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A leitura da sentença dos antigos responsáveis da Supercoop, de Leiria, está marcada para a manhã de 18 de fevereiro
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A leitura da sentença dos antigos responsáveis da Supercoop, de Leiria, está marcada para a manhã de 18 de fevereiro

A leitura da sentença dos antigos responsáveis da Supercoop, de Leiria, está marcada para a manhã de 18 de fevereiro

A "princesa", a IPSS do tio e o marido que fugiu do tribunal. O caso dos ex-gestores acusados de desviar 184 mil euros da Supercoop

Elsa Leitão e Gil da Silva são acusados de causar, em 17 meses, um prejuízo de 184 mil euros a IPSS de Leiria. Namorados de liceu, garantem que são inocentes. Ou garante ela: ele fugiu do tribunal.

Entre o dia no início de janeiro em que Gil Duarte da Silva abandonou intempestivamente a sala de audiências do Tribunal da Marinha Grande, a meio do depoimento de uma testemunha, e aquele em que se percebeu que o arguido, ali acusado, juntamente com a ex-mulher, de crimes de abuso de confiança, furto qualificado e falsificação de documentos, não ia mesmo voltar, passaram quase três semanas.

“Estava uma testemunha a ser interrogada. Ele levantou-se, disse meia dúzia de coisas que não se perceberam bem ao microfone, reclamou, usou umas expressões menos próprias e nunca mais apareceu. Houve mais três sessões depois disso e nunca compareceu. Até havia a dúvida sobre se teria sido notificado ou não, mas no dia das alegações finais percebeu-se que tinha fugido”, relata ao Observador fonte próxima do processo que opõe Gil Duarte da Silva e Elsa Cristina da Costa Leitão à Supercoop, a IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social) com sede em Leiria de que foram, respetivamente, vogal e presidente do conselho de administração — e de que alegadamente terão desviado 184 mil 324 euros e 7 cêntimos no período entre setembro de 2015 e março de 2017.

"Estava uma testemunha a ser interrogada. Ele levantou-se, disse meia dúzia de coisas que não se perceberam bem ao microfone, reclamou, usou umas expressões menos próprias e nunca mais apareceu"
Fonte próxima do processo

Com esse dinheiro, foram pagos relógios, bijuteria, material informático, roupa, lingerie, sapatos, mobiliário, cosméticos, tratamentos de estética e até animais de estimação, obras em casa, viagens e estadas em hotéis — já lá iremos.

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Quando no dia 24 de janeiro, uma segunda-feira, bateu à porta da casa dos pais de Gil Duarte da Silva, em Meirinhas, uma pequena localidade entre Leiria e Pombal, para notificar o arguido da data da última sessão do julgamento, o militar enviado desde o posto da GNR de Pombal encontrou apenas Gracinda Duarte. Foi ela quem, questionada sobre o paradeiro do filho, disse às autoridades que ele tinha fugido da casa para onde voltou depois de se separar da mulher, mãe do seu filho de 19 anos. “Fugiu depois de ter ido a tribunal dizendo que ia embora e que não queria que ninguém soubesse onde ele estava”, pode ler-se na certidão que entretanto foi apensa ao processo e a que o Observador teve acesso. Ao militar da GNR, a mãe de Gil da Silva garantiu ainda que já não via o filho há três semanas e que não tinha sequer o contacto dele — “uma vez que ele não lho forneceu”, escreveu o guarda no documento.

Apesar de confirmar que, a meio da audiência, Gil da Silva “entendeu que não devia continuar lá e saiu”, fonte próxima da defesa recusa referir-se à “ausência” do arguido como uma fuga: “Não há nenhuma determinação judicial no sentido de ele ser detido nem preso preventivamente. Só se foge de um risco que se possa correr”. Contactado pelo Observador, o advogado dos ex-gestores da Supercoop não quis prestar declarações sobre o processo.

“Fugiu depois de ter ido a tribunal dizendo que ia embora e que não queria que ninguém soubesse onde ele estava”, pode ler-se na certidão que entretanto foi apensa ao processo. Ao militar da GNR, a mãe de Gil da Silva garantiu ainda que já não via o filho há três semanas e que não tinha sequer o contacto dele

A última sessão do julgamento, em que a procuradora do Ministério Público garantiu não ter dúvidas de que os arguidos deviam “ser condenados pela prática em coautoria dos três crimes” e defendeu “pena de prisão efetiva” para ambos, viria a acontecer dois dias depois. Como já tinha acontecido nas audiências anteriores, sem Gil Duarte da Silva sentado no banco dos réus. A leitura do acórdão de sentença está marcada para as 10h30 do dia 18 de fevereiro.

O mais provável, diz ao Observador fonte próxima do processo, é que Gil Duarte da Silva tenha fugido para França, onde não apenas nasceu, mas estavam os pais emigrados, e tem também passado temporadas desde que, a 12 de março de 2017, foi destituído da Supercoop e impedido de voltar a entrar nas instalações da IPSS. Fundada em 2010 por José Francisco Caixinha, tio e padrinho da ex-mulher, a partir das raízes da cooperativa de distribuição de produtos alimentares estabelecida em 1978 com o mesmo nome, a Supercoop detém desde então a creche e jardim de infância Superninho, na zona de Parceiros, desde a abertura um dos estabelecimentos mais procurados da cidade, com lotação sempre esgotada e fila de espera para a admissão.

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A nova vida dos arguidos: ela está na mesma turma que o filho, ele trabalha na construção em França

Licenciado em Educação Básica com mestrado de professor de 1.º ciclo, Gil Duarte da Silva foi contratado em outubro de 2012, pela então mulher, como técnico superior de educação. Até 2015, no Superninho, foi responsável por atividades extra-curriculares como iniciação à informática, ginástica, iniciação ao inglês e música; depois disso assumiu funções de maior relevo: foi nomeado vogal do conselho de administração. Nos últimos meses, no país onde nasceu e viveu os primeiros anos de vida, revelou ao técnico da Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais responsável pela redação do seu Relatório Social, também apenso ao processo, foi fazendo trabalhos pontuais na construção civil, pagos à razão de 100 euros por dia.

O plano, já na altura em que foi entrevistado (o relatório, a que o Observador teve acesso, tem data de 3 de janeiro de 2022), era mudar-se definitivamente para lá, mas para tentar trabalhar como professor — era por isso que estaria, algures naquele país (recusou dar a localização exata), a ter aulas numa escola, para “atualizar” os seus “conhecimentos da língua francesa”, explicou também ao técnico.

Até 2015, no Superninho, foi responsável por atividades extra-curriculares como iniciação à informática, ginástica, iniciação ao inglês e música; depois disso assumiu as funções de vogal do conselho de administração. Agora, no país onde nasceu e viveu os primeiros anos de vida, tem feito trabalhos pontuais na construção civil, pagos à razão de 100 euros por dia

Apesar disso, garante fonte próxima do processo, em momento algum se colocou em cima da mesa do Tribunal da Marinha Grande qualquer hipótese de fuga, nem da parte de Gil Duarte da Silva, de 48 anos, nem da ex-mulher, Elsa Cristina Leitão, 44, que explicou à técnica que lhe foi atribuída estar atualmente a morar num apartamento em Gandra, município de Paredes, com o filho de 19 anos — e, agora, também colega de turma.

Licenciada em 2010, aos 33 anos, em Educação de Infância, curso que frequentou “com a perspetiva de liderar o projeto de reabilitação da Supercoop (cooperativa liderada pelo seu tio paterno, no âmbito da qual foi criada a instituição “Superninho”), que contemplava a construção e criação de instituição dirigida à educação infantil”, pode ler-se no relatório social, Elsa Leitão voltou a estudar.

Em Gandra, na Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário (CESPU), uma instituição privada conhecida por ter a maior percentagem de alunos estrangeiros em Portugal, está no segundo ano de Ciências Biomédicas, tal como o filho, 25 anos mais novo.

Questionada sobre de que forma conseguia assegurar pagamento de rendas, propinas e outras despesas, Elsa Cristina Leitão, que só iniciou a carreira contributiva aos 33 anos e que em Pombal, nas Meirinhas ou em Leiria é descrita por quem a conhece como “uma Princesa” ou “uma Rainha”, explicou que todos esses encargos são suportados pelo ex-marido, pelo seu pai e pelos sogros. Desde que foi afastada da presidência da Supercoop, há já cinco anos, não lhe foi conhecida qualquer outra ocupação que não a fundação da Coopafetos, cooperativa com atividade no apoio domiciliário a idosos que chegou a licenciar junto da CASES (Cooperativa António Sérgio para a Economia Social), mas que entretanto abandonou para se “dedicar à resolução dos problemas judiciais”.

“Ela, que no fundo é o cérebro disto, contou uma história muito estranha, de uma dívida. Disse que podia gastar aquele dinheiro porque a instituição lhe devia 90 mil euros de projetos e horas extraordinárias que tinha feito em 2013 e 2014. Essa teoria caiu por terra logo no início, mas depois apareceu outra: ele contou que tinha tido uma relação extraconjugal com uma funcionária da IPSS e disse que ela é que tinha feito aquelas compras todas”
Fonte próxima do processo

Apesar de terem garantido ao tribunal que estavam separados, Gil da Silva e Elsa Leitão, que no Facebook ainda tem uma fotografia abraçada ao ex-marido a servir-lhe de capa, partilham o advogado de defesa e alinharam ao longo do julgamento pelos mesmos argumentos. Não só nunca admitiram os crimes de que estão acusados, como relataram versões idênticas e alternativas à tese do Ministério Público.

“Ela, que no fundo é o cérebro disto, contou uma história muito estranha, de uma dívida. Disse que podia gastar aquele dinheiro porque a instituição lhe devia 90 mil euros de projetos e horas extraordinárias que tinha feito em 2013 e 2014. Essa teoria caiu por terra logo no início, mas depois apareceu outra: ele contou que tinha tido uma relação extraconjugal com uma funcionária da IPSS e disse que ela é que tinha feito aquelas compras todas, disse até que tinha visto alguns dos objetos em casa dela”, diz ao Observador fonte próxima do processo, que compara este com outro caso muito mediático, o da Raríssimas, que aconteceu justamente na mesma altura e fez correr muito mais tinta (Paula Brito e Costa, então presidente da IPSS, que prestava cuidados a portadores de doenças mentais e raras e aos seus familiares, foi acusada de ter gasto 384 mil euros de forma indevida, mas o processo não chegou ainda à fase de julgamento).

Oito perguntas para entender a polémica da Raríssimas

De acordo com a acusação do Ministério Público, não só as diligências efetuadas nesse sentido não surtiram qualquer resultado, não tendo sido encontrados em casa da, à data, vice-presidente do Conselho de Administração da Supercoop, quaisquer “artigos não compatíveis com o seu rendimento”, como nem sequer terá existido qualquer relação entre ela e o, à data, marido de Elsa Leitão. “Nenhum elemento foi coligido nesse sentido, antes se apurando ter havido entre ambos relação de amizade e profissional, não mais”, pode ler-se no documento, que arquivou a queixa de Gil Duarte da Silva, que pretendia imputar vários crimes de abuso de confiança, burla, infidelidade, administração danosa e falsificação de documento a esta funcionária, aos restantes membros da administração da Supercoop e até ao contabilista da IPSS — que foi, de resto, quem denunciou as irregularidades agora em julgamento na Marinha Grande.

Em tribunal, Elsa Leitão recusou sempre ter alterado faturas, assumiu até ter feito algumas compras pessoais com os cartões da IPSS, mas garantiu que todo o dinheiro que recebeu da Supercoop lhe era devido. “As faturas que entreguei na secretaria eram para ser ressarcida da dívida. Nunca rasurei nenhuma fatura, nem alterei valores ou o descritivo”, disse, depois de explicar que durante alguns anos tinha abdicado de parte do salário para ajudar a IPSS a saldar o referido crédito e que, desde então, tinha a haver 90 mil euros. Questionada sobre em diversas ocasiões lhe ter sido transferido para a conta pessoal mais do dobro das despesas que tinha apresentado, a ex-presidente da Supercoop respondeu que nem nunca se deteve a pensar sobre o assunto porque “poderia ser para pagar outras despesas”.

Do amor no liceu à expulsão na Assembleia-Geral

Gil e Elsa conheceram-se na escola secundária de Pombal em 1991, tinha ele 17 anos e ela 14. Começaram a namorar e casaram dez anos mais tarde. O filho, agora com 19 anos, nasceu um ano depois. Até 2014, ano em que Elsa sucedeu ao tio e padrinho ao leme do conselho de administração da Supercoop — até então foi diretora do Superninho —, a família morou em Pombal. Depois disso, mudou-se para uma moradia em Meirinhas, com jardim e piscina, descreve o relatório social, e o “conto de fadas”, expressão da própria para descrever a sua vida, prosseguiu. Ainda assim, quem estava de fora deu conta de algumas diferenças.

“A partir da saída definitiva do seu tio dos órgãos sociais da Supercoop, foi notada uma diferença na sua atitude, sendo que Elsa Leitão começou a exigir de si própria uma imagem cada vez mais cuidada e sofisticada, e a ter uma presença e ação cada vez menor na instituição, gerando algum mal-estar e constrangimentos que eram prontamente resolvidos pelos funcionários com recurso/mediação do seu marido”, pode ler-se no relatório social, para o qual foram entrevistadas mais de 15 pessoas, incluindo José Francisco Caixinha, o pai e a madrasta de Elsa Leitão, amigos, funcionários da Supercoop e até pais de alunos do Superninho.

Em 2013, ainda o tio de Elsa estava à frente da IPSS, a Supercoop chegou ao fim do ano com disponibilidades de 231.442,62 euros. No ano seguinte, o valor disponível em caixa caiu para 147.978,78 euros, chegando em 2015 aos 95.191,27 euros e caindo em 2016 para 27.134,62, menos 204 mil euros do que quatro anos antes. Foi nessa altura que o contabilista chamou o casal ao seu escritório para o informar de que ia denunciar o caso às autoridades

De acordo com o Ministério Público, em 2013, ainda o tio de Elsa estava à frente da IPSS, a Supercoop chegou ao fim do ano com disponibilidades de 231.442,62 euros. No ano seguinte, o valor disponível em caixa caiu para 147.978,78 euros, chegando em 2015 aos 95.191,27 euros e caindo em 2016 para 27.134,62, menos 204 mil euros do que quatro anos antes.

Foi nessa altura, no início de 2017, que o contabilista, Jorge Grilo, chamou o casal ao seu escritório, em Leiria, para o informar de que ia denunciar o caso às autoridades. De acordo com a acusação, para evitar que isso acontecesse, Gil Duarte da Silva terá, primeiro, alegadamente tentado subornar o contabilista — a oferta inicial, apurou o Departamento de Investigação Criminal de Leiria, terá sido de 20 mil euros, com possibilidade de chegar aos 30 mil. Como a resposta foi negativa, terá passado à fase seguinte, a da ameaça: “Não me importo de gastar o que for preciso para participar à Ordem e você perder a cédula profissional”, diz o Ministério Público que Gil Da Silva lhe disse.

Ainda segundo a acusação, antes do fim da tarde de 12 de março de 2017, data da Assembleia Geral extraordinária da Supercoop entretanto convocada para destituir a administração, Elsa Leitão e Gil da Silva terão alegadamente tentado por vários meios evitar o afastamento da IPSS. Várias funcionárias queixaram-se, por exemplo, de terem sido mantidas durante horas numa sala e coagidas a assinar documentos — um deles uma nota que dizia “que a arguida tinha a quantia de 7.000 euros num cofre da cooperativa” —, e também há relatos de uma reunião, convocada dias antes pela então presidente, para tentar mesmo cancelar a Assembleia Geral.

Elsa Cristina Leitão já teria, com a ajuda do pai, retirado do seu gabinete o computador portátil e uma pasta com documentação da IPSS, que terá escondido num armário de arrumos na garagem, terão revelado a posteriori as imagens de videovigilância da instituição

No fim, não adiantou nada: nessa noite, em que os ânimos se terão alterado tanto que até a PSP foi chamada a intervir, relatou o Jornal de Leiria, dando conta também da aglomeração de várias dezenas de pais e encarregados de educação no exterior, para tentarem perceber o que estava a acontecer, Elsa Cristina Leitão e Gil Duarte da Silva foram suspensos de funções e instados a abandonar as instalações da IPSS. Para trás, disse-lhes na altura Ana Sofia Caseiro, a presidente da Mesa da Assembleia Geral, deviam deixar “os bens que usavam diariamente pertença da mesma, a incluir livros, pastas, telemóvel e veículos”.

Mas não só Elsa Cristina Leitão já teria, com a ajuda do pai, retirado do seu gabinete o computador portátil e uma pasta com documentação da IPSS, que terá escondido num armário de arrumos na garagem, terão revelado a posteriori as imagens de videovigilância da instituição, como tanto ela como o então marido saíram da Supercoop com os iPhones que utilizavam e ao volante dos respetivos carros de serviço, o dela um Mercedes-Benz GLA 180d, o dele um Citroën Xsara. Já as faturas, muitas delas rasuradas à mão ou alteradas em Photoshop, que tinham colocado o contabilista da Supercoop de sobreaviso, ficaram para trás. Cinco dias depois, ambos seriam detidos pela Polícia Judiciária de Leiria.

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Três transformados em oitos e outras faturas rasuradas

Para além de se ter atribuído, tal como ao marido, carros e equipamentos de serviço, e de ter aumentado “exponencialmente o próprio vencimento” — o Ministério Público diz que, de 1.241,45 euros entre 2010 e 2014, Elsa Leitão passou a receber 2.770 euros, mais “prémio de compensação”, em 2016 —, a presidente deposta da IPSS e o marido foram acusados de ter causado um prejuízo de 184.324,07 euros e de terem feito “acrescer a sua esfera patrimonial à custa da Supercoop”.

A forma como o fizeram, assinalou a procuradora do Ministério Público nas alegações finais, foi feita de forma displicente e descuidada: “Não eram só as despesas que faziam para si próprios, mas alteravam os valores das faturas para depois lhes pagarem mais. Foram alterados de um três para um oito, em vez de receberem 300 receberiam 800 euros”.

De acordo com fonte próxima do processo, “as faturas eram pedidas em nome da Supercoop e depois, na secretaria, os arguidos pediam reembolso”. Segundo a acusação, “aproveitando-se da relação de confiança e amizade” que tinha com a então vice-presidente do Conselho de Administração — exatamente a mesma pessoa a quem viria depois a apontar o dedo em tribunal e com quem o marido viria a confessar ter tido um caso extraconjugal —, Elsa Leitão ter-lhe-á ainda alegadamente pedido em várias ocasiões “que assinasse entre 20 a 30 cheques em branco reportados às ditas contas da Supercoop, que lhe exibia, dizendo-lhe que se destinavam ao pagamento de fornecedores da Supercoop, o que aquela, confiando no que lhe era dito pela arguida, fazia”.

“Não eram só as despesas que faziam para si próprios, mas alteravam os valores das faturas para depois lhes pagarem mais. Foram alterados de um três para um oito, em vez de receberem 300 receberiam 800 euros”
Procuradora do Ministério Público

Basta olhar para as faturas apensas ao processo para perceber a dimensão das alterações: um talão do El Corte Inglés, com data de 24 de fevereiro de 2016, tem na descrição “Pedro Garcia” e no valor, rasurado em cinco sítios diferentes, 891 euros, em vez dos originais 391.

Num descritivo, escrito à mão, presumivelmente para justificar a despesa nos serviços de contabilidade da IPSS, pode ler-se “enciclopédia”. Não é necessário ser perito de moda para descobrir que Pedro García é uma marca de sapatos espanhola, fundada em 1925 na região de Alicante. Hoje, seis anos depois desta compra, o El Corte Inglés de Lisboa continua a vender ténis e sandálias da marca, fora de saldos a preços entre os 410 e os 275 euros por par — bem distantes, por isso, dos 891, que no mesmo dia foram passados, através de cheque da conta da Supercoop na Caixa Geral de Depósitos, para o nome de Elsa Cristina da Costa Leitão.

Outro recibo, passado à Supercoop pelos CTT de Marrazes, no dia 27 de setembro de 2016, deu entrada na tesouraria da empresa com o descritivo “Caixas do correio pré” e o valor total de 330 euros. No valor por extenso, inalterado, era ainda possível ler a quantia original: “dois euros e noventa e quatro cêntimos”. A quantia inscrita no cheque passado um dia mais tarde, a partir da conta da Supercoop no BPI, era o primeiro.

De volta ao El Corte Inglés, a 2 de março do mesmo ano, por exemplo, desodorizantes da Biotherm foram descritos como “creme rabinho” e maquilhagem como “pomada atópica”. No final, a fatura, que juntou ainda um relógio e outros cinco items impossíveis de descortinar, mas que à mão foram descritos como “Programa TIC”, sendo TIC a sigla para a disciplina de Tecnologias de Informação e Comunicação, custou à Supercoop 1.465 euros.

Outro recibo, passado à Supercoop pelos CTT de Marrazes, no dia 27 de setembro de 2016, deu entrada na tesouraria da empresa com o descritivo “Caixas do correio pré” e o valor total de 330 euros. No valor por extenso, inalterado, era ainda possível ler a quantia original: “dois euros e noventa e quatro cêntimos”

Entre as faturas apensas ao processo há ainda procedimentos médicos — como os 400 euros gastos a 8 de outubro de 2016 numa clínica dentária em Meirinhas, descritivo original “coroa sob implante do 22”, nota manuscrita “seguro Gil” —, e até a construção de uma “casa das máquinas”, assegurada por uma empresa que se descreve como “o primeiro fabricante de Piscinas em Fibra de Vidro em Portugal”. À Fapicentro, a Supercoop, que não dispõe de qualquer piscina, ao contrário da casa de Meirinhas de Elsa Leitão e Gil da Silva, pagou 4.789,01 euros. “Casa de máquinas, material, mão de obra e canalizações e acessórios para instalação” é o que consta fatura, passada a 12 de maio de 2016. Não há qualquer nota escrita à mão na folha.

Massagens, palmilhas, aspiradores e até cães de raça. Como terão sido gastos os 184 mil euros

Apesar de o Departamento de Investigação Criminal de Leiria ter enchido 187 folhas com aquilo a que chamou o “Relatório de Despesas/Compras Contabilizadas e Não Enquadráveis no Objeto Social da Cooperativa de Ensino Supercoop” e de ter chegado à conclusão que estas teriam ascendido a 239.882,08 euros, a acusação acabou por fixar em 184.324,07 euros o prejuízo sofrido pela IPSS no espaço de 17 meses, menos de um ano e meio.

Nos últimos quatro meses de 2015 foram 4.018,93 euros, e só no primeiro mês de 2017 outros 2.594,84 euros, tendo sido ao longo de 2016 que se deu o maior rombo nas contas da instituição privada de solidariedade social: 164.763,31 euros, uma média de 13.730 euros por mês.

Entre o rol de faturas reunidas pela acusação há material informático, como um iPad, três iPhones e seus acessórios e uma Playstation, mais jogos e óculos de realidade virtual. Também há móveis, como roupeiros, sofás, cadeiras e poltronas; objetos de decoração, como tapetes, cortinados, plantas, jarrões, espelhos, almofadas, quadros e uma escultura de Buda; e até um aspirador de 2.600 euros (acompanhado de sete embalagens de “shampoo” no total de 311,69 euros)

Durante as alegações finais do caso, na quarta-feira, dia 26 de janeiro deste ano, a procuradora do Ministério Público pediu a prisão efetiva de Elsa Leitão e Gil da Silva, não apenas porque o “valor subtraído a esta instituição é altíssimo”, mas também porque “não houve qualquer arrependimento”.

Entre o rol de faturas reunidas pela acusação há material informático, como um iPad, três iPhones e seus acessórios e uma Playstation, mais jogos e óculos de realidade virtual. Também há móveis, como roupeiros, sofás, cadeiras e poltronas; objetos de decoração, como tapetes, cortinados, plantas, jarrões, espelhos, almofadas, quadros e uma escultura de Buda; e até um aspirador de 2.600 euros (acompanhado de sete embalagens de “shampoo”, no total de 311,69 euros). E há relógios, contas de pulseira Pandora, canetas banhadas a ouro, manicures, massagens de relaxamento, tratamentos de mesoterapia, óculos de sol, tábuas de engomar, máquinas de costura, caneleiras de futebol, uma trotinete elétrica e palmilhas Dr. Scholl — a lista é exaustiva e estende-se ao longo de 17 páginas.

Se estes objetos já terão sido difíceis de justificar no âmbito do funcionamento da IPSS, mais complicada terá sido a apresentação de faturas relativas a viagens para Paris para três pessoas, com bilhetes de entrada na Disneyland e despesas de transportes, alimentação e alojamento durante três dias — no total foram 1.330,35 os euros reclamados na volta a Lisboa, em outubro de 2015, à Supercoop. Não consta que as duas Torres Eiffel decorativas que a Polícia Judiciária encontrou na cómoda do quarto de Elsa Leitão e Gil da Silva e a que fez referência no relatório de apreensões tenham saído deste plafond.

Foram inúmeros os objetos comprados em nome da Supercoop e com o dinheiro da IPSS que a PJ encontrou na moradia de Meirinhas, desde a Playstation aos perfumes Alien, de Thierry Mugler, e La Vie est Belle, de Lancôme, passando por peças de roupa ainda com etiqueta e contas da pulseira Pandora — foram apreendidas 57, à instituição só terão sido debitadas quatro.

Há mais: no dia 7 de dezembro de 2015, foi comprado um cão, raça Lulu da Pomerânia, por 585 euros. Três meses depois, foi passada uma fatura no valor de 399,90 euros para um Yorkshire Terrier — à mão, Elsa Leitão, determinou o especialista em caligrafia da Polícia Científica, escreveu “cão de brincar a imitar verdadeiro”. Ambos os animais de estimação foram apreendidos pela PJ na casa dos arguidos, em Meirinhas. Estavam bem de saúde, a respirar e a ladrar. Eram os dois de carne, osso e pelo, não de peluche.

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