou que ia despedir 15.000 pessoas. Em 2014, afirmou que planeava eliminar mais 9.000 postos de trabalho e 200 agências (transferindo os serviços para o online), com o objetivo de conseguir poupar até 1,28 mil milhões de euros até 2017. Emprega atualmente 77 mil pessoas, a trabalhar em 2.000 agências.

Em fevereiro, anunciou que vai fechar 29 agências e dispensar 1.755 pessoas (como parte desse plano), mas que planeia recrutar 170 pessoas para vagas na área comercial e legal. Para junho, espera-se o encerramento de 19 agências da marca Lloyds, sete do Bank of Scotland e três Halifax. Os sindicatos acreditam que as saídas dos colaboradores podem acontecer de forma voluntária ou por mútuo acordo.

Sobre este plano de eficiência de custos, um dos analistas contactado pelo Observador afirma que foi uma das componentes principais da reestruturação do banco. O Lloyds estima que, com estes despedimentos e encerramento de agências, vai conseguir diminuir os custos da instituição em cerca de 1,28 mil milhões de euros — mil milhões de libras — até ao final de 2017. A ideia é “digitalizar” todo o negócio do banco.

Investiu 2 mil milhões de euros numa estratégia digital

A opção pela redução de custos veio acompanhada por toda uma nova estratégia digital: Horta Osório quer que o Lloyds Bank adote um modelo de contacto com os clientes “multicanal”, e esta abordagem já foi considerada um ponto de viragem para a instituição. Para que isto aconteça, Horta Osório decidiu investir 2 mil milhões de euros — 1,6 mil milhões de libras — em serviços digitais, que permitam maior automatização das funcionalidades.

Esta é uma estratégia para nos adaptarmos a um mundo novo. Queremos criar uma organização de desempenho elevado… que seja mais rápida do que as outras e que tenha vantagens competitivas”, afirmou Horta Osório em outubro de 2014, citado pelo Financial Times.

Miguel-Ángel Rodríguez-Sola, responsável pelo departamento digital do banco, afirmou — também citado pelo Financial Times — que esta nova estratégia digital vai trazer “uma maior conveniência aos consumidores” e vai fazer com que seja possível fechar um contrato de crédito numa semana, em vez dos atuais 25 dias.

O investimento está a ser feito com cerca de dois terços das poupanças que o banco fez ao optar por se tornar numa instituição “mais simples e eficiente”. No final de 2014, o Lloyds tinha 5,2 milhões de utilizadores mobile, mais 29% do que no ano anterior, e 10,5 milhões de clientes que recorriam ativamente à Internet para concretizarem as suas operações.

“Esta transformação vai refletir as mudanças nas preferências dos nossos clientes, no que diz respeito à forma como interagem connosco, fornecendo-lhes um acesso contínuo aos nossos serviços através de uma infraestrutura segura e resiliente”, afirmou Horta Osório.

Vendeu a filial TSB ao espanhol Sabadell

Em junho de 2015, o Lloyds Bank Group vendeu as 631 agências de uma das filiais que detinha — o banco comercial TSB — ao espanhol Sabadell, por 2,2 mil milhões de euros (1,7 mil milhões de libras), porque os legisladores e reguladores europeus queriam acabar com o domínio do Lloyds Banking Group, Royal Bank of Scotland, Barclays, HSBC e do braço britânico do espanhol Santander, no mercado do Reino Unido.

O negócio foi anunciado em março, mas só foi aprovado pelo regulador britânico no final do mês de junho. Com esta operação, aquele que é o quinto maior banco de Espanha entra, assim, no top 5 dos maiores credores britânicos. Apesar de ter vendido as agências por 2,2 mil milhões de euros, o investimento do Lloyds no TSB foi de 3,3 mil milhões de euros.

Pediu desculpas e foi multado em 160 milhões

Mas nem tudo foi fácil e simples em 2015. Em junho, Horta Osório viu-se obrigado a fazer um pedido de desculpas oficial aos clientes, na sequência da multa de 160 milhões de euros que foi aplicada ao banco (e que se refletiu, para si próprio, numa perda de 476 mil euros). Em causa esteve a rejeição “injusta” de um número significativo de pedidos de indemnização de clientes que contrataram seguros de crédito entre março de 2012 e maio de 2013.

A forma como o banco geriu as reclamações dos clientes face à polémica dos seguros de crédito, um dos escândalos que tem assolado a banca britânica nos últimos cinco anos, tornou-se na maior coima alguma vez aplicada pelo regulador financeiro britânico. Apesar de este tipo de seguro ter como objetivo proteger os consumidores em caso de doença ou desemprego, foram vendidos “muitas vezes a clientes que não os exigiam ou que não estavam capazes de os reivindicar”, segundo a Reuters.

Tem agora que ver o Estado a sair do banco

Para já, sabe-se que os investidores que comprem algumas das ações que o Estado anunciou que ia vender, no valor de 2,5 mil milhões de euros — e que fiquem com os títulos durante um ano –, também vão ter direito a um bónus (que pode chegar a 256 euros por investidor). E vão poder comprá-las com um desconto de 5% sobre o efeito do preço de mercado. Terão prioridade aqueles que comprarem ações até um valor de 1.282 euros.

A venda da fatia que o Estado detém no Lloyds estava prevista para a primavera de 2016, mas “a turbulência que os mercados financeiros têm vivido” levou o ministro das Finanças, George Osborne, a adiar a operação para quando for “a altura certa”, assegurando que quer, com esta operação, “criar uma democracia de acionistas” para o banco. Os investidores que quiserem participar da estrutura acionista da Lloyds terão de comprar, no mínimo, 250 títulos.

Também é minha responsabilidade assegurar a responsabilidade económica. Com mercados financeiros tão turbulentos, agora não é a melhor altura para fazer esta venda”, afirmou, em comunicado.

E o que é que estava a causar turbulência nos mercados? A descida do preço dos combustíveis e a crise na economia chinesa, por exemplo, que fez com que as ações da Lloyds fossem transacionadas a 63 libras (mínimo de fecho), a 26 de janeiro, abaixo do preço médio a que o Estado as comprou (73,6 libras). Os ganhos desta operação vão servir, como aconteceu nas anteriores, para reduzir a dívida pública do Reino Unido.

Quanto aos investidores, também tiveram uma boa notícia em 2015. Desde a crise financeira de 2008 que os acionistas do Lloyds Bank não recebiam dividendos pelos seus investimentos. E em fevereiro, chegou o anúncio do pagamento de um dividendo de 0,75 libras por ação, relativo ao exercício de 2014. Os resultados relativos à atividade do banco em 2015 deverão ser conhecidos na quinta-feira, 25 de fevereiro.