Hilary Mantel tinha 35 anos e apenas dois romances publicados quando começou a colaborar com a revista London Review of Books (a trilogia sobre Thomas Cromwell, que a transformou num sucesso literário, ainda estava longe). Sem qualquer “treino crítico”, como admitiu ao editor, Karl Miller, viu-se obrigada a ser “mais animada e alegre do que académica”. Foi a abordagem certa, e a primeira crítica, publicada em 1987, marcou o início de uma longa colaboração que dura até hoje e que Mantel Pieces ajuda a traçar.

O livro, o mais recente com a assinatura da autora britânica, reúne cerca de 20 críticas, ensaios e memórias, escritas ao longo de mais de três décadas para a revista literária. Os temas são surpreendentemente variados: vão desde Robespierre e Danton, figuras centrais da Revolução Francesa, a Madonna e a Virgem Maria, passando pela Arábia Saudita, onde Mantel viveu durante quatro anos na década de 1980, e pelo caso de Helen Ducan, a última bruxa do Reino Unido.

O volume inclui, entre outros, o famoso ensaio “Royal Bodies”, sobre o papel das rainhas na sociedade e na nossa imaginação. Quando foi publicado em 2013, provocou uma onda de indignação pela comparação de Kate Middleton a uma boneca de plástico. Mantel chegou até a receber ameaças de morte. Mas talvez o texto mais “incendiário”, como lhe chama o The New York Times, tenha sido aquele em que a escritora descreveu a sua curiosidade ao cruzar-se com a rainha durante uma receção no Palácio de Buckingham: “Passei os olhos por ela como um canibal que vê o jantar, o meu olhar afiado o suficiente para conseguir tirar a carne dos seus ossos”.

Segundo a editora Harper Collins, responsável pela publicação do volume, Mantel Pieces é uma “seleção de textos” esclarecedora, sempre perspicaz e muitas vezes divertida, que inclui também cartas e outro material inédito do arquivo de Mantel, “um dos nossos grandes escritores vivos”.

O livro chegou às livrarias britânicas esta terça-feira, sete meses após a publicação do muito aguardado último volume da trilogia sobre Thomas Cromwell, O Espelho e a Luz, um dos grandes acontecimentos literários de 2020 no Reino Unido. O romance esteve nomeado para o Booker Prize e chegou a ser apontado como o favoritos, mas acabou por não passar à fase seguinte. Mantel venceu duas vezes o Booker, pelos dois volumes anteriores da sua famosa trilogia sobre a ascensão e queda do ministro de Henrique VIII, em 2009 e 2012. Os livros foram editados recentemente em Portugal pela Presença.

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